(continuação do episódio anterior)
PARTE 3 - LONGOS E PERIGOSOS
Em 1969, das doze corridas no calendário, três eram do outro lado da Cortina de Ferro, embora em terras jugoslavas, as coisas eram bem mais liberais em termos de entrada e saída de pessoas. Como Josip Broz, vulgo Tito, advogava uma politica de não-alinhamento entre as duas potências em conflito - apesar de ser comunista e o seu país viver um regime de partido único - as coisas por lá eram bem mais liberais do que noutros países. Os seus próprios cidadãos tinham passaporte e poderiam viajar quando quisessem e como quisessem.
Contudo, os circuitos eram longos e complicados, numa altura em que as velocidades eram cada vez maiores. O circuito de Brno era desenhado nas estradas à volta da cidade, com quase 14 quilómetros de extensão, enquanto que em Opatija, perto da cidade croata de Rijeka, tinha seis mil metros, mas a paisagem fazia com que fosse chamada de "Mónaco do Adriático". Antes já tinha havido corridas de Formula 3 e de Formula Junior, mas as motos eram uma novidade.
Cedo, os pilotos começaram a criticar o circuito. As velocidades cada vez maiores e a estreiteza do circuito fizeram com que os pilotos começassem a reclamar e a recear o pior. A 17 de junho 1973, a corrida ficou marcada pelo boicote feito pelos pilotos da MV Agusta (a equipa de Giacomo Agostini), Yamaha e Harley Davidson, devido aos perigos existentes na pista. E também havia mais uma razão: a corrida acontecia um mês após o maldito GP da Nações, em Monza, onde um acidente na Curva Grande tinha matado o italiano Renzo Pasolini e o finlandês Jarno Saarinen.
Os que participaram, não deram o seu máximo, e pilotos como Dieter Braun (250cc) o hungaro Janos Drapal (350cc) e o neozelandês Kim Newcombe (500cc) foram os vencedores dessas corridas. Irónicamente, Newcombe morreria dois meses depois, numa corrida em Silverstone.
No ano seguinte, acontecia a primeira fatalidade quando o piloto britânico Billie Nelson morreu, vittima de um acidente na corrida de sidecars de 500cc. As coisas continuaram assim até 1977, quando os organizadores receberam um ultimato da FIM: ou melhoravam as condições do circuito, ou a prova era retirada do calendário.
A prova, que se realizou a 19 de junho, foi um desastre: no treinos para a corrida de 250cc, o italiano Giovani Zigotto sofreu um acidente quando o seu motor travou, acabando por cair na pista e ser atingido por outro piloto. Gravemente ferido, acabaria por morrer quatro dias mais tarde. Mas antes, outro acidente fatal aconteceria na corrida de 50cc, quando o suiço Ulrich Graff sofreu um furo e caiu, batendo fortemente com a cabeça no chão. acabaria por morrer horas depois no hospital. Irónicamente, tinha vencido a corrida no ano anterior.
A partir de 1978, a corrida aconteceu em Rieka, não muito longe dali, num autódromo construido para o efeito.
Por esta altura, o circuito de Brno já tinha encolhido em termos de dimensão. Quando entrou no calendário, em 1964, o circuito Masaryk tinha quase 14 quilómetros de extensão e os seus pilotos faziam uma volta na ordem dos cinco minutos e meio a seis minutos, num circuito essencialmente constituido por estradas à volta da cidade. E como acontecera com Opatija, com o tempo, os pilotos começaram a preocipar-se com a segurança, e em 1976, o circuito foi diminuído para quase onze quilómetros. O melhor tempo tinha sido feito por Johnny Ceccoto, em 1977, a bordo de uma Yamaha de 500cc. E esse foi o último ano em que as motos de 500cc visitaram o circuito. a partir dali, só os 250cc e os 350cc é que visitavam a pista, antes de sair de cena, em 1982.
PARTE 4 - O FIM DE TUDO
A 10 de março de 1985, em Moscovo, Konstantin Chernenko morria, vitima de um enfisema pulmonar. Era o terceiro lider que o Politburo soviético enterrava em dois anos e meio, e a direção achava que era altura de escolher um lider da nova geração, mais jovem e com maior impeto. O escolhido fora Mikhail Gorbachov, que na altura tinha 53 anos, e uma agenda escondida: queria reformar economicamente uma União Soviética que vivia dificuldades na sua economia planificada. E cedo entraram duas palavras no vocabulário: perestroika (reestruturação) e glasnost (abertura). Em suma, desejava abertura económica e politica.
Aos poucos, isso acontecia, e por vezes, essa abertura era demasiado veloz até para os próprios elementos da nomenculatura soviética. E isso também era acompanhado nos países satélites, num misto de receio e esperança, especialmente naqueles que tentaram aprisionar o seu povo, como a RDA.
Nos quatro anos seguintes, o Leste europeu seguiu atento ao que se passava, enquanto que começava a queixar-se dos seus próprios problemas. A Polónia vivia uma contestação ao regime desde 1980, quando surgiu o sindicato independente Solidariedade, apoiado pelo Papa João Paulo II, e que o regime do general Jaruzelwski tentou suprimir em desembro de 1981 com a implantação da lei marcial.
Em termos motociclisticos, as autoridades checoslovacas tinham por fim chegado à conclusão de que o ideal seria um circuito novo, com padrões modernos. Em 1986, no mesmo ano em que foi feito o circuito de Hungaroring e este acolhia a Formula 1, os checos construiram um circuito permanente num sitio onde passava parte do traçado do circuito Masaryk. Com isso, a corrida checoslovaca regressou ao calendário em 1987, com o australiano Wayne Gardner a ser o vencedor na classe 500cc.
A corrida checa acompanhava a corrida jugoslava no calendário, e em 1990, pela corrida húngara, no próprio Hungaroring, voltando o Leste europeu a ter três corridas no calendário. Mas nesse verão, o Leste vivia o seu primeiro ano em liberdade, com a queda do Muro de Berlim e a discutir a reunificação alemã.
Contudo, quem não estava vivo para assistir a tudo isto era Ernst Degner. Terminada a sua carreira no MotoGP, continuou a trabalhar para a Suzuki e foi viver para as Canárias, onde tinha um concessionário local de aluguer de automóveis. Morreu a 10 de setembro de 1983, aos 51 anos, em circunstâncias consideradas misteriosas. as teorias da conspiração falavam que a Stasi, a policia secreta alemã, poderia tê-lo matado, em vingança, mas na realidade, tinha sido vitima de uma overdose de medicamentos, dado que ele estava em constantes dores por causa das sequelas do seu acidente em Suzuka, vinte anos antes. A curva Degner, no circuito japonês, foi batizada em sua honra.
Em terras jugoslavas, Rijeka era um circuito convencional, mas no final da década de 80, voltava a sofrer os mesmos problemas de Opatija: era estreito e travado, e as condições de segurança degradavam-se, especialmente em relação ao asfalto e ao pouco profissionalismo dos seus comissários de pista. E a corrida de 1990, realizada a 17 de junho, foi particularmente atribulada por isso.
A corrida de 250cc foi atribulada desde o inicio, com o holandês Wilco Zeelenberg a ficar magoado nos treinos, e estes foram suficientemente graves para não poder partir para a prova, no dia seguinte. A mesma coisa tinha acontecido na corrida de 500cc, quando o francês Christian Sarron também tinha caído e sofrido lesões que também o impediram de correr.
Ali, as coisas foram particularmente más, por causa da chuva, que caiu a duas voltas do fim, obrigando à antecipar o final. Mas uma má corrdenação entre os comissários de pista, por causa das bandeiras vermelhas, fez com que alguns dos pilotos fossem mais velozes do que outros, que as tinham visto e abrandavam o ritmo. e isso causou um desastre, quando um dos pilotos, Darren Milner, abrandou em zona proibida, e numa altura em que o alemão Reinhold Roth passava em alta velocidade. Ambos chocaram fortemente, afetando ainda o espanhol Alex Crivillé.
A seguir, a confusão era geral. Milner e Crivillé foram rapidamente socorridos pelos comissários que atravessavam a pista... ainda com pilotos a correr, enquanto que Roth era o piloto mais afetado: tinha tido um traumatismo craniano e toráxico, e estava em coma. A sua namorada, quando o viu antes de ser transportado de helicóptero para o hospital mais próximo, desmaiou perante a extensão dos seus ferimentos. E tudo isto a ser transmitido em direto pela televisão... Roth ficou duas semanas em coma, e quando acordou, estava paralisado do lado esquerdo do seu corpo.
A corrida de 500cc fora atrasada, para que o asfalto fosse limpo e a chuva passasse. Mas as quedas continuavam: Alex Barros, Ron Haslam e Randy Mamola caíam no asfalto, com o americano a cair por causa do irlandês. Mas o acidente mais grave tinha acontecido com o espanhol Sito Pons, quando este caiu na pista na frente de Pierfrancesco Chili, atingindo-o fortemente. Pons foi colocado na maca de forma pouco profissional, pois as suas lesões tinham sido graves, e faltaria metade da temporada. E isso precipitou o seu abandono da competição no ano seguinte.
No final, o vencedor foi o americano Wayne Rainey, mas tudo o que tinha acontecido por ali tinha sido demais para a FIM, que retirou a corrida jugoslava do calendário, para não mais voltar. Mas no ano seguinte, o próprio país também deixava de existir, passando a cidade a fazer parte da Croácia. E uma certa era do motociclismo também chegava ao fim.
Cedo, os pilotos começaram a criticar o circuito. As velocidades cada vez maiores e a estreiteza do circuito fizeram com que os pilotos começassem a reclamar e a recear o pior. A 17 de junho 1973, a corrida ficou marcada pelo boicote feito pelos pilotos da MV Agusta (a equipa de Giacomo Agostini), Yamaha e Harley Davidson, devido aos perigos existentes na pista. E também havia mais uma razão: a corrida acontecia um mês após o maldito GP da Nações, em Monza, onde um acidente na Curva Grande tinha matado o italiano Renzo Pasolini e o finlandês Jarno Saarinen.
Os que participaram, não deram o seu máximo, e pilotos como Dieter Braun (250cc) o hungaro Janos Drapal (350cc) e o neozelandês Kim Newcombe (500cc) foram os vencedores dessas corridas. Irónicamente, Newcombe morreria dois meses depois, numa corrida em Silverstone.
No ano seguinte, acontecia a primeira fatalidade quando o piloto britânico Billie Nelson morreu, vittima de um acidente na corrida de sidecars de 500cc. As coisas continuaram assim até 1977, quando os organizadores receberam um ultimato da FIM: ou melhoravam as condições do circuito, ou a prova era retirada do calendário.
A prova, que se realizou a 19 de junho, foi um desastre: no treinos para a corrida de 250cc, o italiano Giovani Zigotto sofreu um acidente quando o seu motor travou, acabando por cair na pista e ser atingido por outro piloto. Gravemente ferido, acabaria por morrer quatro dias mais tarde. Mas antes, outro acidente fatal aconteceria na corrida de 50cc, quando o suiço Ulrich Graff sofreu um furo e caiu, batendo fortemente com a cabeça no chão. acabaria por morrer horas depois no hospital. Irónicamente, tinha vencido a corrida no ano anterior.
A partir de 1978, a corrida aconteceu em Rieka, não muito longe dali, num autódromo construido para o efeito.
Por esta altura, o circuito de Brno já tinha encolhido em termos de dimensão. Quando entrou no calendário, em 1964, o circuito Masaryk tinha quase 14 quilómetros de extensão e os seus pilotos faziam uma volta na ordem dos cinco minutos e meio a seis minutos, num circuito essencialmente constituido por estradas à volta da cidade. E como acontecera com Opatija, com o tempo, os pilotos começaram a preocipar-se com a segurança, e em 1976, o circuito foi diminuído para quase onze quilómetros. O melhor tempo tinha sido feito por Johnny Ceccoto, em 1977, a bordo de uma Yamaha de 500cc. E esse foi o último ano em que as motos de 500cc visitaram o circuito. a partir dali, só os 250cc e os 350cc é que visitavam a pista, antes de sair de cena, em 1982.
PARTE 4 - O FIM DE TUDO
A 10 de março de 1985, em Moscovo, Konstantin Chernenko morria, vitima de um enfisema pulmonar. Era o terceiro lider que o Politburo soviético enterrava em dois anos e meio, e a direção achava que era altura de escolher um lider da nova geração, mais jovem e com maior impeto. O escolhido fora Mikhail Gorbachov, que na altura tinha 53 anos, e uma agenda escondida: queria reformar economicamente uma União Soviética que vivia dificuldades na sua economia planificada. E cedo entraram duas palavras no vocabulário: perestroika (reestruturação) e glasnost (abertura). Em suma, desejava abertura económica e politica.
Aos poucos, isso acontecia, e por vezes, essa abertura era demasiado veloz até para os próprios elementos da nomenculatura soviética. E isso também era acompanhado nos países satélites, num misto de receio e esperança, especialmente naqueles que tentaram aprisionar o seu povo, como a RDA.
Nos quatro anos seguintes, o Leste europeu seguiu atento ao que se passava, enquanto que começava a queixar-se dos seus próprios problemas. A Polónia vivia uma contestação ao regime desde 1980, quando surgiu o sindicato independente Solidariedade, apoiado pelo Papa João Paulo II, e que o regime do general Jaruzelwski tentou suprimir em desembro de 1981 com a implantação da lei marcial.
Em termos motociclisticos, as autoridades checoslovacas tinham por fim chegado à conclusão de que o ideal seria um circuito novo, com padrões modernos. Em 1986, no mesmo ano em que foi feito o circuito de Hungaroring e este acolhia a Formula 1, os checos construiram um circuito permanente num sitio onde passava parte do traçado do circuito Masaryk. Com isso, a corrida checoslovaca regressou ao calendário em 1987, com o australiano Wayne Gardner a ser o vencedor na classe 500cc.
A corrida checa acompanhava a corrida jugoslava no calendário, e em 1990, pela corrida húngara, no próprio Hungaroring, voltando o Leste europeu a ter três corridas no calendário. Mas nesse verão, o Leste vivia o seu primeiro ano em liberdade, com a queda do Muro de Berlim e a discutir a reunificação alemã.
Contudo, quem não estava vivo para assistir a tudo isto era Ernst Degner. Terminada a sua carreira no MotoGP, continuou a trabalhar para a Suzuki e foi viver para as Canárias, onde tinha um concessionário local de aluguer de automóveis. Morreu a 10 de setembro de 1983, aos 51 anos, em circunstâncias consideradas misteriosas. as teorias da conspiração falavam que a Stasi, a policia secreta alemã, poderia tê-lo matado, em vingança, mas na realidade, tinha sido vitima de uma overdose de medicamentos, dado que ele estava em constantes dores por causa das sequelas do seu acidente em Suzuka, vinte anos antes. A curva Degner, no circuito japonês, foi batizada em sua honra.
Em terras jugoslavas, Rijeka era um circuito convencional, mas no final da década de 80, voltava a sofrer os mesmos problemas de Opatija: era estreito e travado, e as condições de segurança degradavam-se, especialmente em relação ao asfalto e ao pouco profissionalismo dos seus comissários de pista. E a corrida de 1990, realizada a 17 de junho, foi particularmente atribulada por isso.
A corrida de 250cc foi atribulada desde o inicio, com o holandês Wilco Zeelenberg a ficar magoado nos treinos, e estes foram suficientemente graves para não poder partir para a prova, no dia seguinte. A mesma coisa tinha acontecido na corrida de 500cc, quando o francês Christian Sarron também tinha caído e sofrido lesões que também o impediram de correr.
Ali, as coisas foram particularmente más, por causa da chuva, que caiu a duas voltas do fim, obrigando à antecipar o final. Mas uma má corrdenação entre os comissários de pista, por causa das bandeiras vermelhas, fez com que alguns dos pilotos fossem mais velozes do que outros, que as tinham visto e abrandavam o ritmo. e isso causou um desastre, quando um dos pilotos, Darren Milner, abrandou em zona proibida, e numa altura em que o alemão Reinhold Roth passava em alta velocidade. Ambos chocaram fortemente, afetando ainda o espanhol Alex Crivillé.
A seguir, a confusão era geral. Milner e Crivillé foram rapidamente socorridos pelos comissários que atravessavam a pista... ainda com pilotos a correr, enquanto que Roth era o piloto mais afetado: tinha tido um traumatismo craniano e toráxico, e estava em coma. A sua namorada, quando o viu antes de ser transportado de helicóptero para o hospital mais próximo, desmaiou perante a extensão dos seus ferimentos. E tudo isto a ser transmitido em direto pela televisão... Roth ficou duas semanas em coma, e quando acordou, estava paralisado do lado esquerdo do seu corpo.
A corrida de 500cc fora atrasada, para que o asfalto fosse limpo e a chuva passasse. Mas as quedas continuavam: Alex Barros, Ron Haslam e Randy Mamola caíam no asfalto, com o americano a cair por causa do irlandês. Mas o acidente mais grave tinha acontecido com o espanhol Sito Pons, quando este caiu na pista na frente de Pierfrancesco Chili, atingindo-o fortemente. Pons foi colocado na maca de forma pouco profissional, pois as suas lesões tinham sido graves, e faltaria metade da temporada. E isso precipitou o seu abandono da competição no ano seguinte.
No final, o vencedor foi o americano Wayne Rainey, mas tudo o que tinha acontecido por ali tinha sido demais para a FIM, que retirou a corrida jugoslava do calendário, para não mais voltar. Mas no ano seguinte, o próprio país também deixava de existir, passando a cidade a fazer parte da Croácia. E uma certa era do motociclismo também chegava ao fim.
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