terça-feira, 7 de junho de 2016

Cinco historietas marcantes do circuito de Montreal

Há muito tempo que estou convencido que quando a Formula 1 chega a Montreal, o espírito de Gilles Villeneuve instala-se sobre o paddock e o pelotão, fazendo coisas que são absolutamente invulgares, especialmente nos tempos em que a categoria se tornou em algo aborrecido. Em muitos aspectos, esta corrida bem popular entre os fãs, pilotos e equipas é um local que todos esperam durante todo o ano, e desde 1978, é o lugar onde se disputa o GP do Canadá, depois de nove anos no circuito de Mosport, no Ontário, e outros dois no circuito de Mont-Tremblant, também no Quebec.

Desenhado no mesmo sitio onde em 1967 acolheu a Exposição Universal que comemorou o centenário da criação da Confederação Canadiana, o circuito da Ile de Notre-Dâme entrou no calendário em 1978 e em 1982 recebeu o nome atual, em homenagem ao mitico piloto canadiano, morto nesse mesmo ano. Com interrupções em 1987 e 2009, foram poucas as corridas ditas... aborrecidas. Eis cinco exemplos, dos anos 70 até à década atual, onde a reputação do circuito se solidificou nas mentes dos fãs.


1 - A primeira vez do piloto local (1978)


Em 1978, a Formula 1 saiu de Mosport para Montreal, embora a corrida continuasse a ser no outono. Naquele ano, era a corrida de encerramento do campeonato, numa altura em que os Lotus tinham dominado a temporada, também marcada pelo acidente mortal de Ronnie Peterson. no seu lugar, foi chamado o francês Jean-Pierre Jarier, com reputação de ser veloz, mas pouco consistente.

No novo circuito, ainda com as marcas da construção (havia lama nas bermas, uma armadilha para pilotos e carros) e debaixo de uma temperatura próxima dos zero graus, Jarier pegou no modelo 79 e voou para a pole-position, a terceira (e última) da sua carreira. No arranque, fez uma corrida consistente, no sentido de vencer, seguido por Alan Jones, Jody Scheckter e Gilles Villeneuve. Para Jarier, foi o momento em que esteve mais próximo de subir ao lugar mais alto do pódio, mas na volta 51, uma falha na pressão do óleo fez com que abandonasse a corrida. Nunca mais teria outra chance na sua longa carreira.

O grande beneficiado disto tudo foi Gilles Villeneuve, que estava atrás do francês, e levou o carro até ao fim, conseguindo uma emocionante vitória, a primeira da sua carreira, e um ano depois da sua estreia na Ferrari, em Mosport. Joduy Scheckter foi o segundo, na frente de Carlos Reutemann, no segundo Ferrari.


2 - Nariz, que nariz? (1981)


Três anos depois, o GP do Canadá era a penúltima corrida de um campeonato cujo titulo estava a ser disputado a quatro: o Renault de Alain Prost, o Ligier de Jacques Laffite, o Brabham de Nelson Piquet e o Williams de Carlos Reutemann. Alan Jones, o campeão do ano anterior, estava de fora da luta pelo título, e já pensava na retirada da competição, enquanto que Gilles Villeneuve esperava conseguir um brilharete na sua corrida "de casa".

Piquet fez a pole-position, seguido por Reutemann, Jones e Prost. Jacques Laffite era décimo na grelha, um lugar na frente de Villeneuve.

A corrida aconteceu debaixo de frio e chuva, com confusão nas primeiras voltas. Jones foi para a frente, aproveitando um incidente que tinha deixado o seu companheiro de equipa no fundo do pelotão, mas na sétima volta despistou-se, e o brasileiro saiu da pista para evitar a colisão. Na volta dez, Prost era o líder, com Laffite em segundo, mas na volta treze, o francês da Ligier ficou com o comando da corrida.

Atrás, Villeneuve sofreu um pequeno incidente que danificou a sua asa frontal. Este começou a desfazer à frente de toda a gente, que observava, entre o espantado e o aterrado, o que o canadiano fazia para equilibrar o carro na pista. Por fim, a asa cedeu e ele prosseguiu.

No final, Jacques Laffite foi o grande vencedor, com o McLaren de John Watson no segundo posto. Gilles Villeneuve foi o terceiro, e Nelson Piquet foi o quinto, conseguindo dois pontos essenciais na sua luta pelo titulo, que iria alcançar na corrida final, em Las Vegas.   

A edição de 1981 viria a ser a última realizada em setembro/outubro. As baixas temperaturas naquele período do ano fazem com que partir do ano seguinte, o GP do Canadá ocorreria a meio de junho. E infelizmente, seria a última vez que Gilles correria ali. Morreria um mês antes da edição seguinte do GP canadiano. 


3 - Para acabar primeiro, primeiro tem de acabar (1991)


Dez anos depois, a Formula 1 estava em paragens canadianas numa altura em que Ayrton Senna e a McLaren dominavam o pelotão da Formula 1, mas por essa altura, a Williams já reagia, com Nigel Mansell e o modelo FW14. A quinta prova do campeonato de 1991 tinha dado algumas novidades, como por exemplo, o despedimento do diretor da Ferrari, Cesare Fiorio, a pedido de Alain Prost.

Na qualificação, Riccardo Patrese foi o melhor, na frente de Nigel Mansell, Ayrton Senna e Alain Prost. Nelson Piquet era o oitavo na grelha, na frente do Tyrrell de Stefano Modena.

A corrida foi interessante. Os Williams dominaram, enquanto que Senna desistiu na volta 25 devido a um problema com o alternador. Patrese cedeu a liderança a Mansell devido a problemas de motor, e depois perdeu para Piquet e Modena. No inicio da última volta, o "brutânico" tinha um avanço de quase um minuto e já comemorava a vitória quando... deixou ir o seu motor abaixo. Piquet, que vinha atrás, nem queria acreditar, e venceu a sua 23ª (e depois, última) vitória da sua carreira. E ele foi sempre a sorrir ao pódio, contando depois que "teve um orgasmo" ao saber o que tinha acontecido ao seu rival. 

A corrida canadiana teve também mais alguns resultados invulgares: não só aconteceu o melhor resultado de sempre de Stefano Modena, com o segundo lugar no seu Tyrrell-Honda, como também foi o local onde a Jordan conseguiu os seus primeiros pontos da sua história, com o quarto lugar alcançado por Andrea de Cesaris, e o quinto posto de Bertrand Gachot. Mansell, mesmo com o seu problema, foi sexto.

Curiosamente, a vitória de Piquet era a sétima consecutiva de um piloto brasileiro. Desde o GP do Japão de 1990, o equilíbrio era patente: Senna tinha quatro, Piquet três. 


4 - ... e tudo aquele chassis desintegrou (2007)

Em 2007, a corrida de Montreal era a sexta corrida do campeonato, numa luta entre a McLaren e a Ferrari, com Lewis Hamilton a estar no centro das atenções, não só porque era um estreante, como conseguia bater o pé a Fernando Alonso, o então campeão do mundo.

Na qualificação, a McLaren monopolizou a primeira fila, com Lewis Hamilton a fazer a sua primeira pole da sua carreira, com Fernando Alonso atrás. A corrida começou com Hamilton a ser melhor do que Alonso, que saiu de pista e danificou uma parte do seu carro, sofrendo até ao fim. Na volta 22, Adrian Sutil bateu forte e fez com que o Safety Car saísse da pista pela primeira vez. Ele ficou por quatro voltas, e logo a seguir, a corrida foi retomada... por uma volta. O polaco Robert Kubica estava colado atrás do Toyota de Jarno Trulli quando perdeu o controlo na travagem para o gancho, desfazendo o seu Sauber-BMW, num dos acidentes mais espectaculares da década. 

Apesar de todos os incidentes, a corrida acabou com Lewis Hamilton a vencer pela primeira vez na sua carreira, na frente de Nick Heidfeld e o Williams de Alexander Wurz. O mais surpreendente foi no sétimo posto, quando Takuma Sato, no seu Super Aguri, que ficou na frente de... Fernando Alonso.

O polaco teve contusões nos pés e queria correr na prova seguinte, em Indianápolis, mas a FIA vetou a sua participação, por motivos médicos. A BMW Sauber convoca assim um jovem alemão de 20 anos para o seu lugar, fazendo assim a sua estreia na Formula 1. Seu nome? Sebastian Vettel

Para Kubica, Montreal é palco de extremos: no ano seguinte, vai ser em Montreal que irá conseguir a sua única vitória na Formula 1.


5 - Quatro horas para definir um vencedor (2011)


De vez em quando a Formula 1 corre em Montreal debaixo de chuva intensa. Foi o que aconteceu em 2011, quando durante todo o fim de semana, o mau tempo e as baixas temperaturas afetaram todo o fim de semana da corrida canadiana.

Sebastian Vettel foi o poleman, na frente do Ferrari de Fernando Alonso e do seu companheiro, Felipe Massa. No dia da corrida, caía uma chuva persistente, que fez com que a corrida começasse atrás do Safety Car. As coisas continuaram assim nas cinco voltas seguintes, até que a corrida prosseguiu, com alguns incidentes mais ou menos graves. Na oitava volta, ambos os McLaren colidiram, com Hamilton a desistir, e o Safety Car voltou a entrar na pista nas cinco voltas seguintes.

Contudo, as condições pioraram e na volta 20, a bandeira vermelha foi acionada, e os carros pararam na grelha. As coisas ficaram assim durante duas horas, esperando que as condições melhorassem. Pelas quatro da tarde, hora local, a corrida recomeçou atrás do Safety Car, com Vettel na liderança, e o japonês Kamui Kobayashi atrás. 

No final, quase às cinco da tarde, tudo se definiu na última volta: Sebastian Vettel estava na frente, mas a ser acossado pelo McLaren de Jenson Button, que estava a aproximar-se numa superfície que secava rapidamente. A algumas curvas do fim, o Red Bull do piloto alemão escapou de traseira e o britânico aproveitou, acabando por alcançar a vitória. Tudo isto durou quatro horas, quatro minutos e 39 segundos: a corrida mais longa da história da Formula 1.

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