Ainda recordo do dia. Era um Domingo e o tempo estava nublado. Para disfarçar a ansiedade dos meus treze anos, fui jogar no meu quarto com o meu ZX Spectrum (sim, sou dessa geração), enquanto se esperava pelas 15 horas, creio eu. Nessa altura, o mundo inteiro tinha se instalado às portas da prisão Victor Verster, nos arredores da Cidade do Cabo para ver o primeiro vislumbre de um homem muito falado, mas cuja última fotografia tinha sido tirada quase 26 anos antes. E todos queriam ver como era agora Nelson Mandela.
Quando saiu, veio a pé, para que todos pudessem ver como ele tinha envelhecido ao longo desses 27 anos. Mas o tempo não tinha apagado a sua determinação, e saia nos seus próprios termos: o regime que tanto combateu estava prestes a desmoronar-se. O ANC tinha sido legalizado, um novo presidente tinha decidido terminar com as leis do "apartheid", em que a maioria negra era discriminada pela minoria branca (cerca de 15 por cento da população sul-africana) e adivinhavam-se eleições livres para breve. Mas também o perigo de uma guerra civil no país mais próspero de Africa, que sempre foi marcado pela violência.
Naquela altura, pouco depois da queda do Muro de Berlim, parecia que tudo era possivel. Com a substituição do "velho crocodilo" P.W. Botha por Frederik de Klerk, dois velhos "afrikanders", este último precebeu os verdadeiros ventos de mudança e a tal "Nova Ordem Mundial" que parecia sair da Guerra Fria. Em poucas semanas, De Klerk cedeu em tudo no sentido de acabar com a situação de "estado-pária" ao qual aquele país estava mergulhado. Mas havia sectores da minoria branca que não queriam desistir sem luta. E nos quarto anos seguintes, a espectro da guerra civil esteve sempre presente, qual "Espada de Dâmocles".
Hoje, conhecemos o final da história: Mandela foi eleito presidente em Abril de 1994, e cumpriu um mandato como presidente, retirando-se aos 81 anos. Tornou-se no homem vivo mais respeitado do mundo e um exemplo a seguir por qualquer movimento de não-violência, como acontece agora nas ruas de Teerão, por exemplo. A Africa do Sul é agora pintado como "o país do arco-iris", mas as desigualdades não se apagam em 20 anos. O país ainda sofre com a violência, com a SIDA, com a pobreza e carências de variada espécie. Mas é uma democracia sólida e um exemplo para o resto de Africa.
Agora, Mandela tem 91 anos e de saúde fragil. O Mundial de Futebol, em Junho, pode ser provavelmente a última grande festa que Mandela deve assistir enquanto for vivo. Mas assinalar estes eventos enquanto ainda é vivo é não só um sinal de reconhecimento da sua luta contra um regime segregacionista, mas também que no final os fortes e os justos vencerão.
Pois é. E la vai tempo.
ResponderEliminarAssisti Invictus e achei o filme muito meia boca. o Que você achou?
Ainda não vi o filme. Mas li o livro e melhor: vi o tal jogo que o filme retrata.
ResponderEliminarÉ simbólico, sem dúvida, aquele jogo de reconciliação de um presidente negro num recinto cheio de brancos, a aplaudir um jogo que ainda é essencialmente seguido por brancos.
Embora esse jogo da final do Mundial de Rugby tenha marcado algo de importante no pós-apartheid sul-africano: que o processo continua, uma final de cada vez.
Acho que Nelson Mandela compreendeu melhor que ninguem que a Africa do Sul não podia seguir o caminho de outros Estados Africanos e ai ele foi enorme porque soube evitar que o país caisse na guerra civil.
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