"Big John" nasceu a 11 de fevereiro de 1934 no sul de Londres. O seu pai era Jack Surtees, que tinha sido piloto de motos na sua juventude, e tinha, depois de pendurar o capacete, decidido abrir um concessionário de motos. O final da II Guerra pode ter acabado a carreira do pai, mas abriu a carreira do filho, pois em 1948, começou a correr numa Vincent. A primeira prova foi num sidecar, com Jack ao volante. Ambois venceram, mas quando os organizadores descobriram que John ainda era menor de idade - tinha 14 anos - acabaram por desclassifica-lo.
No ano seguinte, começou a andar sozinho em motos, e logo, melhorou os seus talentos em cima de duas rodas. Com uma Vincent - firma do qual foi trabalhar como aprendiz em 1950 - começou a mostrar o seu talento como piloto de fábrica, e cedo passou para motos mais potentes, como Triumph e Norton. Foi em cima de uma moto de 250cc, comprado por doze libras, que venceu a sua primeira corrida em Brands Hatch, em 1951.
Com o passar dos anos, Surtees chamou a atenção da Norton, com bons resultados, especialmente na corrida de Ulster. Foi aí que conseguiu o seu primeiro pódio, em 1955, o suficiente para que Joe Craig, o patrão da marca. lhe desse uma chance. Contudo, com todo o talento mostrado, a Norton passava por dificuldades, e libertou do seu contrato no final dessa temporada.
Assim sendo, Surtees foi para Itália, onde assinou pela MV Agusta. O Conde Agusta tinha ficado admirado com as suas capacidades, e logo em 1956, participou no mundial com motos de 350 e 500cc, numa altura em que os pilotos poderiam participar em mais do que uma categoria. Nesse ano, conseguiu o seu primeiro campeonato de 500cc, e os italianos o chamaram de "filho do vento".
No final de 1957, Gilera e Moto Guzzi tinham decidido abandonar o campeonato, e basicamente as MV Agusta dominaram as pistas. Entre 1958 e 1960, Surtees venceu tudo: não só os campeonatos de 350 e 500cc, como também o Isle of Man TT e o Ulster TT. Em suma, dominou em todas as provas onde tinha duas rodas. Em 1959, a BBC nomeou-o como "Personalidade do Ano", o primeiro motociclista a sê-lo.
Por essa altura, tinha 27 anos. Estava no auge, e decidiu que era a melhor altura para mudar de montada. Passou das duas para as quatro rodas, e em 1960, a sua adaptação foi fenomenal. Ainda corria na MV Agusta, mas decidiu ir para a Lotus, correndo na equipa oficial em algumas corridas seleccionadas. Começou no Mónaco, e na Grã-Bretanha, alcançou o seu primeiro pódio, um segundo lugar. Mas o melhor foi na Boavista, palco do GP de Portugal, onde conseguiu a pole-position, a primeira da Lotus na sua carreira. Na corrida, Surtees não chegou ao fim, mas fez a volta mais rápida.
Apesar de tudo, Surtees não quis ficar na Lotus, pois viu que as máquinas de Colin Chapman eram demasiado perigosas. Em Spa-Francochamps, por exemplo, viu dois pilotos morrerem, Chris Bristow e Alan Stacey, e outros dois ficaram feridos, Stirling Moss e John Taylor. O detalhe comum a todos eles era que guiavam Lotus. Assim, sendo eles carros demasiado perigosos para ele, foi correr com um chassis Cooper em 1961.
A sua primeira grande temporada foi em 1962, quando com o Lola da Bowmaker-Yeoman Credit, conseguiu dois segundos lugares e 19 pontos no total, acabando o campeonato no quarto lugar. Foi nessa altura em que chamou a atenção de Enzo Ferrari, que o contratou com vista à temporada de 1963, ao lado de Ludovico Scarfiotti e Lorenzo Bandini, entre outros. Os seus conhecimentos eram preciosos, e Surtees corria bem quer na Formula 1, quer na Endurance. A sua primeira vitória foi no Nurburgring Nordschleife, e repetiu o mesmo no ano seguinte, para além de outra vitória em Itália, o que o colocou numa excelente posição para alcançar o título mundial contra o BRM de Graham Hill.
A última corrida do ano foi na Cidade do México. Os Ferrari, pintados de azul e branco com as cores dos Estados Unidos, tinham Surtees e Bandini, e na corrida, o italiano andou atrás de Hill no sentido de o passar e conseguir abrir uma distância maior entre os dois. Ambos tocaram-se na volta 39, com Hill a atrasar-se de modo irremediável, e com muitos a dizerem que o italiano tinha feito isso de propósito.
Mas se Hill estava de fora, havia outros candidatos. Jim Clark era um deles, e parecia que ia a caminho da revalidação do seu título quando na última volta, o seu motor explodiu. Surtees precisava de um terceiro lugar para ser campeão, mas ainda nessa altura, Bandini deixou-o passar e ficou na segunda posição, atrás do vencedor, Dan Gurney, no seu Brabham. Naquele dia, Surtees tinha entrado na história: para além das duas rodas, também era campeão nas quatro. E pela Ferrari.
No ano seguinte, Surtees voltou a ganhar... mas na Endurance, ao vencer os 1000 km de Nurburgring. Contudo, a 25 de setembro, quando corria uma prova em Mosport ao volante de um Lola, sofreu um grave acidente que o deixou fora de combate por cerca de três meses. A reabilitação tinha sido longa, mas com persistência, Surtees conseguiu. Por essa altura, ele estava a ter uma discussão com Eugenio Dragoni, o diretor desportivo da Ferrari, que não gostava de Surtees e preferia Bandini. Quando Surtees voltou a correr no inicio de 1966 - e voltou com vitórias nos 1000 km de Monza e no GP da Bélgica, em Formula 1 - fez de tudo para o impedir de correr. E foi o que aconteceu nas 24 Horas de Le Mans. Ao exclui-lo da corrida, Surtees, furioso, pegou no carro e foi ter a Modena, para falar com Enzo Ferrari. No final da conversa, "Big John" despedia-se da Scuderia de vez.
Surtees foi para a Cooper, voltou a ganhar no México e acabou a temporada como vice-campeão. No ano seguinte, seguiu para a Honda, onde lhes pediu para que construisse um chassis com as suas especificações. Pediram à Lola para que fizesse isso - daí ele se ter chamado de "Hondola" - e resultou, pois Surtees venceu o GP de Itália ao sprint, batendo Jack Brabham por centésimos de segundo. Continuou até ao final de 1968, quando a marca japonesa decidiu abandonar a Formula 1.
Depois de uma passagem curta pela BRM, decidiu criar a sua própria equipa. A Team Surtees serviu para que os carros fossem feitos à sua maneira. John foi piloto e amealhou os seus últimos pontos, pendurando o capacete de vez em 1972, aos 38 anos.
Depois disto, tornou-se dono de equipa a tempo inteiro. Teve pilotos como Mike Hailwood, seu companheiro e rival no motociclismo e que também fizera a transição para os automóveis. Foi com ele que teve o melhor resultado como construtor, um segundo lugar mo GP de Itália de 1972, atrás do vencedor Emerson Fittipaldi. Outro piloto foi o brasileiro José Carlos Pace, que com ele, teve novo pódio, um terceiro lugar no GP da Áustria de 1973.
Contudo, Surtees tinha uma personalidade conflituosa, e alguns pilotos saíram da equipa em divergências. Foi o que aconteceu com Pace, a meio de 1974, onde depois seguiu para a Brabham. Surtees também teve outros pilotos como Alan Jones, Vittorio Brambilla e René Arnoux, mas com alguns deles, as coisas não acabaram bem. Jones, por exemplo, só ficou uma temporada com ele, em 1976, saindo logo depois.
No final de 1978, Surtees decidiu fechar as portas, por causa das dividas e dos custos cada vez mais incomportáveis de construir chassis e gerir uma equipa de Formula 1. Ficou a gerir um concessionário de motos perto de sua casa, em Edenbridge, no Kent inglês, e um concessionário da Honda, e participou em encontros de clássicos, quer em motos, quer em automóveis, em sitios como Goodwood.
No final da década passada, voltou mais ativamente ao automobilismo, a apoiar a carreira do seu filho Henry Surtees. John nunca se tinha casado até depois dos 50 anos, após a sua carreira de piloto e construtor. Teve três filhos e Henry era o mais novo, nascido em 1991, já Big John tinha 57 anos. Depois de andar na Formula Renault e uma pequena passagem pela Formula 3, Henry foi para a nova Formula 2, constuida pelo ex-piloto Jonathan Palmer. Ele, que usava o capacete do seu pai, acrescentando apenas um H, tinha demonstrado ser veloz, e em Brands Hatch, a 18 de julho, tinha conseguido um terceiro lugar. Henry comemorou efusivamente, com o pai a aplaudir, orgulhoso.
Ninguém poderia saber que aquela iria ser a última vez que o veria vivo. No dia seguinte, a segunda corrida da ronda de Brands Hatch de Formula 2, uma roda solta do carro de Jack Clarke atinge Surttes em cheio na cabeça, matando-o quase de imediato. Henry tinha apenas 18 anos, e para John, que sobrevivera a um período onde viu morrer alguns dos seus amigos no automobilismo, ver morrer o seu filho num acidente estanho - uma semana antes de Felipe Massa quase passar a mesma coisa na Hungria - foi como se o Destino tivesse sido bem cruel para ele.
Com isso, decidiu criar uma fundação com o nome de Henry, para ajudar os centos médicos em relação à rapidez na assistência hospitalar em situações de emergência. O dinheiro angariado fez com que fossem adquiridos equipamentos hospitalares e melhorado o treino do pessoal médico e ambulatório.
Agora que "Big John" sai da vida e passa à História, há uma estória do qual se pode recordar dele, e que está no livro de A.J. Baime, "Go Like Hell". Certo dia, nos anos 80, Surtees vai visitar Enzo Ferrari, já a beirar os 90 anos. Tinha passado mais de vinte anos sobre a discussão que os separou, e Ferrari recebe-o. A conversa é cordial, e no final, o Commendatore diz que é melhor recordar todos os bons momentos que passaram juntos. E de uma certa forma, é verdade. Ars lunga, vita brevis, Big John.
Por essa altura, tinha 27 anos. Estava no auge, e decidiu que era a melhor altura para mudar de montada. Passou das duas para as quatro rodas, e em 1960, a sua adaptação foi fenomenal. Ainda corria na MV Agusta, mas decidiu ir para a Lotus, correndo na equipa oficial em algumas corridas seleccionadas. Começou no Mónaco, e na Grã-Bretanha, alcançou o seu primeiro pódio, um segundo lugar. Mas o melhor foi na Boavista, palco do GP de Portugal, onde conseguiu a pole-position, a primeira da Lotus na sua carreira. Na corrida, Surtees não chegou ao fim, mas fez a volta mais rápida.
Apesar de tudo, Surtees não quis ficar na Lotus, pois viu que as máquinas de Colin Chapman eram demasiado perigosas. Em Spa-Francochamps, por exemplo, viu dois pilotos morrerem, Chris Bristow e Alan Stacey, e outros dois ficaram feridos, Stirling Moss e John Taylor. O detalhe comum a todos eles era que guiavam Lotus. Assim, sendo eles carros demasiado perigosos para ele, foi correr com um chassis Cooper em 1961.
A sua primeira grande temporada foi em 1962, quando com o Lola da Bowmaker-Yeoman Credit, conseguiu dois segundos lugares e 19 pontos no total, acabando o campeonato no quarto lugar. Foi nessa altura em que chamou a atenção de Enzo Ferrari, que o contratou com vista à temporada de 1963, ao lado de Ludovico Scarfiotti e Lorenzo Bandini, entre outros. Os seus conhecimentos eram preciosos, e Surtees corria bem quer na Formula 1, quer na Endurance. A sua primeira vitória foi no Nurburgring Nordschleife, e repetiu o mesmo no ano seguinte, para além de outra vitória em Itália, o que o colocou numa excelente posição para alcançar o título mundial contra o BRM de Graham Hill.
A última corrida do ano foi na Cidade do México. Os Ferrari, pintados de azul e branco com as cores dos Estados Unidos, tinham Surtees e Bandini, e na corrida, o italiano andou atrás de Hill no sentido de o passar e conseguir abrir uma distância maior entre os dois. Ambos tocaram-se na volta 39, com Hill a atrasar-se de modo irremediável, e com muitos a dizerem que o italiano tinha feito isso de propósito.
Mas se Hill estava de fora, havia outros candidatos. Jim Clark era um deles, e parecia que ia a caminho da revalidação do seu título quando na última volta, o seu motor explodiu. Surtees precisava de um terceiro lugar para ser campeão, mas ainda nessa altura, Bandini deixou-o passar e ficou na segunda posição, atrás do vencedor, Dan Gurney, no seu Brabham. Naquele dia, Surtees tinha entrado na história: para além das duas rodas, também era campeão nas quatro. E pela Ferrari.
No ano seguinte, Surtees voltou a ganhar... mas na Endurance, ao vencer os 1000 km de Nurburgring. Contudo, a 25 de setembro, quando corria uma prova em Mosport ao volante de um Lola, sofreu um grave acidente que o deixou fora de combate por cerca de três meses. A reabilitação tinha sido longa, mas com persistência, Surtees conseguiu. Por essa altura, ele estava a ter uma discussão com Eugenio Dragoni, o diretor desportivo da Ferrari, que não gostava de Surtees e preferia Bandini. Quando Surtees voltou a correr no inicio de 1966 - e voltou com vitórias nos 1000 km de Monza e no GP da Bélgica, em Formula 1 - fez de tudo para o impedir de correr. E foi o que aconteceu nas 24 Horas de Le Mans. Ao exclui-lo da corrida, Surtees, furioso, pegou no carro e foi ter a Modena, para falar com Enzo Ferrari. No final da conversa, "Big John" despedia-se da Scuderia de vez.
Surtees foi para a Cooper, voltou a ganhar no México e acabou a temporada como vice-campeão. No ano seguinte, seguiu para a Honda, onde lhes pediu para que construisse um chassis com as suas especificações. Pediram à Lola para que fizesse isso - daí ele se ter chamado de "Hondola" - e resultou, pois Surtees venceu o GP de Itália ao sprint, batendo Jack Brabham por centésimos de segundo. Continuou até ao final de 1968, quando a marca japonesa decidiu abandonar a Formula 1.
Depois de uma passagem curta pela BRM, decidiu criar a sua própria equipa. A Team Surtees serviu para que os carros fossem feitos à sua maneira. John foi piloto e amealhou os seus últimos pontos, pendurando o capacete de vez em 1972, aos 38 anos.
Depois disto, tornou-se dono de equipa a tempo inteiro. Teve pilotos como Mike Hailwood, seu companheiro e rival no motociclismo e que também fizera a transição para os automóveis. Foi com ele que teve o melhor resultado como construtor, um segundo lugar mo GP de Itália de 1972, atrás do vencedor Emerson Fittipaldi. Outro piloto foi o brasileiro José Carlos Pace, que com ele, teve novo pódio, um terceiro lugar no GP da Áustria de 1973.
Contudo, Surtees tinha uma personalidade conflituosa, e alguns pilotos saíram da equipa em divergências. Foi o que aconteceu com Pace, a meio de 1974, onde depois seguiu para a Brabham. Surtees também teve outros pilotos como Alan Jones, Vittorio Brambilla e René Arnoux, mas com alguns deles, as coisas não acabaram bem. Jones, por exemplo, só ficou uma temporada com ele, em 1976, saindo logo depois.
No final de 1978, Surtees decidiu fechar as portas, por causa das dividas e dos custos cada vez mais incomportáveis de construir chassis e gerir uma equipa de Formula 1. Ficou a gerir um concessionário de motos perto de sua casa, em Edenbridge, no Kent inglês, e um concessionário da Honda, e participou em encontros de clássicos, quer em motos, quer em automóveis, em sitios como Goodwood.
No final da década passada, voltou mais ativamente ao automobilismo, a apoiar a carreira do seu filho Henry Surtees. John nunca se tinha casado até depois dos 50 anos, após a sua carreira de piloto e construtor. Teve três filhos e Henry era o mais novo, nascido em 1991, já Big John tinha 57 anos. Depois de andar na Formula Renault e uma pequena passagem pela Formula 3, Henry foi para a nova Formula 2, constuida pelo ex-piloto Jonathan Palmer. Ele, que usava o capacete do seu pai, acrescentando apenas um H, tinha demonstrado ser veloz, e em Brands Hatch, a 18 de julho, tinha conseguido um terceiro lugar. Henry comemorou efusivamente, com o pai a aplaudir, orgulhoso.
Ninguém poderia saber que aquela iria ser a última vez que o veria vivo. No dia seguinte, a segunda corrida da ronda de Brands Hatch de Formula 2, uma roda solta do carro de Jack Clarke atinge Surttes em cheio na cabeça, matando-o quase de imediato. Henry tinha apenas 18 anos, e para John, que sobrevivera a um período onde viu morrer alguns dos seus amigos no automobilismo, ver morrer o seu filho num acidente estanho - uma semana antes de Felipe Massa quase passar a mesma coisa na Hungria - foi como se o Destino tivesse sido bem cruel para ele.
Com isso, decidiu criar uma fundação com o nome de Henry, para ajudar os centos médicos em relação à rapidez na assistência hospitalar em situações de emergência. O dinheiro angariado fez com que fossem adquiridos equipamentos hospitalares e melhorado o treino do pessoal médico e ambulatório.
Agora que "Big John" sai da vida e passa à História, há uma estória do qual se pode recordar dele, e que está no livro de A.J. Baime, "Go Like Hell". Certo dia, nos anos 80, Surtees vai visitar Enzo Ferrari, já a beirar os 90 anos. Tinha passado mais de vinte anos sobre a discussão que os separou, e Ferrari recebe-o. A conversa é cordial, e no final, o Commendatore diz que é melhor recordar todos os bons momentos que passaram juntos. E de uma certa forma, é verdade. Ars lunga, vita brevis, Big John.
Grande texto, paulo! As vezes acabamos esquecendo dos grandes personagens do esporte e das grandes façanhas que eles obtiveram. O fato de ter sobrevivido - e sido vencedor tanto nas 2 como nas 4 rodas faz de Surtees um nome a ser lembrado eternamente.
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