quinta-feira, 5 de novembro de 2009

GP Memória - Austrália 1989

Passaram-se três semanas desde os incidentes de Suzuka, e pelo meio acontecera no Tribunal de Apelo da FISA, em Paris, a apresentação do recurso da McLaren à desclassificação de Ayrton Senna. Ouvidas as duas partes, a FISA não só validar a decisão dos comissários japoneses e do seu preisidente, Jean-Marie Balestre, como decidiram agravar a pena, afirmando que o piltoo brasileiro tinha uma condução demasiado perigosa, multando Senna em cem mil dólares e suspendendo-o por seis meses, sendo que essa parte estava suspensa durante esse mesmo tempo.



A pena foi recebida com indignação no mundo inteiro, e várias entidades, desde ex-campeões do Mundo como Juan Manuel Fangio e Jackie Stewart, até responsáveis de equipas como Cesare Fiório (então o director desportivo da Ferrari) e Ken Tyrrell. Este último disse uma frase que hoje em dia parece prenomonitória: "Gostaria imenso que os meus pilotos fossem tão agressivos como Senna. Fico com a sensação de que a FISA acabou de proibir as ultrapassagens".



Foi mais ou menos nesse ambiente de incredulidade que máquinas e pilotos chegaram a Adelaide, palco do GP da Austrália. Com o título de pilotos e construtores mais do que decidido, agora corria-se mais para cumprir calendário, e a atmosfera estava muito mais descontraída. Mas ainda havia mais pré-qualificações para disputar, e alguns tinham de passar pela última vez na época pelo inferno das pré-qualificações, se queriam participar na festa do fim de semana. E sete pilotos de Formula 1 faziam aqui as suas despedidas: o argentino Oscar Larrauri, o italiano Enrico Bertaggia o espanhol Luis Perez-Sala, o britânico Jonathan Palmer, o italiano Piercaerlo Ghinzani, o francês René Arnoux e o italo-americano Eddie Cheever, todos respeitáveis veteranos do meio (ou fundo) do pelotão...


As pré-qualificações aconteceram na 5ª Feira, algo fora do habitual, pois normalmente aconteciam na sexta de manhã. Os Osella de Ghinzani e de Nicola Larini entraram na famigerada qualificação, assim como o Larrousse de Philippe Alliot e o Onyx de J.J. Letho, deixando de fora, por exemplo, os segundos Onyx de Stefan Johansson e Larrousse de Michele Alboreto. Os Zakspeed de Bernd Schneider e Aguri Suzuki também não conseguiram a qualificação, e esta seria a sua última corrida na Formula 1, depois de uma péssiam temporada onde se qualificaram apenas por duas vezes. Triste fim para uma equipa que chegou a fabricar os seus próprios motores...


As sessões de qualificação de sexta-feira e Sábado, numa pista citadina com pouca borracha no asfalto, habitualmente eram palco de várias saídas de pista dos carros, que se adaptariam progressivamente às armadilhas de Adelaide. Sendo assim o melhor foi Ayrton Senna, demonstrando que as manobras de Suzuka não o tinham abalado em termos de pilotagem. A seu lado estava Alain Prost, o seu arqui-rival e novo campeão do mundo. Na segunda fila estavam um surpreendente Pierluigi Martini, no seu Minardi, de regresso ao cockpit de um Formula 1 após ter recuperado dos ferimentos nas costelas que o impediram de correr no Japão, e o Benetton-Ford de Alessandro Nannini, o vencedor do GP do Japão. Na terceira fila ficavam os Williams-Renault de Thierry Boutsen e de Riccardo Patrese, enquanto na quarta estavam o Ferrari de Nigel Mansell e o Brabham-Judd de Stefano Modena. A fechar o "top ten" estavam os Dallara-Cosworth de Andrea de Cesaris e de Alex Caffi.


No campo oposto, quatro pilotos iriam assistir à última corrida do ano da bancada: o Tyrrell de Palmer, que fechava mais cedo a sua carreira na Formula 1, os Rial de Bertrand Gachot e Pierre-Henri Raphanel, e o Minardi de Perez-Sala, outro que fechava mais cedo a sua aventura na Formula 1. Quanto à Rial, também seria a última vez que os seus carros eram vistos nas pistas de Formula 1.

O dia da corrida estava nublado, com imensa chuva a cair por alturas do inicio do Grande Prémio, Os organizadores, instigados pelo pilotos, decidiram adiar a hora de largada por 30 minutos, esperando que esta diminuisse de intensidade e tivessem condições minimas para poder correr, mas ao final desse tempo, não havia sinal de diminuição da chuva. Alguns pilotos esboçaram um movimento de protesto, mas isso morreu à nascença. Quanto a Senna, iria largar de qualquer jeito, enquanto que Prost iria cumprir uma burocrática volta ao circuito e encostar às boxes, pois achava que o circuito não estava em condições.


Na largada, Senna e Prost ficam lado a lado, mas o brasileiro levava a melhor. No final da primeira volta, Prost cumpre o prometido e abandona, como fizera Lauda 13 anos antes, mas aqui o título já estava decidido. Entretanto, o Onyx de Letho fica parado numa zona perigosa, e a prova teve de se interrompida.


Na segunda partida, sem Prost na grelha, Larini ficou parado no momento da partida, enquanto que Jean Alesi, devido exactamente ao mesmo problema do italiano, partia da boxe. Senna disparava na liderança, enquanto que os Williams de Boutsen e Patrese vinham logo a seguir. Depois eram Nannini e Martini, seguido de E a partir daqui começavam o festival de abandonos devido ao "acquaplanning" e à pobre visibilidade: no espaço de duas voltas, seis pilotos já tinham abandonado: Arnoux, Berger e Alliot, vitimas de colisões, e Alesi, devido a problemas eléctricos.


Senna continuava disparado na liderança, tendo no final da décima volta conseguido um avanço de quase meio minuto. Mas esse impeto teve consequências: na volta 11, Senna perde o controlo do carro e faz três piões, qual bailarino de patinagem no gelo. A sorte é que conseguiu manter o motor ligado e o carro ter parado de rodar no sitio certo. Contudo, três voltas depois, em plena Brabham Straight, o "spray" de água impede de ver o... Brabham de Martin Brundle, e bate forte na traseira desse carro, perdendo a roda frente-direita. Consegue levar o carro até à boxe, e fica por ali.


A liderança cai assim nos braços de Thierry Boutsen, que tal como acontecera no Canadá, estava a liderar na chuva, e estava a ter uma toada cautelosa. Patrese estava atrás dele, mas tinha Nannini no seu encalço. Na volta 15, o piloto da Benetton passou para o segundo lugar. Cheever e Nakajima vinham logo a seguir, enquanto que o festival de despistes continuava. No final da volta 17, somente 13 carros estavam em pista.


Na volta 18, Nelson Piquet, a fazer a sua última prova pela Lotus, está na Brabham Straight quando não dá conta do Osella de Ghinzani, bem mais lento. O choque foi inevitável, mas aqui o Lotus atinge em cheio, levantando o Osella. A sorte teve a sua quota-parte, pois ninguém ficou ferido... A partir da volta 20, a chuva amainou um pouco, e a corrida era mais suportável.


Quem aproveitava da situação e fazia uma corrida exemplar à chuva era Satoru Nakajima, também de saída da Lotus, que baixava constantemente a melhor volta da corrida, a partir da volta 28, quando o colocou no 1.41,136, para depois a deixar na volta 64 no tempo de 1.38,480. Iria ser a unica volta mais rápida feita por ele e a segunda vez que era feita por um piloto japonês, depois de Masahiro Hasemi, com o seu Kojima, em 1976. Também este seria o último grande feito da Lotus na sua longa carreira na Formula 1.


Até ao fim, a unico motivo de interesse foi o despiste de Eddie Cheever, que ia seguro no seu quinto posto, pouco depois da desistência de J.J. Letho, que ia a caminho de conseguir mais pontos para a Onyx, pois circuilava em sexto lugar quando teve problemas eléctricos.


Quando por fim se agitou a bandeira de xadrez, na 70ª das 82 voltas previstas (porque se tinha chegado ao limite das duas horas de prova), Boutsen dava a segunda vitória do ano para a Williams-Renault, seguido de Alessandro Nannini e do seu companheiro Riccardo Patrese. Satoru Nakajima, o japonês "nadador" era o quarto, e o Benetton de Emmanuele Pirro e o Minardi de Pierluigi Martini fechavam os lugares pontuáveis.


E assim se corria o pano da temporada de 1989, que contou com uma inscrição "record" de 38 carros, com 29 pilotos a conseguirem pontuar, e onde a Ferrari estreou uma inovação que iria moldar o futuro, a caixa de velocidades semi-automática, com as mudanças a serem feitas no volante, mas no final, o principal foco foi um duelo fratricida na equipa mais poderosa do campeonato, que acabou mal numa chicane japonesa, dando um título a Alain Prost, de uma forma no mínimo polémica.

Fontes:

Santos, Francisco - Formula 1 1989/90, Ed.Talento/Edipódromo, Lisboa/São Paulo, 1989

http://en.wikipedia.org/wiki/1989_Australian_Grand_Prix
http://www.grandprix.com/gpe/rr484.html

7 comentários:

  1. Essa temporada de 1989 teve um desfecho ridículo. Ridículo mesmo. E não é porque sou brasileiro. A temporada de 1994, por exemplo, teve um desfecho igualmente ridículo e é um absurdo que Michael Schumacher tenha saído, de fato, como dono daquele título. Digo o mesmo a respeito de Prost em 1989.

    Não que o Senna tenha merecido, na pista, o título. Errou muito e o Prost, pelo que fez ao longo do ano, merecia ser campeão. Mas não dessa forma. Enfim...

    Não é à toa que brasileiros em geral odeiam o francês, mesmo que ele não tenha tido culpa no desfecho da história, que foi dado por Balestre.

    - Essa Benetton toda colorida era uma febre aqui no Brasil, a miniatura vendia feito água...

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  2. como eu sempre disse, fazer review de F1 é uma arte, um estilo literário distinto e esquisito, que precissa de fazer uma bolha: abarcando o momento num instante. gostei.

    Zakspeed, jeje. eu lembro ter escutado o nome desses caras, só não lembro como...

    não lebro ter asistido a corrida, mais.. como é que martini ferido e com um minardi acaba na segunda fileira?

    naquele accidente de senna com brundle, balestre deve ter pago uma garrrafa de champagne pra todo mundo na sala de imprensa, ne?

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  3. Senna deveria ter vencido esta corrida e levar a FIA para os tribunais civis. Já que fizeste o review da temporada de 89 podias escrever sobre as equipas e sobre os melhores pilotos da temporada, por acaso não te esqueceste do gp da Alemanha.

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  4. Sempre gosto de ler essas histórias de GP "antigos"...

    Só notei um pequeno deslize no texto... O primeiro piloto japonês a marcar uma volta mais rápida em um GP foi Masahiro Hasemi, num Kojima-Ford, no GP do Japão, em 1976, com o tempo de 1'18.23...

    O valoroso Satoru foi, na verdade, o segundo nesse quesito...

    abraços,
    Renato

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  5. Renato:

    Obrigado por me teres lembrado do Hasemi e do seu Kojima (varreu-se completamente da minha cabeça!). Já fiz a devida correcção, meu caro.


    Celso:

    Fazer "review" de temporadas passadas é mais complicado do que se julga, pois como sabes, isto é mais um "hobby" do que uma profissão, e a que tenho é muito dura (ser jornalista 24 Horas por dia é mais duro do que se pensa...)

    Quanto ao GP da Alemanha 1989, creio que ou já fiz anteriormente, ou não fiz de todo. Agora só consultando o meu arquivo, que já começa a ser enorme...

    Para finalizar: a ideia dos tribunais civis só iria agravar a situação. Isso foi pensado, mas provavelmente os advogados da McLaren e de Senna devem ter os dissuadido de tal medida, ainda por cima sabendo-se das arbitrariedades que Balestre era capaz de fazer. Provavelmente, ele próprio seria capaz de forçar a FIA a banir Senna e a McLaren...

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  6. Naquela época o Safety Car (Carro de Segurança) nem existia, porque naquela situação que a pista estava, nem largada deveria ter sido realizada.

    Notas:

    - os primeiros 3 pontos (4º lugar) de Satoru Nakajima na prova de encerramento;
    - os primeiros 2 pontos (5º lugar) na carreira de Emanuele Pirro e
    - a vitória de Thierry Boutsen garantiu a Williams o 2º lugar no campeonato mundial de construtores.

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  7. Foi sensacional, eu era criança quando assisti tudo isso na TV, e hoje é parte da historia da F1, apaixonado por carros como todos aqui eu acho rsrsr, um abraço sucesso.

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Comentem à vontade, mas gostava que se identificassem, porque apago os anónimos, por bem intencionados que estejam...