quarta-feira, 28 de julho de 2010

Grand Prix (numero 40, Race of Champions)

22 de Março de 1970, Brands Hatch, sul da Grã-Bretanha

O tempo estava nublado, mas não se previa chuva naquele dia em Brands Hatch, palco da Race of Champions, onde dezasseis pilotos estavam presentes para a primeira corrida europeia, embora fosse de extra-campeonato, com as máquinas novas. Jordan, Matra, Apollo e BRM faziam as suas aparições, dado que a Ferrari primava-se pela ausência. Mas não era isso que se falava nos bastidores do paddock britânico. Era outra noticia interessante...


- O que acha da ideia?
- De repente termos mais construtores na Formula 1?... não entendo qual é a ideia. Já temos a Ferrari e a Matra, nós fazemos carros de Sport e a Yomura foi-se embora há ano e meio. Se for uma mais valia, porque não? respondeu Bruce Jordan à pergunta feita por um jornalista local.


Na semana que passou, surgiram rumores vindos de Itália de que poderia aparecer um novo construtor na Formula 1, para sobretudo, incomodar o Commendatore na sua aventura na categoria máxima do automobilismo. E dizia-se "incomodar" com clareza, pois a pessoa que se falava que iria estar à frente do projecto era um ex-colaborador da marca de Modena, que saira da marca de 1962 e montara o seu próprio negócio. E agora, esse negócio tinha atraído um fabricante de tratores, que também queria vingar-se de Enzo Ferrari: Ferruchio Lamborghini.

A ideia de um duelo Ferrari vs Lamborghini na Formula 1 poderia ser interessante na visão de alguns, mas outros estavam a afirmar que a experiência do construtor de San'Agata Bolognese era nenhuma, apesar do sucesso dos seus modelos de estrada, como o Miura, por exemplo. Sabia-se que estavam a montar uma operação nas Interseries, que a partir de 1972 iriam abolir os carros de cinco litros em favor dos de três litros, mas o projecto desportivo ainda gatinhava. Mas por esta altura havia duas certezas: um motor V12 e o patrocinio da Martini. E o rumor era que o chassis seria da Tecno.

- Olha, se eles tem algum projecto de Formula 1, nada me dizem. E se soubesse, nada te diria, afirmou Alexandre de Monforte, a sorrir, ao jornalista.
- Mas o que acha destes rumores?

- São o que são: rumores. Agora estou aqui a conduzir este carro para me preparar para a minha estreia em Jarama. E quando à Tecno, é a Formula 2 e a minha candidatura ao título.

- Obrigado Alexandre, e boa sorte.

O jornalista desligou o gravador e arrumou o microfone, para encetar uma conversa mais descontraída com o piloto sildavo. Ele era André Barros, um brasileiro radicado há alguns anos e que escrevia para tudo que era publicação a motor em português, desde o Quatro Rodas brasileiro até ao Motor português, passando pelo sildavo Velocidade, sugestão do próprio Alexandre, que o conhecera ano e meio antes, exactamente no paddock de Brands.

- O que achas disto tudo?
- Onde é que ele vai arranjar dinheiro para isso tudo? A vender tratores e carros? Eles são belissimos, por acaso, mas o resto... os Pedrazini nada me dizem, e não vejo muita consistência no caso. Sabes onde fica a oficina dos motores?

- Não.

- Perto de Milão. Isto cheira-me mais a Alfa Romeo, e que eu saiba, eles só querem a Interseries. A Tecno está em Bolonha, que é mais perto de Sant'Agata. A não ser que ele venda a oficina à marca e se mude de armas e bagagens para Bolonha, não acredito.
- Hmmm...
- Vamos falar de outra coisa. Esse Medeiros que tu me falaste, tem que idade?

- 22 ou 23.
- Sério? É que nem parece...

- Têm muitos conhecimentos de mecânica. Lá no Brasil eles fazem tudo: até constroem carros!
- Acredito. A ser verdade, no final do ano está na Formula 1. O Jordan deve ter ficado espantado, para o querer na sua equipa de Formula 2, ao lado do Antti.
- Quem é o teu companheiro na Tecno?
- Um espanhol, Alvaro Ortega. Falam bem dele, parece que ganhou o GP do Mónaco de Formula 3. Mas primeiro quero saber como é que os Pedrazini o vão colocar no carro.
- Porquê?
- Tem 1.85 metros, afirmou, a rir.


Logo a seguir, um dos mecânicos chegou-se a ele para dizer que o carro estava pronto para a corrida. Encaminhou-se para ele e colocou o capacete e as luvas, preparando-se para a primeira corrida entre os tubarões. A conversa até serviu para se descontrarir um pouco, porque este iria ser a sua estreia na Formula 1, algo que tirando aquele jornalista, pouco se anunciara no país. Alexandre até deu o contacto do jornal local, a Tribuna de Monforte, para que André mandasse uma noticia para lá, algo que deixaria contente a sua familia.

O carro ainda não estava pintado com as cores pretendidas, mas para ele não importava. O que queria era ver-se como se comportava perante os tubarões, pessoas que meses antes os lia nos jornais e revistas, como Bob Turner, Pierre de Beaufort, Pieter Rinhardt... e outros que tinha disputado algumas corridas, como Anders Gustafsson, Gilles Carpentier e aquele que iria ser o seu grande rival na Formula 2 em 1970: o finlandês Antti Kalhola.

Henry Temple, o homem que tomara conta da Ecurie Holmgren, tinha ajudado a carreira de Kalhola desde os primeiros passos na Formula Vê escandidava, em 1968. Sendo casado com uma finlandesa, Temple adorou o seu potencial de piloto destemido, dando o seu melhor independentemente do seu carro. Não desistia e estava sempre nos limites. E ele o queria na sua equipa, mas Bruce Jordan também estava de olho em cima dele, para o lugar de Bob Bedford. Foi por isso que o colocou na sua equipa de Formula 2.

Para apressar os seus planos pois a ideia inicial era dar-lhe um Formula 1 em 1971, queria-o na sua equipa já em Jarama, antes que Bruce o agarasse e colocasse no seu carro. No final, Temple tinha dois pilotos jovens na sua equipa: o sul-africano Hocking e o finlandês Kalhola, pois não conseguira convencer De Villiers, que estava mais focado no título local e na bolsa subsequente do que antecipar a estreia na categoria máxima do automobilismo.

Entretanto, os carros saiam da pré-grelha e avançavam uns metros à frente do homem com a bandeira britânica debaixo do braço. Fazia gestos para se aproximarem da linha branca, numa grelha onde os três primeiros, o McLaren laranja de Bruce, o Matra azul de Beaufort e o Jordan negro de Reinhardt estavam a aproximar-se. Monforte estava na terceira linha... com Kalhola a seu lado, e o Apollo de Teddy Solana.
"Vai ser outro duelo interessante", pensava ele.

O homem foi para a berma, pegou na bandeira, ergeu-a, dando um compasso de espera, enquanto os motores rugiam mais algo do que nunca, e depois a baixou, dando inicio a uma corrida de 50 voltas ao longo do traçado acidentado, implantado no condado de Kent, nos arredores de Londres.

(continua)

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