Estamos em 1935. Os “Flechas de Prata” da Mercedes e Auto Union dominavam os circuitos europeus, graças ao apoio do estado nazi, pois Adolf Hitler era um grande entusiasta. Pilotos como Hans Stuck, Rudi Caracciola, Bernd Rosemeyer e Manfred Von Brauchitsch, dominavam as pistas da Europa. Contra eles, os Alfa Romeo P3, pilotados por homens como Achille Varzi e Tazio Nuvolari, e comandados na box por Enzo Ferrari. Eles sabem que com mesmo com todo aquele talento, era incapazes de bater aquela maquinaria alemã, que fazia jus à frase “Vosprung Durch Technik” – A Perfeição através da Técnica. Porquê? Os Alfa P3, apesar de serem fiáveis, tinham menos 125cv e 30cv, respectivamente, que os carros rivais da Mercedes e Auto Union.
Comparados aos carros alemães, os Alfas estavam ultrapassados, pois eram projectos com 3 anos, no entanto eram extremamente fiáveis. Os pilotos eram Tazio Nuvolari, Louis Chiron, e René Dreyfus. Os restantes concorrentes não podiam aspirar a nada, eram 3 Maserati da Scuderia Subalpina (Zehender, Phillipe Etancelin e Siena), Balestrero com o seu Alfa Romeo privado, Piero Taruffi com um Bugatti de 3.3L, Ruesch, Hartmann e Soffieti em Maseratis privados e Max von Delius e Rex Mays em E.R.A 2 Litros.
É aqui que ele começa verdadeiramente a conduzir: ultrapassa Rosemeyer na sexta volta, von Brauchitsch na sétima, que recupera na oitava, na nona volta apanha von Brauchitsch outra vez e ultrapassa-o bem como a Fagioli, na décima volta ultrapassa Caracciola e assume a liderança. A multidão não podia acreditar no que via. Como era possível? Na 11.ª volta, a meio da corrida a tensão atinge o auge quando os quatro lideres Nuvolari, Caracciola, Rosemeyer e von Brauchitsch entram ao mesmo tempo para as boxes, a fim de reabastecer e trocar pneus.
Agora a corrida estava nas mãos dos mecânicos, e os da Mercedes eram na altura tidos como os melhores. Enquanto que von Brauchitsch partiu em 47 segundos, Caracciola em 1 minuto e 7 segundos depois, e Rosemeyer em 1 minuto e 15 segundos. Mas o Alfa de Nuvolari permanecia parado! Porquê? A bomba de gasolina avariou e carro teve de ser reabastecido à mão directamente dos bidões, enquanto Nuvolari gesticulava furioso. Vai ser a partir daqui que Enzo Ferrari tirará daqui uma lição: a partir daí a assistência às suas máquinas teria de ser sempre a melhor.
Entretanto, Nuvolari sai para a pista tendo perdido a eternidade de... 2 minutos e 14 segundos! Estava agora muito atrasado, na sexta posição, mas a conduzir como só o “Mantuano Voador” sabia. Entretanto as condições tinham mudado e Hans Stuck, embaraçado com o piso molhado, decide trocar de pneus. O líder temporário da corrida, Fagioli, decide fazer um reabastecimento e mudança de pneus à entrada da 12.ª volta e perde 51 segundos e quatro lugares na classificação. É então que Von Brauchitsch fica com liderança, enquanto Fagioli e Rosemeyer perdem terreno com problemas na suspensão e na alimentação, respectivamente.
Entretanto Nuvolari voava para recuperar o tempo perdido. Na 13.ª volta, o italiano ultrapassa Stuck, Fagioli e Caracciola como se de pilotos inexperientes se tratassem, pois em piso molhado ninguém pilotava melhor que ele. Entretanto, Rosemeyer tem de ir às boxes resolver o problema da admissão e Tazio fica em segundo, a apenas 1 min 9 seg. de von Brauchitsch.
Começa aqui uma perseguição memorável e tenaz. Ninguém, para além talvez do seu compatriota Varzi, descrevia curvas como ele, no entanto eram diferentes: enquanto Varzi primava pela perfeição técnica, Nuvolari tinha uma habilidade inata, fundia-se com a sua máquina, carro e piloto eram um só, parecia que ele conseguia sempre conduzir naquela ténue linha que define o limite. Em piso molhado parecia estar sempre para além dele. Enquanto von Brauchitsch desgastava os pneus tentando manter a liderança, Nuvolari ganhava-lhe segundos atrás de segundos (nas boxes mostravam aos pilotos os tempos a aproximarem-se) Nuvolari já só estava a 43 seg. Von Brauchitsch responde com uma volta feita à média de 130 Km/h, notável para a altura em piso molhado, nessa volta tinha ultrapassado por vezes os 280 Km/h, mas Nuvolari, mesmo não dispondo de tanta velocidade de ponta, faz melhor e ganha-lhe 11 seg, já só está a 32 seg.
À entrada para a 21.ª e penúltima volta, von Brauchitsch, consegue responder, ganhando 3 segundos. Tem agora 35 de vantagem, mas o germânico irá pagar a sua ousadia de tentar responder à pilotagem de Nuvolari. Nunca tivera a gentileza de Varzi ou a habilidade inata de Nuvolari a pilotar, nem o discernimento de Caracciola para saber isso. Travava e desgastava os pneus violentamente.
E chegamos à última volta. Em Flugplatz, a apenas 8 Km da meta, Nuvolari está a 30 seg. Quando ambos os carros passam por Adenauerforst, a diferença é 27 seg, e na zona do Karussel, menos de 200m separam o carro vermelho do prateado. Nos altifalantes os comentadores gritam entusiasmados. Apesar de Nuvolari se aproximar impiedosamente, a vitória do alemão ainda parece possível...
Inesperada também será a classificação final: Stuck vai ser segundo, Caracciola completa o pódio, Rosemeyer será quarto e von Brauchitsch só acabará em quinto, depois do seu pneu ter furado completamente. O autoritário aristocrata e filho querido do Reich (era sobrinho do General Von Brauchitsch) irá esconder as suas lágrimas de desapontamento nas boxes, enquanto Nuvolari recebia os louros da vitória. Quanto ao esquecimento do hino italiano, referido no inicio, Nuvolari era um homem prevenido: levava sempre consigo um disco de 78 rotações com essa musica gravada…
O circuito alemão de Nurburgring marcará uma das derradeiras grandes vitórias do Alfa Romeo P3 e mais uma, senão a maior, das vitórias de Tazio Nuvolari. Tazio pilotou sempre no limite e por vezes para além dele. Naquela que será posteriormente considerada por muito como "a melhor corrida de sempre".
Excelente texto! A atuação de Nuvolari foi, certamente, uma das maiores de todos os tempos. Se tivesse acontecido na Fórmula 1, estava a disputar os primeiros lugares na minha lista das maiores performances!
ResponderEliminarGrande abraço!
Wooooowww bellisimo texto, parabens!!! tinha tempo sem visitar o blog :)
ResponderEliminarDeus, Fangio, Nuvolari e Senna. Amen.