quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Grand Prix (numero 51, Grand Prix du Monaco - 1)

Monaco, 7 de Maio de 1970. Primeiro dia de treinos.

A chuva era uma chatice, naquela quinta-feira no sul de França. No calendário era Primavera, mas em termos de cartão postal, aquilo tinha mais ar de Inverno, aquele Inverno que agora só se encontrava nos pontos mais altos dos Alpes. O Mónaco seria mais uma cidade entalada na Riviera francesa se não fosse o seu estatuto especial: uma cidade-estado, neste caso uma monarquia, com um Casino e uma ex-atriz de Hollywood como princesa. Tal como nos contos de fadas. E este conto de fadas moderno ajudava no Orçamento do Estado monegasco...

O "Grand Prix de Monaco" existia desde 1929, e Monseiur Louis Chiron, o seu presidente, e que tinha sido um dos maiores pilotos do seu tempo, fazia o seu melhor para manter a sua eficácia. Depois do acidente de Nino Barlini, três anos antes, foram colocadas barreiras de proteção, primeiro uma só, mas depois do susto de Toino Bernardini, na prova de Formula 2 do ano passado, decidiram duplicar essa barreira. Mas algumas vozes já lhe diziam que se calhar, isso também não chegava. Ninguém sabia se isso era verdade, logo, tinham de esperar por este fim de semana para saber se sim ou não.

No "paddock", Pete Aaron via um velho amigo seu. Aliás, dois velhos amigos seus: Dan Gurney e Michael Delaney. Estavam acompanhados por Bruce McLaren e John Hogarth, naquilo que mais parecia ser uma reunião de velhos amigos. Dos vivos, só faltava Tim Randolph, que cuirosamente, também lá estava, mas a fazer de comentador na cadeia de TV americana ABC. E que provavelmente o iria chatear, mas no bom sentido, no fim de semana, fazendo perguntas sobre o circuito e sobre o carro.

- Velhas baleias, como vão?
- Andamos bem, e agradados pelos teus feitos. Tens material para seres campeão do mundo, mas não pensavamos que fosse agora.
- Isto ainda vai demorar, e o campeonato mal começou.
- Mas uma vitória na Africa do Sul e um pódio em Espanha não são coisas para se deiterem fora, não é verdade? perguntou Michael
- Lá isso é verdade. E o teu filme?
- Anda complicado. Estou em fase de montagem, e ando a brigar com os estudios sobre o tipo de montagem que eles querem. Tou farto de lhes dizer que o tempo deles acabou. SE levarem a melhor, temo que o filme fique uma merda.
- Tem calma, isso se resolve, respondeu McLaren.
- Que isso vai acontecer, isso vai. Mas prefiro que seja à minha maneira.
- Quando é que fazes um nosso?
- Veremos. Se der certo, eu faço, sorriu Michael.
- Quanto a mim, quero ver se hoje as coisas correm bem. Com esta chuva, não me parece, afirmou Pete à medida que olhava para fora e via o céu cinzento e os fios de chuva a cairem no asfalto.

--- XXX ---

Enquanto isso, os carros rolavam na pista, tentando segurar-se como podiam no asfalto molhado. Na boxe da Apollo, tentavam-se achar as melhores afinações para chuva, especialmente agora com as asas implantadas nos carros. Neste circuito travado, o "downforce" necessário era maior, para se fazer bem as curvas, embora fosse penalizador nas rectas. Mas o componente mais penalizado eraa caixa de velocidades, pois durante a corrida, faziam-se mais de 2700 mudanças de caixa durante as - agora - oitenta voltas da corrida.

- Como é que isso vai, perguntou John O'Hara.
- Está quase pronto, John, respondeu o mecânico-chefe.
- Ainda bem, preciso de dar umas voltas para ver como é que está.
- Há algum sinal do tempo amainar? perguntou Sinead, protegida num guarda chuva multicolor.
- Não hoje, receio. Sexta-feira vai parar, mas não corremos nesse dia, lamenta John. Sábado é a incógnita. Espero que esteja bom, referiu.
- E há de estar, retorquiu Teddy, enquanto saia do carro.
- Então?
- Um inferno, mas ainda é praticável. Quem se diverte é o nosso terceiro piloto, dizia Teddy, quando nesse preciso instante, Alexandre passava pela recta como uma bala para fazer mais uma volta ao traçado.

De facto, Alexandre dava voltas sem parar ao traçado, para se habituar à potência do carro e memorizar as curvas, treinando-se à chuva. Não sabia que tal iria acontecer no dia da corrida, mas ao menos estava precavido, caso acontecesse. Falava-se que podia chover no Domingo, mas nada estava confirmado. Até lá, guiava no seu Eagle o melhor que podia, o mais rápido que podia. E até marca tempos interessantes, para um chassis que acusava o seu uso e que não era mais do que uma adaptação de um carro velho aos novos tempos. Mas ele lhe tinha dado os seus primeiros pontos na corrida anterior, portanto, ainda dava luta.

Após passar pela Curva do Gasómetro, Alexandre foi para dentro das boxes, onde encostou o carro e saiu do cockpit, para se refrescar e dizer o que sentia:

- Para a chuva, o carro está bom, quase perfeito. Agora resta saber o que vai acontecer, se no Sabado não chover. Vamos ter de fazer tudo de novo, sem garantias que vai acontecer o mesmo no Domingo.
- Pois é, e parece que até estás a portar-te bem. fizeste o oitavo tempo, respondeu Aaron.
- Otimo, só que isto pode não servir de muito. Se no Sábado não chover, volta tudo à estaca zero. E aqui é como em Jarama: vinte carros para 16 lugares, sem tirar nem pôr.
- Então temos de dar o tudo por tudo, respondeu Teddy. O que não será fácil.

--- XXX ---

O fim de semana monegasco estava cheio de festas e bailes organizados quer pela Casa Real, quer pelas federações e alguns patrocinadores presentes, já a mostrar aquilo que valiam no meio. Ainda por cima na corrida mais glamorosa da Europa. Num deles, todos as lendas do automobilismo, chefes de equipa, pilotos e respectivas acompanhantes estavam por lá, desde Henry Temple a Pete Aaron, misturados com actores de Hollywood. Michael Delaney trouxera Kirk Douglas, por exemplo, para ver mais uma vez o ambiente do automobilismo. Ele que, como membro da equipa, convidara-o para fazer uma visita especial às boxes na Sexta e no Sábado.

Quanto aos pilotos, todos eles estavam num grupo em amena conversa, falando das condições da pista sob chuva e das possibilidades de marcar um tempo decente em piso seco.

- Somos vinte para 16 lugares. Não será fácil, afirmou John O'Hara.
- Tu não terás essa preocupação, John, respondeu Patick Van Diemen, sem sequelas visiveis do seu acidente na prova anterior, em Jarama. Nem eu, nem se calhar todos os que estão em equipas oficiais. Quanto aos privados... afirmou, olhando para Alex e Antti, em amena conversa num grupo à parte, que incluia uns joviais Toino Bernardini e Brian Hocking, mais o jornalista André Barros. Van Diemen aproximou-se a afirmou: Juntem-se a nós.
- Mas pensava que estavamos juntos!
- Estão um pouco separados de nós. Para isso já bastam os mais velhos...

Eles moveram-se um pouco e continuaram em amena cavaqueira sobre as condições e outras coisas mais. Passado uns minutos, notaram que o jovem finlandês falava mais do que o habitual, e tinha um copo de Martini na mão. Notando quem tinha tido tal proeza, John O'Hara aproximou-se de Alexandre de Monforte e afirmou:

- Como é que tu conseguiste desenrolar a lingua?
- Um pouco de persuasão, um copo na mão e já está!
- Tenta não fazer isso muitas vezes, rapaz.
- O copo? Não. Ele é tímido por natureza. Não conhecia ninguém e o presoal da Formula 2 teve pena dele e começou a meter conversa.
- E fala tão bem como corre?
- Acho que ele explica melhor num carro de corridas. O Bruce jordan está de olho nele.
- E falando no Diabo...

Bruce Jordan aproximou-se do grupo e saudou os presentes.

- Ah! É sempre bom ver os senhores em alegre convivo uns com os outros. "Good show!"
- Credo, parece o Bob Turner em novo... respondeu John.

Bruce tinha agora um fino bigode e patilhas quase até ao final da orelha. Segurava um copo de "whisky" na mão ("Tua marca, John? Infelizmente não, respondeu") e foi ter com eles para saber como andavam, fazendo conversas de circunstância. As coisas aconteceram ao longo da festa, com os convivas, mais de 150, a beber e a conversar, mesmo sem a presença dos Principes do Mónaco. Perto da meia-noite, John O'Hara olhou para as horas e disse:

- Por mim, já chega. Volto para o hotel para dormir.
- E não vais ver os pincipes? perguntou Alexandre.
- Rapaz... se tudo correr bem, irei ver os pincipes no Domingo, quando subir as escadas para receber o troféu de vencedor. Queres apostar? perguntou sorridentemente.

(continua)

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