- Está lá? É da redacção do jornal "O Liberal"?
- É sim.
- A senhorita Teresa Lencastre está?
- Ela não foi trabalhar hoje. Está de folga.
- Ah bom. Podiam dar-me o numero de telefone?
- Posso. Já agora, com quem estou a falar?
- Alexandre de Monforte.
- O piloto?
- Sim senhora.
- Só um momento, por favor.
- É sim.
- A senhorita Teresa Lencastre está?
- Ela não foi trabalhar hoje. Está de folga.
- Ah bom. Podiam dar-me o numero de telefone?
- Posso. Já agora, com quem estou a falar?
- Alexandre de Monforte.
- O piloto?
- Sim senhora.
- Só um momento, por favor.
...
- Estou?
- Teresa?
- Hmmm... eu. Quem fala?
- Acordei-te?
- Mais ou menos... Quem fala?
- É o Alexandre.
- Oh... desculpa, estava a dormir. Hoje é...
- ... eu sei, o teu dia de folga. Liguei para o jornal e me disseram.
- Gostou da entrevista?
- Gostei. Onde é que moras?
- Em Coburgo, ora.
- Isso já topei, mas onde?
- Porquê que perguntas isso?
- É porque falo de uma cabina telefónica em Coburgo e queria saber se dava para almoçar.
- Oh meu Deus, que horas são?
- São umas 11 e 10, mas posso esperar.
- Oh meu Deus... vêm-me buscar ao pé da Igreja de São Francisco de Assis. Eu moro num prédio a uns metros dali.
- Está bem. Fica bem? Eu oiço uns barulhos...
- Não é nada de importante...
- Está bem, até logo.
Alexandre desligou o telefone e saiu da cabina com um sorriso.
---XXX---
Em Goodwood, um circuito no sul da Grã-Bretanha, seis mecânicos estavam à volta do McLaren M7A com o motor Lamborghini flat-12 incorporado. Estavam a fazer os ajustes finais do carro, com Bruce McLaren de fato e Pedro Cavenaghi de lado, a observar a situação. Deveria estar ali John Hogarth, mas poucos dias antes, um acidente de barco quando estava a pescar com os seus dois filhos causou alguns arranhões e o pulso direito fraturado. Sendo Bruce a pessoa que estava atenta ao projecto Lamborghini, isso o fez estar muito ocupado nesses dias. Tinha estado a experimentar o seu carro de Can-Am para a temporada que aí avizinhava, e pretendia defender o título. Antes de entrar no carro, conversou com Pedro.
- Então?
- Continuo a não gostar deste motor. Tenho um mau pressentimento.
- Temos sempre maus pressentimentos nesta industria, Pedro.
- Obrigado por me dizer, mas... fazer um flat-12 quando se tem um V12 na garagem, das duas uma... ou é estupidez ou quer provar algo mais. Mas sou apenas um recém-chegado.
- Lá isso é verdade. Lembro-me de si em Imola, e pensava que era da fábrica. Afinal...
- Só fui contratado no dia seguinte. E para ser sincero, estou a aprender as coisas na Formula 1.
- Demora... apesar da minha pouca idade, esta é a minha vida. Estou aqui desde os 15 anos, fora aquilo que aprendi desde sempre na garagem do meu pai.
- Diga uma coisa... esse coxear que tem, foi alguma lesão? Estou curioso.
- Isto? Nahhh... Perthes.
- Como?
- Tive doença de Perthes. Afeta os ossos da coxa. Fiquei um ano e tal de cama, imobilizado, quando era criança.
- Deve ter doído.
- Sim, Ainda hoje incomoda um pouco, mas suporta-se.
- Estou a ver. Já agora, obrigado por se ter oferecido neste teste.
- Nada demais. O John já fez alguns bons progressos nestas semanas.
- É verdade, é verdade... mas tenho de convencer Don Ferruchio de que este é o caminho. E já tenho um aliado nesta aventura dentro da fábrica.
- Quem?
- Uma pessoa chamada Patrese. Ele é bom, é engenheiro, desenha os carros de fábrica, também gosta de automobilismo como eu. Vamos a ver se o convenço que este é o caminho... de perferência, sem este motor.
- Como é que o vai convencer?
- Vou tentar usar a arma da Ferrari.
- Boa sorte. Vai precisar dela.
Bruce entrou dentro do seu carro e esperou que os seus mecânicos ligassem o carro. Quando o fez, preparou-se para dar uma série de voltas ao circuito. Quando este desapareceu no horizonte, Pedro sentiu um ligeiro ardor no estômago, e colocou a sua mão em cima. Olhou logo a seguir para o relógio e viu que naquele momento eram meio dia e dez minutos.
--- XXX ---
Na casa dos O'Hara, Pete passeava pelo jardim, apesar do dia estar enevoado e algo frio. Ao seu lado estavam John O'Hara e um "caddy" chamado Paddy, que transportava o carrinho de golfe. Para Pete, o golfe era um desporto muito estranho para ele, mas para John seu piloto e co-proprietário da equipa, o golfe era um desporto relaxante, e tentava convencer o seu sócio e patrão, das suas vantagens.
- Caro Pete, como estamos agora na crista da onda, temos de nos comportar como estrelas. Logo, tens de experimentar este desporto.
- Acredito, mas... sinto que estou algo ridiculo com esta fatiota.
Pete Aaron estava vestido com uma camisola de bico com um desenho em losanglo, calças castanhas e sapatos brancos. Tinha vestido um casaco de "tweed" creme e tinha as meias até acima a proteger as calças. John estava vestido da mesma maneira, mas tinha acrescentado um chapéu verde. Ambos dirigiam-se para o "tee" de saída do primeiro buraco, onde ele iria dar as suas primeiras aulas da modalidade.
- Pete, observa e aprende.
John pegou num taco, colocou a bola e respectiva agulha na relva e ergueu o taco até bem acima, preparando-se para um movimento de pêndulo, no sentido de atingir a bola branca ali presente. Em poucos momentos, ele a atingiu em cheio, erguendo-se no ar a uma altura considerável até a meio do "fairway".
- Viste? Agora é a tua vez.
- Não... acho que passo.
- Peter James Aaron, estarás por acaso a acobardar-te? Olha que o Michael Delaney esteve aqui, fez todas as asneiras e mais algumas, e no entanto, nunca se queixou... nem se acobardou, afirmou, aproximando-se da face de Pete.
Pete hesitou por um momento, e depois murmurou: "Vou passar vergonhas, mas está bem"...
- Dá-me um taco.
- Paddy, dá um "Wood" dos bons. Vamos a ver se consegue atingir a bola à primeira, afirmou entre risos.
- Isto vai acabar mal... quando é que vamos almoçar?
--- XXX ---
- E então?
- Então o quê?
- Porque é que me convidou para almoçar?
- Porque sim, porque quero e porque acho que é bonita.
- Mas posso não estar interessada.
- Não interessa... convidei-a porque achei agradável a conversa que tivemos noutro dia.
- No dia da entrevista?
- Claro. Queria que fosse onde?
- Eu não vou dormir com outro piloto. Aprendi a lição.
- Ahahah... queres que te seja honesto? Simplesmente sucumbiste aos encantos do Pierre. E o alcool ajudou-te.
Teresa puxou de um cigarro para o fumar. Alexandre olhou-a fixamente e ela, incomodada, disse:
- Tu não fumas?
- Não, não gosto.
- E alcool?
- Já tenho o que baste na adega. Vivo nela, mas toco pouco. Nem à refeição...
- Credo... só falta saber se éshomossexual.
Alexandre riu-se à gargalhada de forma tão alta que mesmo não estando cheio à aquela hora, fez voltar boa parte das cabeças presentes para eles.
- Gosto demasiado de mulheres para me preocupar com homens.
- Porquê?
- Porque o quê?
- Gosta de mulheres?
- Por tudo... são bonitas, são charmosas, vestem-se bem, algumas delas tem um belo corpo...
- Tenho um belo corpo, Alexandre?
- A tua cara é bonita... gosto.
- E que mais?
- Pelo que notei, tem uns peitos engraçados, e as coxas são grandes.
- Se fosse um carro, seria o quê?
- Acho que serias um italiano. Ferrari ou Lamborghini... mas gosto também de Porsches, Alpines, Jordans, Triumphs...
- Queres ver-me nua?
- Tão cedo pela manhã? Não estamos a ir demasiado rápido?
- Tá bem, mostro-te as mamas...
- Tem calma, eheh... tem calma. Eu neste aspecto confesso ser tímido.
- Eh lá, uma revelação pessoal. Acho que vou pedir nova entrevista...
- Tem calma, repondeu, já a pensar que a conversa estava a ir longe demais. Teresa colocou a mão dela sobre a dele e disse:
- Desculpa, fui muito bruta. Eu não quis ser hostil...
Alexandre olhou para ela, mais uma vez, de forma séria durante alguns segundos que pareciam eternos, e depois esboçou um sorriso. Apertou a mão dela e disse:
- Sabe, Teresa... se ambos portarmos bem nos próximos tempos, pode ser que dê certo.
- A minha cama é de casal. Se este almoço correr bem...
Alexandre largou a mão dela e disse, sério:
- Teresa, eu sou Monforte e não Brasseur. E a querer-te, é para casar.
Preparou-se para abandonar a mesa e o restaurante quando, em relâmpago, ela também levantou-se e beijou-o na boca. Um beijo forçado, mas longo, que parecia ter durado uma eternidade. No final, ela disse:
- Ainda queres namorar comigo?
Ele simplesmente sorriu, sentou-se e pagou na ementa.
(continua)
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