terça-feira, 5 de junho de 2012

Historieta da Formula 1: o rato e o coelho


Continuando a folhear a Motorspot de maio, dou de caras com uma secção de colunistas, liderado, claro, por Nigel Roebuck, que desfia as suas memórias, passado e presente, do automobilismo e da Formula 1, dei de caras sobre uma história que se conta do GP da Belgica de 1977, e sobre uma personagem que – numa era onde se faz ou se quer fazer filmes de automobilismo – merece um filme: David Purley. Sim, ele foi muito mais do que a personagem que tentou salvar Roger Williamson das chamas do seu March no GP da Holanda de 1973, também deu nas vistas quatro anos depois, em 1977, quando decidiu construir o seu próprio chassis. E porque é que Lauda tem um apelido que o tornou famoso.

Primeiro que tudo, David Purley era uma personagem, como dizem os ingleses, "larger than life", mais do que a vida. Ex-paraquedista, herdeiro de uma empresa de frigoríficos, a LEC, fundada pelo seu pai, por alturas de 1976 já tinha a fama toda por tudo que tinha feito em Zandvoort. Mas queria regressar à Formula 1, depois de passagens pela Formula 5000, e decidiu construir na garagem de Bognor Regis, a sua terra natal, um carro de Formula 1. Pediu a Mike Pilbeam – que desenhara o BRM 201 – que desenhasse um carro, pediu a Mike Earle – que mais tarde formaria a Onyx e atualmente é o dono da Team AON, que toma conta dos Ford Focus no WTCC – que cuidasse da equipa e sem testes e simuladores, como acontece neste inicio do século XXI, lá nasceu o chassis LEC.

A equipa teve dois motivos de destaque na sua breve aparição em 1977. A primeira foi em Zolder, quando o GP belga começou sob molhado e aos poucos, a pista secou, com os pilotos a irem para as boxes, trocar pneus. Como nessa altura, tal coisa durava uma eternidade – mais de 30 segundos – Mike Earle mandou uma mensagem nas placas a dizer para se mantivesse na pista o máximo de tempo que pudesse, e isso o colocou, a determinada altura… na liderança!

Com o tempo, apareceu Niki Lauda, que o pressionou por muitas voltas, mas Purley não cedeu, incomodando até o cerebral austríaco. Claro, isto teve efeitos na corrida, com Lauda a não chegar à vitória – quem venceu foi Gunnar Nilsson, na sua única vitória na Formula 1 - e Purley, no fim da corrida, perguntou a Earle: “Quem era o idiota do carro vermelho?” Após isto, ambos tiveram um aceso debate, onde Lauda chamou a Purley de “coelho” e este devolveu a graça, chamando-o de “rato”. Na corrida seguinte, Purley, no típico humor britânico, colocou um coelho ao lado do seu nome, enquanto que Lauda respondeu colocando o nome “The Rat” no seu capacete. Depois voltou a modifica-lo, chamando-o de “Super Rato”, pois esse era o nome que alguns dos seus amigos chamavam a.. Emerson Fittipaldi.

Infelizmente, a aventura de Purley teve um final abrupto na qualificação para o GP da Grã-Bretanha, quando ele perdeu o controlo do seu carro e bateu forte no muro. Resistiu a um impacto equivalente a mais de 179 G’s, entrando no livro dos recordes do Guiness por ter sido a pessoa que sobreviveu a um impacto tão pesado assim. 

Mas teve um custo na sua carreira na Formula 1, e no automobilismo em geral. Incapaz de correr, apesar de ter tentado em 1979 na Formula Aurora, uma competição britânica com chassis antigos de Formula 1, passou para a acrobacia aérea e morreu na sua Bognor Regis a 2 de julho de 1985, quando perdeu o controle do seu avião. Quanto ao chassis, está exposto no museu do automóvel elaborado por Tom Wheatcroft, em Donington Park.

Rob Widdows tinha boas razões para recordar bem David Purley e o seu carácter. “Os privados já desapareceram há muito da Formula 1. São ‘mavericks’, excêntricos, uma elite à parte. Purley era um convidado regular no meu programa de rádio ‘Track Torque’, e vinha regularmente acompanhado do seu amigo e vizinho, Derek Bell, ou da sua namorada de então, Gail. E às vezes vinha com ambos.

Certo dia, ele chegou tarde ao meu programa, E Bell explicou que o motivo foi porque Purley insistiu que queria caçar coelhos a partir da bagageira do seu Range Rover, e claro, isso fez-os atrasar. Noutra ocasião, ele decidiu por à prova a concentração do apresentador do programa de rádio, elevando a camisola de Gail, revelando assim a sua parte de cima.

Mais uma vez, era uma personagem fora do vulgar, digna de um filme de Hollywood. 

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