Para além de Mario Andretti, os americanos também tiveram outros pilotos marcantes a correr na Europa, nos anos 50 e 60. Se Phil Hill foi o primeiro americano a ser campeão do Mundo, ele tinha outro companheiro, que sem ganhar títulos, foi tão marcante nas pistas europeias, e mais tarde nas americanas. Era o homem que Jim Clark mais temia nas pistas. E também se tornou construtor, criando um dos mais belos chassis de sempre. Comemorando hoje 77 anos, falo de Dan Gurney.
Nascido a 13 de Abril de 1931 em Port Jeffreson, no estado de Nova Iorque, como Daniel Sexton Gurney, era filho de um cantor de ópera. Na adolescência, mudou-se com os pais para o outro lado da costa, na solarenga California. A familia instalou-se em Riverside, perto do qual existe um circuito permanente, e cedo apaixonou-se pela velocidade.
Nessa altura, começava a crescer a cultura do "hot rod", onde miudos da sua idade transformavam velhos Fords T e A em máquinas poderosas, com potentes motores Ford ou Chevrolet V8. CEdo construiu uma máquina tão potente, que quando o levou para experimentar no lago salgado de Bonneville, palco por excelência de recordes do mundo de velocidade, conseguiu 222 km/hora de média.
Aos 21 anos, em 1952, colocou temporariamente a sua carreira de lado para servir o exército americano na Guerra da Coreia. Quando voltou a casa, continuou a sua progressão no automobilismo. Em 1958 vai para a Europa, correr nas 24 Horas de Le Mans a bordo de um Ferrari 250 GT da NART, onde apesar de não ter chegado ao fim, foi convidado pela Ferrari para fazer testes pela marca. No ano seguinte, é escolhido para fazer parte da equipa oficial de Formula 1, ao lado do seu compatriota Phil Hill, do inglês Tony Brooks, do alemão Wolfgang von Trips, do francês Jean Behra e do belga Olivier Gendebien.
Estreia-se em Reims, palco do GP de França, onde se retira na 12ª volta com um radiador furado. Contudo, a equipa despede Behra, e fica com Gurney durante o resto da época. No perigoso circuito de AVUS, em Berlim, Gurney consegue levar o seu carro ao segundo lugar, logo atrás de Brooks. Na prova seguinte, no circuito desenhado nas estradas do parque de Monsanto, o "pulmão verde" de Lisboa, Gurney é o melhor Ferrari, na terceira posição, atrás dos Coopers de Jack Brabham e de Masten Gregory.
Até ao final do ano, com mais um quarto lugar em Monza, Dan Gurney termina a sua primeira temporada no sétimo lugar do campeonato, com 13 pontos. Contudo, a maneira como as coisas eram dirigidas na Ferrari fizeram com que não ficasse por lá para a temporada de 1960, decidindo assim tentar a sua sorte na BRM. Contudo, a equipa debatia-se com um carro muito pouco fiável, e com os Cooper a dominar a temporada, Gurney não conseguiu qualquer ponto.
Em 1961, muda-se para outra equipa de fábrica, de outra nacionalidade: a Porsche. Aqui, com o modelo de Formula 1 do 718, consegue melhores resultados, mas sem contudo ganhar. O mais perto que teve de alcançar esse êxito foi em Reims, no GP de França, onde foi batido por meio segundo... pelo Ferrari 156 do estreante Giancarlo Baghetti. Contudo, os três segundos lugares deram-lhe no final da época o quarto lugar do campeonato, com 21 pontos.
No ano seguinte, ainda com a Porsche, mas agora com o modelo 804, um modelo com um motor de oito cilindros em linha, refrigerado a ar, e que desenvolvia 180 cavalos. Era um carro competitivo, e Gurney tornou-o num carro vencedor. Em França, desta vez no circuito de Rouen- Les Essasts, Gurney bateu a concorrência e ganhou a sua primeira corrida, e a unica da Porsche. Em Nurburgring, consegue a pole-position, mas na corrida, termina na terceira posição. No final do ano, marca 15 pontos e é quinto na classificação geral, mas a marca de Estugarda decide retirar as suas operações na Formula 1, pois achava-as dispendiosas, e os resultados eram escassos.
Sem lugar, aceita o convite de Jack Brabham para correr na sua equipa em 1963, a bordo do modelo BT 7, com motor Coventry-Climax. Com esse gesto, Gurney tornou-se no primeiro piloto de sempre contratado pela marca. Apesar de não ter muitas expectativas em relação à época, consegue resultados de relevo, com três pódios e uma volta mais rápida em East London, palco do GP da Africa do Sul. Repete o quinto lugar no ano anterior, mas desta vez com 19 pontos.
Entretanto, a sua carreira não era só Formula 1. Para além de correr na categoria máxinma do automobilismo, tamém ia correr nos Estados Unidos, mais concretamente nas 500 Milhas de Indianápolis. A partir de 1963, corria na Lotus, a convite de Colin Chapman, na sua tentativa de conseguir ganhar aquela que era a corrida mais lucrativa do mundo, com os motores traseiros. Também corria na NASCAR, especialmente no seu "quintal", o circuito de Riverside. De 1963 a 1968, excepto em 1967, Gurney ganhou sempre nesse circuito.
Em 1964, de novo na Brabham, as suas performances melhoram consideravelmente. Em Rouen-Les Essartes, Gurney dá à marca a sua primeira vitória oficial na Formula 1. Vai ganhar mais uma vez na Cidade do México, e consegue duas pole-positions e duas voltas mais rápidas, mas a pouca fiabilidade do carro impede de ir mais além. Os 19 pontos e o sexto lugar final é tudo que consegue nesse ano.
Em 1965, com um novo modelo, o BT 11, Gurney tem aquela que é provavelmente a sua melhor temporada. Com os Lotus e Jim Clark absolutamente imbatíveis, resta ao pelotão ficar com os restos. Com um mau inicio, não pontuando nas três primeiras corridas em que participa (e falhando o Mónaco por estar a correr as 500 Milhas de Indianápolis), consegue a seguir cinco pódios seguidos, incluindo três segundos lugares nas três corridas finais do campeonato, conseguindo 25 pontos e o quarto lugar na classificação geral.
Nessa altura, ele e o legendário preparador Carrol Shelby planeavam uma nova equipa, totalmente americana, que pudesse competir contra as marcas europeias como a Ferrari e a Porsche. Tinham o apoio da Goodyear, que queria combater a superioridade que a Firestone detinha então, quer na Europa, quer na América. O nome do projecto? De inicio, era "All-American Races".
A ideia inicial era de correr em Indianápolis, mas Gurney conseguiu levar por diante o seu projecto de correr nos circuitos europeus. Encomendou um motor ao preparador inglês Westlake, que lhe fez um motor V12 de 3 Litros, pois nesta altura, a Formula 1 sofria uma mudança nos regulamentos. Para que o projecto fosse mais credível, mudou o nome para Anglo-American Racers, e conseguiu inscrever o carro no Mundial de Formula 1, sobre um nome mais simples: Eagle.
Usando o motor Coventry-Climax de 2,7 Litros (que não era mais do que dois motores colados um ao outro), Gurney e o seu Eagle fizeram a sua aparição no GP da Belgica, onde terminaram a cinco voltas do vencedor. Em Reims, conseguiram pontuar pela primeira vez, com um quinto lugar, numa corrida ganha pelo seu ex-patrão, Jack Brabham. No final, consegue quatro pontos e o 13º lugar final.
Entretanto, em 1967, o motor Westlake estava pronto e Gurney tinha esperanças de que as coisas melhorassem. Essas esperanças aumentaram quando Gurney ganhou a Race of Champions, em Brands Hatch, e o seu companheiro Richie Ginther foi terceiro. Contudo, o seu compatriota foi-se embora após o GP do Mónaco, absolutamente desencantado com o automobilsimo, e acolheu outro piloto aspirante a construtor: o neozelandês Bruce McLaren.
A 18 de Junho de 1967, Dan Gurney alcança o seu ponto mais alto da carreira, ao ganhar categoricamente o GP da Belgica, com mais de um minuto de diferença sobre o segundo classificado, o BRM de Jackie Stewart. Era uma vitória bastante celebrada, pois fizera uma corrida de trás para a frente, após uma má partida, que se reflectiu na volta mais rápida da corrida. Isto acontecera uma semana depois de ter ganho as 24 Horas de Le Mans, numa vitória totalmente americana: com um Ford GT40,e ao lado do lendário piloto (quarto vezes vencedor das 500 Milhas de Indianápolis) A.J. Foyt. No pódio, em vez de beber o champanhe, pura e simplesmente despejou-o sobre a assistência. Foi aí que começava a tradição.
Voltando à Formula 1, somente conseguiu mais um pódio, em Mosport, ao acabar no terceiro posto. No final do campeonato, conseguiu 13 pontos e o oitavo lugar. A partir de 1968, dirigir a equipa nos dois lados do Atlântico tornou-se cada vez mais difícil: com escassos fundos, e as operações divididas, era difícil evoluir numa altura em que a competição vivia a revolução aerodinâmica. Para piorar as coisas no campo pessoal, o seu casamento se desfazia e o seu grande amigo Jim Clark morria em Hockenheim. Após andar com um chassis McLaren no final do ano (e de conseguir os seus unicos três pontos nesse ano), Gurney decide fechar as suas operações na Europa, e abandonar temporariamente a competição.
Concentrado em casa, irá correr na Indy, para além da Can-Am, a bordo de um McLaren, iscrito pela sua equipa. No ano seguinte, continua a correr na América, mas quando Bruce McLaren morre, a 2 de Junho desse ano, pedem para substituí-lo em algumas corridas de Formula 1. Corre em três Grandes Prémios, e consegue um ponto em França, mas o GP de Inglaterra de 1970 vai ser o seu último da sua carreira.
A sua carreira na Formula 1: 87 Grandes Prémios, em dez temporadas (1959-68, 1970), quatro vitórias, 19 pódios, três pole-positions, seis voltas mais rápidas, 133 pontos no total.
No final de 1970, abandona a carreira competitiva para dirigir a Eagle. No ano seguinte, quando testrava o seu carro na oval de Phoenix, debateu-se com problemas de velocidade de ponta. O seu piloto, Bobby Unser, pediu a Gurney para que arranjasse uma solução. O resultado foi um apêndice aerodinâmico que permite adequar a carga aerodinâmica, conforme as pistas que corriam, melhorando a sua tracção. O "Gurney flap" é usado hoje em dia em todas as grandes competições.
Em 1973 (Bobby Unser) e 1975 (Gordon Johncock), a Eagle ganhou as 500 Milhas de Indianápolis, juntando-se à vitória na edição de 1968, ganha também por Unser. No final de 1978, Gurney escreve uma "Carta Branca", reclamando por um maior controlo do Campeonato Indy por parte dos construtores, do que da entidade federativa, a USAC (United States Automobile Club). O resultado é a formação da CART (Championship Auto Racing Teams), no inicio do ano seguinte.
No final de 1986, a Eagle retira-se na CART, mas volta dez anos depois, sem sucesso. Hoje em dia, a Eagle e Gurney continuam activos nas corridas americanas, especialmente na Grand-Am Series. Quanto a Gurney, as suas contribuições para o desporto automóvel foram reconhecidas em 1990, quando foi introduzido no International Motorsports Hall of Fame.
Fontes:
Putz, tá aí um dos meus pilotos preferidos.
ResponderEliminarE um banho de água fria naqueles que tentam classificar os pilotos atrávés de estatísticas!
ótima pesquisa e ótimo texto.
ResponderEliminarResultado: uma agradável leitura.
Muito bom mesmo, sempre admirei este piloto.
Um dos grandes pilotos americanos da f1, foram poucos a ter relevancia.. Gurney esta entre os mais importantes deles...
ResponderEliminarBeleza Speeder