Este sábado dei por mim a ouvir o rumor de que poderá aparecer uma revista de automóveis por estas bandas. O detalhe disto tudo é que a revista seria feita no formato de papel. Essa é a parte que me surpreende: no tempo da Internet, alguém querer montar uma revista de automóveis nesse formato. Ter "tomates" para fazer tal coisa significa que... das duas, uma: ou tem bolsos bem fundos, ou não faz qualquer ideia do que anda a fazer. Uma aventura romântica, talvez.
Romantismos à parte, dei por mim a falar com o Ricardo Santos, o desenhador, que meteu esse rumor na sua página de Facebook, também porque ele me falou do exemplo da Turbo (casa onde trabalhou e fez grandes capas), que existe há 36 anos e resiste aos tempos, e ele falou do exemplar mais antigo que tem lá por casa, de 1988. Ou seja, trinta anos antes. E falou da quantidade de publicidades que lá existia, desde auto-rádios a fabricantes de peças para automóveis. E como isso tudo mudou, porque agora, os únicos que sobrevivem são os próprios fabricantes de automóveis, porque tudo o resto desapareceu.
Mas também há outras coisas a ter em conta. Porque é uma nova geração, e porque nesse tempo não havia a Internet que revolucionou o mundo como o conhecíamos, por exemplo.
Começo com um exemplo pessoal: em 1988, o meu pai trabalhava numa empresa de transitários. Tínhamos acabado de entrar na União Europeia e os muitos milhões vindos de Bruxelas começavam a causar impacto. Quem conheceu o meio sabe que essa profissão dependia de uma coisa: haver uma fronteira física, e onde as mercadorias pudessem fluir, pagando as taxas alfandegárias necessárias para permitir a exportação e importação de produtos necessários. Era um profissão bem paga, acreditem.
Mas havia uma nuvem no horizonte: dali a alguns anos, as fronteiras iriam abrir para mercadorias e pessoas. Não iríamos mais parar numa fronteira, circularíamos livremente dentro da União Europeia. O meu pai, sabendo o que isso significava, decidiu ir embora em 1990, indo trabalhar para o departamento comercial de uma fábrica de cerâmica, ficando nessa área até se reformar.
O que pretendo dizer é que numa geração, as coisas mudam. O que funcionava numa altura, deiuxou de funcionar noutra. O que surgiu no horizonte revolucionou as coisas e tornou obsoletas determinadas profissões e atividades.
E agora, vamos aos automóveis. Estão a ver todas aquelas publicidades de auto-rádios e demais peças para automóveis? Já não existem mais. O auto-rádio, peça importante e sujeito a roubo nesses tempos, tornou-se numa peça difícil de ser furtada porque as marcas de automóveis incluíram o auto-rádio nos seus sistemas de navegação. Daí não ouvirmos mais marcas como Kenwood, Alpine ou Blaupunkt, por exemplo, que agora não fazem mais auto-rádios.
E as demais peças de automóveis - faróis, velas, óleos - correm o risco de serem obsoletos daqui a uma década, com a ascensão dos automóveis elétricos, que deitarão fora o motor a combustão, mecânico sujeito a quebras frequentes que passariam por oficinas mecânicas. Sei perfeitamente que, quando se trocarem os carros a combustão interna pelos elétricos, grande parte das oficinas mecânicas ou encerrarão, ou mudarão de atividade, porque com menos peças mecânicas para reparar, pouco haverá para trocar, a não ser pneus. E se calhar, que sobrarem poderão dedicar-se à restauração de clássicos, onde pelo menos por mais uma geração, eles serão um nicho muito interessante.
Dito isto, desejo-lhes muito boa sorte, quem quer que apareça. Se fizerem um bom trabalho de qualidade e ligar o velho ao novo - ou seja, fazer um bom site e ter uma boa revista, seja ela mensal ou semanal - pode ser que todos saiam a ganhar: leitores, jornalistas, empresas e publicitários. Mas espero que tenham em conta que estamos no século XXI, e que muitas das coisas que existiam no século XX não podem ser mais usadas. E o futuro indica cada fez mais isso.
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