quinta-feira, 19 de junho de 2014

Os Pioneiros - Capitulo 28, a primeira em terras brasileiras

(continuação do capitulo anterior)


A PRIMEIRA CORRIDA EM TERRAS BRASILEIRAS


Aos poucos e poucos, com a chegada dos automóveis aos quatro cantos do mundo, e o impacto que eles causavam no seio das elites locais, o gosto pelo automobilismo entranhava-se. E o Brasil não era excepção. Depois da chegada dos primeiros automóveis, em 1890 e 1891, no Rio de Janeiro e em São Paulo, lentamente, estes entram na vida quotidiana, como simbolo da modernidade e progresso da jovem República. 

No inicio do século XX, apesar de aparecerem ainda em pequenas quantidades, já em 1900, Antônio Prado, então o perfeito de São Paulo, decidiu fazer a primeira legislação referente à circulação automóvel, implementando uma velocidade de 30 quilómetros por hora, bem como a obrigatoriedade de uma placa identificadora e a obrigatoriedade de uma vistoria. Também seria Antônio Prado que iria passar a primeira carta de condução (ou carta de habilitação) no Brasil, em 1904, a um industrialista de São Paulo, Menotti Falchi, proprietário da fábrica de chocolates Falchi. Aos poucos e poucos, a elite - principalmente os barões do café e industrialistas - irá importar carros, sobretudo da Europa. Em 1907, existirão no país cerca de 800 automóveis.

E é essa elite que fica entusiasmado com a possibilidade de fazer uma prova automobilistica. É certo que tinha havido uma corrida em 1902, no Hipódromo da Mooca, em São Paulo mas com apenas três carros presentes. Três anos depois, houve outra corrida, mas no Rio de Janeiro, mas desconhece-se a quantidade de pilotos presentes.

Em 1907 acontece um facto importante: a fundação do Automóvel Clube do Brasil, no Rio de Janeiro. Um dos seus fundadores é Antônio Prado Junior, um dos filhos de Antônio Prado, o perfeito de São Paulo. Então com 28 anos de idade, tinha ido para a Europa formar-se em engenharia e tornara-se entusiasta dos desportos (era o presidente de um clube, o Atlêtico Paulistano), e o automóvel era um deles. No ano seguinte, soube do repto de um conde francês com fama de aventureiro, Henri Lesdain. Ele tinha anunciado que iria ligar Rio de Janeiro a São Paulo, as duas cidades mais importantes do país, de automóvel. Nessa aventura contava com mais três compatriotas seus: Henri Trolet, Gaston Conte e Albert Vives, e iriam usar um Brasier.

A ligação, de 700 quilómetros, foi feita em 35 dias, e teve contornos de épico. Tiveram de abrir estradas a dinamite e contornaram pontes caídas, para além dos problemas de gasolina e das péssimas estradas que tiveram de enfrentar. No final, foram recebidos em apoteose pela população e pelos elementos mais importantes da cidade, entre eles, a familia Prado. Imediatamente decide fazer o mesmo desafio, mas ir de São Paulo a Santos. Ele arranjou um Motobloc e juntou-se a ele um dos seus irmãos, Paulo Prado, num Sizaire e Naudin. Para além dos dois, veio outro entusiasta, Clóvis Glicério, o jornalista Mário Cardim, do Estado de São Paulo, um sertanista, Bento Canavarro, um motorista e um mecânico.

O Sizaire e Naudin quebrou-se pelo caminho e teve de voltar para São Paulo, mas o Motobloc chegou a Santos após 37 horas de viagem, tendo obstáculos como pedras e árvores caídas, bem como as péssimas condições da estrada. Com o sucesso da empreitada, Prado, juntamente com outros entusiastas, funda a 1 de julho de 1908 o Automóvel Clube de São Paulo, com um grande propósito: fazer uma corrida de automóveis.

Quem traz a ideia é um engenheiro de 38 anos, então o secretário da Justiça e da Segurança Pública do estado de São Paulo, de seu nome Washington Luis. Um dos fundadores do Automóvel Clube de São Paulo e detentor de um automóvel Berliet, aproveita os domingos à tarde para fazer passeios de automóvel. E num desses percursos, ele têm a ideia de um circuito. Ele desenha um circuito de 76 quilómetros na cidade de Itapecerica, nos arredores de São Paulo, e ele fica encarregado das obras que seriam necessárias para colocar a estrada em condições.

A pista fica pronta e rapidamente ficam estabelecidas as regras: uma prova ao estilo de rali, ou seja, todos partiam com intervalos regulares de tempo, de cinco minutos, seria dada apenas uma volta, entre São Paulo, Itapercica e volta, haveria uma taxa de inscrição de cem mil reis para os carros (e 50 mil reis para as motas) e ficariam excluídos os profissionais, como pilotos e mecânicos, dando um grau amadoristico - e elitista da competição.

Foram criadas cinco categorias: motocicletas (A), voiturettes (B), carros entre 20 a 30 cavalos (C), carros até 40 cavalos (D) e carros acima dos 45 cavalos de potência (E). Nessa última classe só estava um carro: o Lorraine-Dietrich de Jorge Haentjens. A classe D tinha quatro carros, que eram os Fiat de Silvio Alvares Penteado e Osvaldo Sampaio; o Lorraine-Dietrich de Gastão de Almeida (outros dos fundadores do Automóvel Clube de São Paulo) e o Brown de Ricardo Vilela.

Na classe C, a mais concorrida - sete automóveis - estariam inscritos o Conde Lesdain, num Herald, Paulo Prado, num Berliet, Jordano Laport, num Renault, Alipio Borba, num Diatto-Clement, Frederico Otto, num NAG, Luis Moraes e Fluvio Bassi, ambos, em Clément-Bayard.

Na Classe B estavam quatro carros, dos deles dos irmãos Prado (Antônio Jr e Luis Prado), com respectivamente um Delage e um Sizaire-Naudin. Ferrucio Olivieri e José Prates, ambos num Lion-Peugeot, eram os outros membros. Por fim duas motocicletas, os Griffon de Eduardo Nielsen e Procópio Ferraz.

Inicialmente marcado para o dia 14 de julho, a corrida foi adiada para o dia 26 desse mês, e teve partida no Parque Antártica, em São Paulo. Cerca de dez mil pessoas (considerando que São Paulo tinha nessa altura 400 mil...) se reuniu lá para assistir á partida dos carros, enquanto que 450 policias, dispostos ao longo do caminho, faziam o possivel para evitar perturbações, como a travessia de pedestres, tocando cornetas e agitando bandeiras verdes, amarelas e vermelhas, assinalando o caminho livre ou perigo na estrada.

No final, o grande vencedor foi Silvio Alves Penteado, ao volante de um Fiat de 40 cavalos, com um avanço de quase dois minutos sobre Jorge Haetjens, a bordo do seu Lorraine-Dietrich, e mais de 15 minutos sobre Jordano Laport, a bordo de um Renault. Mas Penteado teve a sorte a seu lado, pois o grande lider, o outro Lorraine-Dietrich de Gastão de Almeida, tinha um avanço de cinco minutos quando o carter do seu carro caiu no chão, a seis quilómetros da meta, atrasando-se grandemente. Acabou no sexto posto, mas com um atraso de 27 minutos.

No final, a prova é um sucesso de público e contribui muito para a causa automobilística no Brasil. Um dos organizadores, Washington Luis, vai aproveitar isso para a sua vida politica: quer quando se torna Governador de São Paulo, em 1920, quer seis anos depois, quando se torna presidente, constroi diversas estradas no seu estado e no país, ganhando a alcunha de "estradeiro". E ele a abraçava bem: o seu lema era "governar é abrir estradas".

(continua no próximo capitulo)

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