segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Francois Cevért - Anatomia de um Desastre

Há exactamente 35 anos atrás, a Formula 1 perdia um dos mais atraentes e talentosos pilotos existentes no seu tempo, provavelmente a melhor chance que a França tinha na altura de ter um piloto campeão do Mundo. Francois Cevért, na altura com 29 anos, era o segundo piloto de Tyrrell, ao lado de Jackie Stewart, mas todos sabiam que com o tempo, Stewart iria se retirar, e a Tyrrell poderia trabalhar à volta dele, pois era o aluno que aprendera todos os segredos com o Mestre escocês, tri-campeão do Mundo.


Já tinha vencido uma corrida, em 1971, precisamente em Watkins Glen, e em 1973, ele se classificava na quarta posição do campeonato, com sete pódios e uma volta mais rápida. Era veloz, mas a sua lealdade e amizade com o piloto escocês, impedia-o de atacar a liderança, embora Stewart tenha dito, depois a sua vitória no GP da Alemanha, que “se quisesse, ele poderia ter-me passado”. Nessa temporada, tendo consciência da rapidez do seu companheiro, ele decidira que era hora de se retirar da competição, com ou sem o tri-campeonato, mas o único que sabia disso era Ken Tyrrell, e ambos mantiveram o segredo.


Em Watkins Glen, a prova final do campeonato do Mundo de 1973, tudo estava preparado para a consagração de Jackie Stewart. A Tyrrell tinha três carros, para o escocês, Francois Cevert e o neo-zelandês Chris Amon. Nos treinos de sexta-feira, Cevért lutou pela “pole-position” com o sueco Ronnie Peterson, na sua Lotus. Nesse dia, ele e Stewart discutiam qual era a melhor marcha para lidar a zona dos “Esses”, uma rápida combinação direita - esquerda, no qual o escocês o abordava com a quinta marcha, enquanto que o francês usava a quarta, para ganhar potência para ganhar segundos preciosos. Stewart tinha uma boa razão pela qual queria fazer aquela zona com uma rotação mais baixa: ali, o asfalto era mais ondulado e propenso a erros. Mas tarde, isso viria a pesar nas causas do seu acidente fatal.


Nos treinos de Sábado de manhã, Peterson e Cevért lutavam entre si para ver quem ficaria com a pole-position. O sueco tinha vantagem durante o ano, pois conseguira oito pole-positions, enquanto que o francês não tinha conseguido nenhuma. Então, poucos minutos antes do meio-dia, Cevért fez a sua última tentativa. Tudo corria bem até chegar à zona dos “Esses”, onde o seu estilo de condução fez usar a quarta marcha, quando o carro fez a curva à esquerda. De repente, o carro perde o controlo, bate o guarda-rail à direita, faz ricochete, vira para a esquerda, e bate no guarda-rail oposto, a um ângulo de 90 graus. O impacto faz voltar o carro de pernas para o ar, arrastando-se por mais de cem metros. Teve morte imediata.


O primeiro a chegar foi José Carlos Pace, que por coincidência, fazia 29 anos nesse dia. Dizem que quando viu o estrago feito, abandonou o local de lágrimas nos olhos. Logo a seguir, veio o sul-africano Jody Scheckter, no McLaren numero zero, que teve a mesma reacção. Depois apareceu Jackie Stewart, que disse isto, anos depois: “Os socorristas nem se deram ao trabalho de tirar os seus kits, porque via-se logo que estava morto”. Cevert tinha o corpo lacerado, e a causa da morte teria sido degolação, no momento do impacto com os rails de protecção.


De facto, aquelas lâminas estavam mal colocadas, logo, seriam “armas” fatais para um carro descontrolado. Os pilotos tinham reclamado disso no dia anterior, mas pouco ou nada tinha sido feito. E depois de Cevért, parecia que essas reclamações tinham caído em saco roto: no ano seguinte, um acidente semelhante, envolvendo o Surtees do austríaco Helmut Koenigg, teria quase o mesmo tipo de destino: morte por decapitação.


Quando os treinos recomeçaram, Stewart voltou à pista, numa tentativa de saber por si mesmo a razão do acidente. Logo descobriu que o seu estilo de condução, combinado com o irregular asfalto daquela zona e a falta de escapatórias, teria sido o factor decisivo do acidente. Mais tarde, o austríaco Niki Lauda, escreveu num dos seus livros, que aquela combinação, naquela zona, tornava-a inacreditavelmente perigosa.


Também se falou que Cevért poderia ter morrido porque instantes antes, teria vomitado no capacete, bloqueando a visão. Mas o médico-legista disse depois que isso poderia ter acontecido depois do impacto, e não antes dele.


Pouco tempo depois, Jackie Stewart anunciaria à imprensa em geral que se iria retirar da competição, com efeito imediato. Disse também que era uma decisão pensada há muito, e que só Ken Tyrrell é que sabia. Mas no dia anterior, já tinha contado isso a Cevért e a Peterson, num jantar que tinham tido juntos num restaurante da zona. O resto do mundo só iria saber no Domingo, quando o escocês completasse o seu centésimo Grande Prémio. Nada disso aconteceu. A Tyrrell retirou os seus carros da corrida, em sinal de luto.


Se tudo tivesse corrido bem, o francês teria o comando da Tyrrell para 1974. Eventualmente lutaria pelo título com Fittipaldi, no seu McLaren – Cosworth, e os Ferrari de Niki Lauda e Clay Regazzoni, e provavelmente, poderia ter sido o primeiro francês campeão do Mundo, já que nos anos seguintes, a França iria assumir um papel relevante, com a entrada de equipas como a Ligier e a Renault. No final, o Destino teve outros planos… Francois Cevért está agora enterrado no Cemitério Muncipal de Vaudelnay, no Maine-en-Loire. A sua campa está coberta por um mármore negro, encostado à parede do cemitério, onde está pendurado um baixo-relevo com a sua face.

5 comentários:

  1. Esse deixou muitas saudades...

    Incríevel como o Stewart o estimava...

    Eu acredito que o vomito tenha sido a causa sim...

    ResponderEliminar
  2. Dizer que foi uma grande perda é comum nesses casos. Agradecer pelas lembranças e recordações presentes nesse blog também deve ser.

    Obrigado por mais esse show de postagem, mr.Speeder!

    ResponderEliminar
  3. Lembro perfeitamente quando foi noticiada a morte desse incrível piloto... e como era bonito! Eu tinha 12 anos e não perdíamos uma corrida por causa de torcer para o Emerson e Pace. Foi , e ainda o é ,muito triste. O pior é que, mais uma vez, foi um caso de desconsideração com os pedidos dos pilotos por melhoria na segurança da pista... tragédia anunciada e, possivelmente evitada... como tantas outras!!!

    ResponderEliminar
  4. Antigamente era natural a morte na f1. Sem segurança nenhuma, feno em volta da pista ao invés de pneus, gente sentada a margem da pista, bandeira das sendo dadas com um sujeito quase no meio das pistas, fiscais despreparados como no caso do comissário sul africano atropelado pelo carro de tom pryce morrendo e matando o piloto com um extintor na cabeca, infelizmente era entrar no carro e correr pra morte

    ResponderEliminar

Comentem à vontade, mas gostava que se identificassem, porque apago os anónimos, por bem intencionados que estejam...