terça-feira, 17 de agosto de 2010

Grand Prix (numero 55)

(continuação do capitulo anterior)

Depois de vinte voltas à pista, McLaren parou na boxe. Os mecânicos verificaram se havia algo fora do sitio, enquanto que Teddy Mayer, que estava no escritório, tinha chegado a Goodwood para ver o teste. Ambos trocaram breves impressões sobre a máquina e a seguir, Cavenaghi chegou-se ao pé dele para falar sobre o resultado do teste.

- Então?
- Tem mesmo pouca potência. O John tem razão. Quanto é que isto dá no banco?
- Honestamente? Não sei. Começo a pensar que a cada dia que passo aqui nesta companhia, as coisas são feitas no sentido de 'cada um por si'...
- Tou a ver. E tu não ajudas muito, por muito que esforces... Olha, direi que estamos a lidar com 370, 380 cavalos. É pouco.
- Eu sei, os Cosworth levam 400 cavalos...
- E são entre 50 a 70 quilos mais leves do que este. Tens aqui um belo desafio, Pedro.
- Honestamente? Se fosse o dono da Lamborghini, teria deitado este motor fora.
- Porquê não foram buscar um V12?
- Tretas vindas de trás. Falamos de um homem conflituoso...
- Ui, temo que iremos dar mal. E o Teddy não gosta muito deste negócio, afirmou baixinho.
- Meu Deus, isto é um saco de gatos!
- Por aí... que horas são?
- 12:45.
- Hmmm... hesito se darei mais uma volta agora ou não.
- Porquê?
- Pensei agora no seguinte: nunca comparei os meus tempos nestew motor com os do Cosworth. Nem eu, nem o John!

Bruce fica a pensar por um momento. Depois de algum tempo e de olhar para o carro, afirmou:

- Rapazes, vejam a caixa de velocidades. Se estiver tudo bem, regresso. Se não, vamos todos almoçar e voltamos às três da tarde para mais umas voltas à pista.

Os mecânicos verificam a caixa de velocidades e após alguns minutos verificam que não há nada de especial. Bruce voltou ao cockpit e disse:

- Teddy, tens os tempos do Cosworth?
- Tenho aqui.
- Pega no cromómetro, vou andar nos limites numa série de cinco voltas seguidas, para depois compararmos. Assim o Pedro leva para Itália informações preciosas sobre a potência e a fiabilidade do motor. Sempre tem algo com que trabalhar...
- É verdade.
- O chato é que só vamos comer à uma e meia, disse Teddy...
- Também estou com fome. Mais um pretexto para ir mais rápido, afirmou ao mesmo tempo que o flat-12 italiano era ligado mais uma vez. Dois minutos depois, McLaren partia para a pista. Eram 12:54.

--- XXX ---

- Senhora O'Hara...
- É um prazer recebê-lo em minha casa. Diga, o meu filho John lhe humilhou no golf?
- Temo que sim, Mrs. O'Hara...
- Chame-me Shioban, se não quer que lhe chame Mr. Aaron.
- Neste caso... Shioban, tenho imenso prazer em vir á sua casa.
- Muito obrigado. E pelos vistos, o meu filho continua a ter o péssimo hábito de convidar os seus convidados para uma partida de golf, sabendo que nenhum deles o consegue bater... e é o pior a jogar!
- Acredito que o seja, Shioban.
- O meu cunhado Arthur normalmente lhe ganha, e faz muito menos espalhafato do que ele. E a irmã anda perto...
- Quem diria!
- Sim, mas ela não pratica muito, Pete. Vamos almoçar?
- Claro.

A mesa redonda da grande sala da Mansão O'Hara estava posta para seis: Shioban O'Hara, o seu cunhado Arthur, o filho John e a filha Sinead, Pete e Pam Aaron. Todos se sentaram à volta e começaram a conversar à volta de um suculento prato de carne. Shioban fez questão de ficar entre Pete e John, para falar sobre o que pensava do desporto praticado pelos dois:

- Honestamente, Pete, tinha imenso medo e alguma hostilidade perante o automobilismo. É um desporto perigoso e mortal, e logo, ver o meu filho metido no meio disto tudo não me agrada nada, mas mesmo nada.

A cara de Pete fechou-se ao ouvir o que ela tinha a dizer. Depois prosseguiu.

- Contudo, nos últimos tempos, dei conta de algo diferente. De como isto tem impacto nas pessoas. Mr Aaron, quando comecei a ver o meu filho em carros e a correr em circuitos um pouco por todo o mundo, pensava porque é que não fazia outra coisa melhor. Mas depois notei que, primeiro, é nisto que ele é bom. E depois, que as outras pessoas gostam daquilo que ele faz. Sabe, Pete, o que aconteceu no dia em que ele ganhou na Africa do Sul?
- Não, Shioban.
- Arthur, conta ao Pete o que aconteceu na fábrica.
- Pete, no dia a seguir à vitória em Kyalami, os teabalhadores todos se juntaram e aplaudiram-me à medida que chegava à destilaria. Todos paravam o que estavam a fazer para me cumprimentar e recebemos imensos telegramas de parabéns vindos um pouco por toda a Irlanda, América, Canadá e até de Londres. Algumas delas diziam que pela primeira vez em muito tempo que se sentiam orgulho de serem irlandeses.
- Houve uma pequena multidão que nos esperou em Shannon. Nos últimos tempos, só o Kennedy e os Beatles é que fizeram uma coisa dessas, acrescentou Sinead.
- E a RTE transmite as corridas em directo. Aqui, isso só se compara ao rugby e ao futebol gaélico. Por um homem! concluiu Arthur.
- E pela primeira vez na minha vida, mais do que orgulho, sinto-me muito feliz pelo meu filho. Muito obrigado, Pete. Fez dele um herói para este povo.
- De nada, Shioban. O seu filho faz grande parte do trabalho...
- ... mas ajudam no resto. E acho que este dinheiro que ele investiu é bem gasto.
- Ele não, mãe. Nós.
- Eu sei, querida Sinead. E vocês me convenceram a fazê-lo. Mal sabia que estava a fazer um favor ao país. Até o velho De Valera já me ligou para dar os parabéns...
- E há outra coisa. Com os problemas no Norte, ter um irlandês a ganhar alguma coisa faz bem à autoestima deste país, afirmou Arthur.
- Isso passa logo, querido.
- Tenho sérias dúvidas, Shioban. Agora reativaram as velhas organizações do tempo da Guerra Civil, dos nossos pais e avós...
- Não te preocupes, isto não contamina o sul.
- Temo o contrário, Shioban.
- Bom, não vamos falar de politica, está bem? interrompeu John. Hoje temos convidados em nossa casa, e não devemos estragar o nosso almoço com o nosso quintal, hmmm?
- Tens razão, querido. E depois do almoço, vamos dar a experimentar o nosso "Irish Coffe". Tenho a certeza que vão gostar, afirmou uma sorridente Shioban.

A seguir, ela olhou para o relógio de parede, de pêndulo, com cerca de cem anos, que estava na sala. Ela marcava as 13:35.

--- XXX ---

Duas ambulâncias pararam no portão do circuito, esperando que alguém os abrisse, algo que foi feito em pouco mais de um minuto. Logo, acorreram, velozes, para o local onde se via uma pequena coluna de fumo, vinda de um posto de comando de comissários, onde o McLaren-Lamborghini ficou lá espetado de lado, partido em dois na zona do condutor.

Duas pessoas tentavam fazer massagem cardíaca ao corpo inerte, quanto que a ambulância não chegava. Quando aconteceu, dois enfermeiros sairam da primeira ambulância e tentaram ver os sinais viatis. Estes estavam muito fracos e disseram:


- Ponham-no na maca, vamos levá-lo para o hospital
- Posso ir com ele? perguntou Teddy.
- Não vale a pena, sigam-nos até ao hospital, disse o condutor de uma das ambulâncias.

Cedo ele foi colocado dentro e arrancaram o mais depressa possivel para o hospital mais próximo. Pelas suas caras, a situação era desesperada e tudo iria ser feito para tentar salvá-lo. Teddy olhou para as boxes e disse:

- Vou procurar um telefone para avisar a mulher e o resto da equipa.

Ele afastou-se o mais rápido possivel, enquanto que Pedro Cavenaghi via os destroços do McLaren. Ele sabia, pelas quatro voltas que tinha dado, que a diferença entre os dois carros rondava os dois a três segundos por volta. Uma simples observação notava que não havia uma roda no chassis de Bruce. E uma simples observação pela pista notaria que ela aterrou muito longe do local do acidente. Pedro começou a andar pela pista fora. Não via marcas de travagem de um carro, mas no seu lugar um grande sulco no asfalto, que continuava pela pista fora, até perto do local onde estava a roda, encostada a um canto ainda com parte dos aros presos.

Uma simples observação concluia que Bruce McLaren tinha sido vitima de uma falha de suspensão do seu carro, a mais de 240 km/hora, em plena reta. Agora, restava saber se Bruce sairia vivo disto, mas tinha a sensação que os dias da Lamborghini nesta equipa tinham acabado. Este acidente era um pretexto.
O seu estômago estava de novo a dar horas. Olhou para o relógio e verificou que já eram 14 horas. Dali a ponucos minutos, os médicos dirão a Teddy Mayer que o seu amigo Bruce tinha morrido.

E pelo final da tarde, o resto do mundo iria saber o que acontecera neste dia em Goodwood.
Pete e John iriam receber a noticia através de Sinead, que viria a correr através do campo de golfe nas traseiras de sua casa, com os olhos cerrados para que não se pudessem ver as lágrimas a correr pela sua cara. E que depois Shioban, sua mãe, a consolasse enquanto não ela parava de chorar. Quanto aos dois, não trocaram mais uma palavra no resto daquele dia, afundados no desgosto de terem perdido um amigo leal, corajoso e inventivo.

Quanto a Alexandre e Teresa, apanharam a noticia por acaso, no rádio do carro, quando iam a caminho de casa dela. Não conseguiram apanhar toda a noticia, mas ela institivamente percebeu que havia algo de mal. Pediu para que parassem na primeira cabina telefónica que vissem pelo caminho, e ela pegou no telefone para ligar ao jornal onde trabalhava. Minutos depois, um dos seus colegas tinha pegado no telex vindo de Londres onde vinha a noticia do seu acidente mortal. Da porta da cabina, ela olhou para Alexandre e não conseguiu ter a frieza suficiente para dar a noticia. Ele percebeu logo e tratou de a consolar, enquanto que por dentro, tentava absorver o choque daquela noticia.

(continua)

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