Duas semanas depois da corrida de Mosport, a Formula 1 tinha rumado para Watkins Glen, palco do Grande Prémio dos Estados Unidos, normalmente a corrida mais rica do ano em termos de prémios. Só para terem uma ideia, os prémios totalizavam 209 mil dólares em dinheiro, do qual o vencedor normalmente levava para casa 50 mil dólares em dinheiro, o suficiente para valer a pena as dezenas de corridas que normalmente fazia a cada temporada.
E foi isso que muitos dos pilotos inscritos andaram a fazer durante essas duas semanas entre Mosport e Watkins Glen. Alguns, como Jean-Pierre Beltoise e Pedro Rodriguez, disputaram os 1000 km de Paris, em Sport-Protótipos, (ganho pelo piloto francês da Matra), enquanto que outros, como Jo Siffert, George Eaton, Dennis Hulme e Bruce McLaren, foram correr uma prova de Can-Am em Michigan, vencida por Bruce, numa temporada que ficou para a história como "The Bruce and Denny Show", pois ganharam todas as provas dessa temporada. Johnny Servoz-Gavin foi a excepção, pois foi a Itália correr numa prova de Formula 2, o GP de Roma, no qual saiu vencedor.
Em Watkins Glen, não havia grandes novidades na lista de inscritos. Somente Mário Andretti, no Lotus 63 de quatro rodas motrizes, um dos dois carros inscritos para a ocasião, pois o outro era o terceiro Matra MS84 de Johnny Servoz-Gavin. Na BRM, para além dos dois carros oficiais, para Jackie Oliver e John Surtees, o terceiro carro era agora guiado por outro canadiano, George Eaton, que substituia Bill Brack. Eaton, de 24 anos, apesar de ser o herdeiro da cadeia de lojas Eaton, tinha algum talento para correr em automóveis. Watkins Glen iria ser a sua estreia na Formula 1.
De resto, era tudo igual a Mosport: a Lotus tinha Graham Hill e Jochen Rindt, a Matra tinha Jackie Stewart e Jean-Pierre Beltoise, a Brabham alinhava com "Black Jack" e Jacky Ickx, a McLaren com o mesmo "The Bruce and Denny Show" que arrasava a Can-Am daquele ano, e a Ferrari tinha a solitária inscrição de Pedro Rodriguez, ao serviço da NART (North American Racing Team). Nos privados, estavam os Brabham de Piers Courage, pela Frank Williams Racing Team, e de Silvio Moser, pela sua própria equipa; os Lotus de Jo Siffert, pela Rob Walker Racing Team e o de Pete Loveley. Ao todo estavam 17 inscritos.
Nos treinos, depois de um primeiro dia à chuva, que demonstrou a inutilidade dos carros com quatro rodas motrizes, mesmo no ambiente em que em teoria lhes seria mais favorável, o segundo dia foi a seco, e o melhor deles todos acabou por ser Jochen Rindt, no Lotus. A seu lado na primeira fila estava Denniy Hulme, no McLaren. Na segunda fila estava Jackie Stewart, no Matra, e Graham Hill, no segundo Lotus. Jo Siffert vinha a seguir, no seu Lotus privado, tendo a seu lado Bruce McLaren. Jean-Pierre Beltoise, no segundo Matra, e Jacky Ickx, no Brabham, ficavam com a quarta fila, e para fechar o "top ten" estavam o BRM de George Eaton e Jack Brabham, no seu carro.
No dia 5 de Outubro de 1969, cerca de 100 mil pesoas acorreram ao circuito de Watkins Glen para assistir, sob céu limpo, ao Grande Prémio dos Estados Unidos. Quando as máquinas arrancaram para as 108 voltas ao circuito, Rindt manteve a liderança, com Stewart a subir ao segundo posto, aproveitando o mau arranque de Dennis Hulme, que teve problemas com a caixa de velocidades. Era um péssimo dia para a McLaren: o patrão Bruce tinha tido problemas com o motor durante a volta de aquecimento, e nem chegou a partir.
Atrás dos dois primeiros vinha Hill, Siffert, Beltoise e Courage, com Hulme a cair para o nono posto. Andretti não durava mais do que três voltas com o Lotus 63, e retirava-se com um problema de suspensão. Ao mesmo tempo, Siffert encostava-se à berma, vitima de problemas de motor. Quem beneficiava disto era Piers Courage, que passava Beltoise, também com problemas na caixa de velocidades, e perseguia Hill, para o ultrapassar na volta nove e ficar na terceira posição.
Entretanto, na frente, Stewart espreita por uma oportunidade de passar Rindt, e esta aparece na volta 12. Com o escocês na frente, o austriaco não desiste de recuperar a liderança, em mais uma edição dos duelos que tinham protagonizado ao longo de toda a temporada, sempre com resultado favorável ao piloto da Matra. Mas nessa altura, o motor Cosworth não estava a funcionar a cem por cento, e Stewart estava a segurar Rindt da melhor maneira possivel. Lutavam forte e feio na pista, mas sempre de forma leal, mas nove voltas depois, Rindt leva a melhor e regressa à liderança. Stewart fica gradualmente para trás, com um fino rasto de fumo, que na volta 36 se transforma numa núvem, sinal de que o motor tinha explodido, devido à falta de pressão de óleo. Um acontecimento raro em 1969: Jackie Stewart não ia acabar uma corrida!
Assim, Rindt não teria grande oposição na liderança, com o segundo classificado, Piers Courage, a alguma distância. Quanto a este, tinha Brabham e Ickx atrás dele e a sua tarefa era segurá-los o mais possivel e esperar que a sorte lhe batesse à porta. De facto, aconteceu, com Ickx a abandonar com problemas de motor, na volta 77, enquanto que Brabham teve de fazer um inesperado reabastecimento para ver se conseguia terminar a corrida, caindo para o quarto lugar final. Quem beneficiou disto tudo foi John Surtees, que levou o seu BRM ao terceiro lugar, o unico pódio da marca nessa temporada.
Mas antes do final da corrida, ainda haveria drama: na volta 88 Graham Hill rolava na sexta posição, quando passa o carro numa poça de óleo, fazendo um pião e deixando ir o motor abaixo. Desapertou o cinto, saiu do carro e começou a empurrá-lo, até fazê-lo pegar. Voltou para dentro do carro, sabendo que não podia apertar sozinho os cintos de segurança.
Contudo, o pião tinha causado um furo lento num dos seus pneus, e avisara as boxes para que estivessem prontos para mudá-lo. Mas Hill não conseguiu chegar a tempo, pois o pneu explodiu, despistando o seu Lotus para uma vala, e Hill foi projectado para fora do carro. Nisso, o veterano piloto de 40 anos sofrera fracturas graves em ambas as pernas, e fora transportado de urgência para o hospital. Quando lá chegou, e antes de ser operado, para reduzir as fracturas, ainda teve força para dizer: "Diga à minha mulher que não vou poder dançar por umas duas semanas".
No final da corrida, apenas seis carros tinham cruzado a meta, e Rindt conseguia finalmente aquilo que almejava: a sua primeira vitória na Formula 1. Todo o seu talento, que tinha sido mascarado por maus carros, azares alheios ou porque o seu adversário era simplesmente melhor do que ele naquele dia, finalmente isso tudo tinha desaparecido para que vencesse o seu primeiro Grande Prémio da sua carreira, a primeira das 41 vitórias conseguidas por um piloto austriaco até aos dias de hoje. Courage e Surtees acompanhavam-no ao pódio, enquanto que Jack Brabham, o Ferrari de Pedro Rodriguez e o Brabham do suiço Silvio Moser, fechavam os lugares pontuáveis.
Uma última nota: o dinheiro do prémio que Rindt ganhava nesta corrida iria servir para comprar uma casa no Lago Leman, na Suiça. Esta era mesmo ao lado da do seu rival, mas também grande amigo pessoal, Jackie Stewart.
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