Tudo começa no final de 1981, quando Ron Dennis compra os 50 por cento da McLaren que pertencia a Teddy Mayer e fica com a propriedade da equipa. O chassis MP4 - que mais tarde se chamará MP4/1 - desenhado por John Barnard e com a tecnologia de fibra de carbono - é um sucesso e Dennis marca outro grande golo de placa quando convence Niki Lauda a largar o negócio da aviação e voltar a correr, a troco de um milhão de libras por temporada. Mas para isso tudo, teve de arranjar dinheiro em algum lado, e diz a Mansour Ojjeh que o futuro não é na Williams, mas sim na sua equipa.
Ojjeh nasceu em berço de ouro, em Paris, filho de Akram Ojjeh, um sírio, e da sua mulher francesa. Com educação europeia e americana, o seu pai está bem relacionado com a família real saudita e é o intermediários de diversos negócios entre eles e o governo francês, que vai desde as armas até à engenharia petrolifera. Quando ele volta a trabalhar com o pai, em 1974, ajuda a fundar no Luxemburgo a TAG, Techniques D'Avant Garde, que aposta na tecnologia da aviação, para além de negócios imobiliários e finanças. O automobilismo é a paixão de Mansour, que não sendo piloto, faz amizades nesse mundo pequeno, e sempre que quer ajudar um amigo, o faz. Especialmente Ron Dennis, que consegue persuadir na sua visão de uma equipa vencedora. Ele tinha a visão, Ojjeh o dinheiro.
Em 1983, a McLaren está atrasada na introdução do motor Turbo. Por esta altura, Brabham, Ferrari e até a Toleman já tem motores desses nos seus chassis, mas eles, ao lado da Williams, estão atrasados nesse quesito. E pior: não tem uma fábrica por trás. Contudo, Ojjeh sabe que a Porsche até estaria interessada nessa parte, apesar da notória aversão de Ferdinand Piech à Formula 1, ele que vive na euforia dos 956 de Grupo C, dominantes em Le Mans e no Mundial de Endurance. A condição para isso? Eles pagam, nós desenvolvemos.
O trabalho começa em finais de 1981, e é desenvolvido em segredo, através de um... mero Porsche 911, escondido à vista de todos, e o motor V6 Turbo, equipado com dois turbocompressores KKK (é o nome da firma alemã que o desenvolve, não fiquem com ideias...) fica pronto para ser testado no verão de 1983, num dos MP4/1 em Eisenach, a pista privativa da marca, com todos da McLaren presentes, desde os pilotos, Lauda e John Watson, passando por Dennis e Ojjeh, que já tinha passado o seu patrocínio da Williams para a equipa de Woking. Os testes são promissores, com ele a dar um máximo de 715 cavalos às 11.500 rotações, com os turbo a 2.5 bar, e decidem estrear o carro o mais depressa possível, em Zandvoort, no GP dos Países Baixos, nas mãos de Lauda.
Ojjeh sabe que o projeto está em boas mãos e o resto da combinação será um sucesso, mas quer algo em troca: uma participação minoritária na equipa. Dennis aceita e cede 14 por cento em troca de ele financiar a cem por cento o motor Turbo que eles tanto desejam para não ficar para trás.
Compensou: até ao GP da Austrália de 1987, a McLaren conseguirá 25 vitórias, 54 pódios, sete pole-positions e 18 voltas mais rápidas, para além dos títulos de pilotos de 1984 a 1986, dois deles com Alain Prost, depois do primeiro, por parte de Niki Lauda, conquistado no Estoril por meio ponto, a diferença mais pequena de sempre. Um investimento que compensou bastante, mas os pilotos que tinha e o chassis desenhado também ajudou imenso. Quando se retira de vez, no final de 1987, o motor já dava mais de mil cavalos na qualificação e 960 em corrida, às 12.600 rpm.
Ojjeh, morto ontem aos 68 anos, sabia mexer-se no mundo da alta finança e das tecnologias. Era um sujeito bem humorado e despretensioso, que nunca deixou de dizer que apesar de ter todo o dinheiro do mundo, e ser astuto nos seus negócios, sabia onde estava o seu coração e a sua paixão. Braço direito de Dennis, parceiro silencioso em muitos dos investimentos e aventuras, muitas delas com muito sucesso, acompanhou-o quando ela decidiu construir carros de estrada, a McLaren Automotive, como a Ferrari, cimentando o legado iniciado pelo neozelandês Bruce McLaren. E mais do que investir o dinheiro na sua paixão, também ajudou a consolidar a sua estrutura acionaria, com a entrada do fundo soberano do Bahrein no capital da marca.
Não admira que Zak Brown o tenha chamado de "titã" no seu elogio fúnebre. É que muito daquilo que a McLaren é hoje deve-se a ele. E tudo começou com as 800 mil libras que ele gastou para desenvolver um motor Turbo, há quase 40 anos.
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