Eu sei que hoje se comemoram os vinte anos do tri-campeonato de Ayrton Senna. Lembro bem dessa madrugada onde acordei a meio da noite para poder ver em direto o desfecho daquele campeonato, que tinha começado com aquilo que parecia ser "um passeio no parque" por parte de Senna e do seu McLaren MP4/7, vencendo as quatro primeiras corridas do ano, para acabar a ser um duelo a dois entre ele e Nigel Mansell, num fabuloso Williams-Renault FW14, projetado por um jovem de 33 anos chamado Adrian Newey, e que demorou a arrancar.
Mas quando colocou a marcha certa, conseguiu superar Senna e o seu McLaren. Contudo, isso veio algo tarde para Mansell, mais por culpa própria ou da sua equipa. Os incidentes em Montreal e no Estoril fizeram com que o piloto britânico tivesse de fazer quase o impossivel para bater o piloto brasileiro: vencer as duas últimas corridas e esperar que Senna tivesse problemas e desistisse.
Sobre a corrida em si já falei há uns dias no Pódium GP. Mas o que me faz com que fale de novo sobre este Grande Prémio, para além do evento em si, é o desabafo que Ayrton Senna teve no final dessa corrida, e tem a ver com alguns eventos que tinham ocorrido dias antes, na sede da FIA, em Paris. Houve eleições para a FISA e o seu presidente, Jean-Marie Balestre, candidatava-se a mais um mandato, estando ele ao comando dos destinos da entidade máxima do desporto automóvel desde 1978. Tinha como grande opositor o britânico Max Mosley, que tinha a simpatia das equipas e de Bernie Ecclestone, mas toda a gente pensava que isto seria mais um "plebiscito" à liderança do francês. Pois bem, de forma algo surpreendente, Mosley sai como vencedor dessa eleição, com 43 votos contra 19.
Dias mais tarde, já em Suzuka, depois de Senna se sagrar campeão do mundo pela terceira vez, aproveitou a conferência de imprensa pós-corrida para soltar tudo o que vinha na sua alma. E decidiu bater forte e feio:
“Em 88 tive o meu melhor ano. No ano seguinte tive de lutar contra Prost na mesma equipe e também contra Balestre e a FISA. Aqui no Japão aconteceu o que todos conhecem: ataquei Prost na chicane, voltei à pista e ganhei. Mas, Balestre não quis e julgou contra mim.
Depois, na época passada, pedi aos comissários para mudarem o lugar do pole, ao que eles acederam. Apareceu Balestre e mudaram tudo de volta. ‘Aqui quem manda sou eu’, foi a resposta dele. Foi só para me prejudicar. Aí pensei que não podia ser f***** por pessoas estúpidas. Decidi que Prost não poderia de alguma forma sair Curva 1 na frente, para mim só haveria uma trajetória. Era melhor ele não tentar nada. Foi o que se viu. E, eu não queria que fosse assim.
Ele de fato largou melhor, passou à minha frente, fechou a porta e não me desviei um centímetro. Ao me sinto culpado. Todo foi um resultado de decisões erradas e parciais por pessoas que deveriam fiscalizar e não tomar partido. Venci o campeonato e isso é que importa. Tanto 89 como 90 foram maus exemplos para o automobilismo. Na altura não me importei com o incidente. A partir do momento que Prost tentou ser primeiro, dispus-me a não o deixar passar. Tudo foi resultado do ano anterior. O importante é falarmos o que vai dentro de nós.
Vivemos num mundo moderno e essas regras que proíbem os pilotos de falar verdades são uma m****. Nunca pedi desculpas a Balestre. Foi tudo mentira. Forçado pelo Ron e pela Honda, apenas assinei um acordo com alguns parâmetros, que lhe foi enviado por fax e ele mudou para divulgar.”
Quem recordou hoje essas declarações na blogosfera foi o Paulo Abreu, do Volta Rápida. Quando li tudo isto, estava fora de casa e lembro-me de ter lido isso no anuário do Francisco Santos. Quando peguei no livro, li outras coisas interessantes, nomeadamnte os ingressos para a corrida. Nesse ano, sendo uma prova decisiva para o campeonato, houve... quatro milhões de pedidos, para 325 mil lugares. E a organização teve de fazer um sorteio para dar os bilhetes para um autódromo que, como seria óbvio, estava cheio.
Já passaram vinte anos...
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