Desde o passado dia 8 que o vaivém espacial Endeavour está no espaço, com o objetivo principal de continuar a construir a Estação Espacial Internacional (EEI), levando neste caso mais um segmento do painel solar, o Integrated Truss Segment, uma nova viga para a estrutura centras da EEI, que tem como função refrigerar as linhas de força, além de servir como um separador entre dois módulos.
A missão é constituida por sete astrounautas, seis americanos e um canadiano. Uma das tripulantes é Barbara Morgan, de 55 anos, que estava à espera desta missão há 22 anos. E porquê? Porque fazia parte do programa "Um Professor no Espaço", cuja primeira pessoa a ir era Christa McAuliffe, que esta a bordo do vaivem espacial Challenger no dia 28 de Janeiro de 1986, quando explodiu passados 73 segundos de vôo. Barbara Morgan era a suplente...
No passado dia 7, o jornal português "Publico" colocou a história de Morgan e comparou-a ao actual estado da NASA, especialmente depois de um outro desestre, o do Columbia, a 1 de Fevereiro de 2003. A entrada do artigo é sintomática: "Chamam-lhe 'mamã da NASA'. A agência parece precisar de uma." Eis o artigo na integra.
"Naquela manhã de 28 de Janeiro de 1986, ela ficou em terra a ver elevar-se no céu o vaivém onde seguia a colega Christa McAuliffe, a primeira professora a ir ao espaço. Ao fim de 73 segundos, o inacreditável acontecia. O Challenger desintegrava-se. As imagens desse instante ficaram gravadas na memória colectiva: o fumo esbranquiçado com a forma de um V gigantesco, contra o azul do céu...
Christa McAuliffe, de 36 anos, era a vedeta dessa missão do Challenger. A agência espacial dos Estados Unidos ia levar para o espaço, pela primeira vez, um cidadão comum. McAuliffe era professora (ensinava Inglês e História) e planeava dar aulas em directo enquanto o Challenger orbitasse a Terra. Barbara Morgan, então com 34 anos, era a segunda escolha, a professora suplente, caso alguma coisa impedisse McAuliffe de ir para o espaço.
Tinham ambas sido seleccionadas em 1985, entre 11 mil candidatos que concorreram ao programa Professores no Espaço. Entre Setembro de 1985 e Janeiro de 1986, McAuliffe e Morgan treinaram com os seis tripulantes do Challenger, no Centro Espacial Johnson, em Houston, no Texas.
Mas nada impediu McAuliffe de ir para o espaço naquela manhã de 28 de Janeiro de 1986. Nenhum dos tripulantes sobreviveu. Era a primeira grande catástrofe da NASA, que deixaria Barbara Morgan e o programa Professores no Espaço durante muitos anos em terra, pois a agência acabou com os voos de civis.
Morgan não virou as costas perante a tragédia. Quando a NASA a convidou para ser embaixadora espacial da América com o título pomposo de "professora no espaço nomeada", ela aceitou. "Era uma decisão realmente importante para mim. Mas era fácil de tomar. Tínhamos miúdos de todo o país a ver o que faziam os adultos numa situação difícil", diz numa entrevista publicada no site da NASA. Assim, pouco tempo após um golpe tão rude na credibilidade da agência, fez-se à estrada. Entre Março e Julho de 1986, correu os Estados Unidos a dar palestras.
Um sonho por telefone
No Outono daquele ano, regressou à Escola Primária de McCall, no Idaho, onde dava aulas. Mas continuou sempre a colaborar com a Divisão de Educação da NASA, em palestras ou como consultora na área da educação.
Só que o bichinho que a fez candidatar-se a professora no espaço mantinha-se vivo, desde o dia em que ouviu falar desse programa. Um momento de que se recorda bem: "Eu e o meu marido estávamos sentados no sofá a ouvir as notícias, como fazíamos sempre. E apareceu o Presidente Reagan a dizer que iam enviar um professor para o espaço. Levantei-me e disse: "Uau!"", conta Barbara Morgan. O marido dela, o escritor Clay Morgan, ripostou: "Porquê um professor? Por que não um escritor?". É que ele adorava poder voar, diz a mulher.
No final dos anos 90, o programa Professores no Espaço sofreu uma reviravolta, dando lugar a um novo programa chamado Astronauta Educador. Um professor poderia agora tornar-se astronauta, tal como um cientista ou um piloto de aviões. Em 1998, Barbara Morgan foi então seleccionada para integrar o corpo de astronautas da NASA. Outro dia vivo na sua memória.
"De manhã, antes de ir para a escola, recebi um telefonema do nosso administrador [da NASA], Dan Goldin, e do director do Centro Espacial Johnson, George Abbey. Fui para a escola, como nos outros dias", conta a professora agora astronauta. "Queria que os meus colegas soubessem. Eles fazem parte disto tudo há muitos, muitos anos, e estávamos todos desejosos de que esse dia chegasse. Houve uma grande excitação na minha escola e por todo o país." Tal como ela, outros três professores pertencem agora ao corpo de astronautas da NASA.
Ao fim de dois anos de treino intenso, a professora transformou-se em astronauta de corpo inteiro e passou a desempenhar várias funções, em particular no controlo de missões espaciais, onde funcionava como elo de comunicação com as tripulações no espaço. Só que um astronauta tem sempre o sonho de ir lá acima. "Ao longo dos anos, sempre soube que um dia aconteceria", comentou a professora-astronauta, citada pela BBC Online. "Só não sabia quando."
Dar aulas em órbita
A notícia tão aguardada chegaria em Dezembro de 2002. "Estávamos todos de mãos dadas, à espera do anúncio das próximas tripulações. É muito divertido, independentemente das tripulações anunciadas." Disseram-lhe que voaria em 2003, depois da missão do vaivém Columbia. Mas, a 1 de Fevereiro de 2003, a NASA vivia a segunda tragédia. O Columbia explodia no regresso da missão, os sete tripulantes morriam. Nesse momento, Barbara Morgan estava na sala de controlo de missão e tudo voltou à sua memória, o Challenger, Christa McAuliffe...
Os críticos voltaram a acusar a NASA de pôr os astronautas em risco, sabendo, tanto no caso do Challenger como no do Columbia, que existiam, de facto, problemas de segurança. Mas se há uma palavra que descreve Barbara Morgan, é perseverança. Assim, aos 55 anos, chegou finalmente a vez de esta mãe de dois filhos adultos ser a vedeta da próxima missão da NASA. Por volta da próxima meia-noite (em Portugal), o vaivém Endeavour fará a primeira tentativa de descolagem, para uma missão de 11 a 14 dias destinada a continuar com a construção da Estação Espacial Internacional que, por exemplo, receberá estrutura de suporte de mais painéis solares. "Estou muito entusiasmada quanto ao voo, a ver a Terra do espaço pela primeira vez, a sentir a ausência de gravidade e a viver e trabalhar na Estação Espacial Internacional."
Ela vai ser a astronauta atrás dos braços robotizados do vaivém e da estação espacial, com os quais irá mover diversos equipamentos. "Vou ter a sorte de trabalhar com ambos os braços..."
Também dará aulas do espaço e terá à sua guarda milhares de sementes de manjericão, que, no regresso à Terra, serão distribuídas por escolas. Em estufas terrestres, os estudantes poderão comparar o crescimento das plantas viajadas com aquelas que nunca saíram do planeta. "Sei que as pessoas vão lembrar-se do Challenger, o que é uma coisa boa. Também vão pensar em todas as pessoas que têm trabalhado muito para continuar o trabalho de Christa", sublinha. "Os meus filhos e o meu marido estão preocupados com os riscos. Mas sabem que a exploração espacial é importante."
E a NASA espera polir uma imagem desgastada por duas catástrofes e, nos últimos tempos, por sucessivos escândalos. No início do ano, uma astronauta tentou matar uma rival amorosa, namorada de outro astronauta. Em Julho, foi revelado que já partiram para o espaço astronautas embriagados, que constituíam uma ameaça para a segurança do voo.
Depois de 21 anos à espera de chegar ao espaço, há agora quem chame a Barbara Morgan "mamã da NASA". Será a norte-americana mais velha a estrear-se no espaço (mais velho do que ela só mesmo o astronauta Karl Henize, que fez o baptismo espacial aos 58 anos, em 1985). Verdade se diga, com tudo o que se tem passado, a agência espacial dos Estados Unidos até parece precisar de uma figura materna.
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