Durante anos a fio, a Formula 1 foi provavelmente o unico desporto que correu na Africa do Sul durante o tempo do "apartheid", o odioso regime de segregação racial entre negros e brancos, instituido pelo Partido Nacional, de maioria "boer" e "afrikander", quando chegou ao poder em 1948 e lá permaneceu até às primeiras eleições multiraciais, em Abril de 1994, vencidas pelo ANC de Nelson Mandela.
A Africa do Sul sempre teve um campeonato local muito forte. Muitos chassis de Formula 1 lá ficavam após a primeira corrida do ano, normalmente disputada em Janeiro - primeiro em East London e depois em Kyalami - e pilotos locais de renome as guiavam, como John Love, Sam Tingle, Eddie Keizan, Jackie Pretorious, entre outros. Outros pilotos deram o salto, primeiro Tony Maggs e depois os irmãos Scheckter, de Durban: Ian, o mais velho e Jody, o mais novo, e que deu ao seu país e a Africa o unico título mundial, em 1979.
Mas ao longo dos anos 60 e 70, com a crscente pressão internacional para a abolição do regime do "apartheid", também causado pela teimosia do governo apresentar equipas segregadas nas várias modalidades (rugby, futebol, cricket e outros), aos poucos, eles foram abolidos das várias organizações internacionais. A sua última participação nos Jogos Olimpicos fora em 1960, em Roma, tinha sido banidos da FIFA, e no final da década, foram banidos de participar em testes de cricket e o organismo internacional de "rugby" desencorajou a ida de equipas inglesas, neozelandesas, australianas e irlandesas, entre outros, de jogar ou receber com os "Springbocks".
Mas aparentemente, a Formula 1 pouco se importou com isso. Fosse em Fevereiro, Março ou Outubro, no inicio ou no fim da temporada, arrumavam as coisas e iam tranquilamente para o rápido circuito de Kyalami, nos arredores de Joanesburgo, onde perante 60 ou 70 mil espectadores (todos brancos...) iam vibrar pelo seu piloto local ou pelos outros pilotos. E a assistir a tragédias, como o horrivel acidente de Tom Pryce, atingido pelo extintor que levava Jenson Van Vuuren, um comissário de pista com 18 anos e bagageiro no aeroporto Jan Smuts (agora OR Tambo International Airport)
Em 1985, por fim, as pressões tornam-se audíveis. Na própria Africa do Sul, a agitação social nas "townships" começava a ser grande, o governo minoritário de P.W. Botha estava intransigente em ceder, e tinha declarado o estado de emergência no país, e os governos um pouco por todo o mundo tentam impedir a realização do GP da Africa do Sul ou impedir que as equipas dos seus paises apareçam no país. Já havia boicotes de marcas, a pedido do governo americano, que também tinha colocado sanções económicas ao país, acentuando o isolamento internacional do regime da minoria branca. Há pressões sobre a FISA e a Jean-Marie Balestre para que se cancelasse o Grande Prémio, mas este manteve os planos, afirmando que tiveram mais do que tempo para protestar a realização dessa corrida, logo, não ia recuar na intenção da sua realização.
O boicote das equipas esteve no ar até à ulitma hora. A Ferrari ameaçou não ir à Africa do Sul, caso a McLaren não fosse, pois ambos estavam a lutar pelo título de construtores, que ainda não tinha sido atribuido. muitos pilotos encararam não correr na Africa do Sul, mas no final, ficaram a depender da sua decisão daquelas tomadas pelas equipas: se a equipa fosse, eles iriam correr.
E é nesse ambiente que a Formula 1 embarca em Joanesburgo, para a penultima corrida do ano, depois do título ter sido decidido na corrida anterior, em Brands Hatch. As francesas Renault e Ligier decidiram não participar, acedendo aos pedidos do governo francês de não comparecer na corrida. A Beatrice-Lola apareceu com Alan Jones, mas na manhã da corrida, a equipa retirou-se, alegando que o australiano estava doente. Mas aparentemente, dizia-se nos bastidores que a equipa de Carl Haas fora instruida pelo patrocinador para retirar o seu carro...
Alguns governos, como o finlandês e o sueco, tentavam convencer os seus pilotos, respectivamente Keke Rosberg e Stefan Johansson, para não irem competir a Africa do Sul, mas estes foram com as suas equipas. Alguns dos seus patrocinadores decidiram não colocar o seu produto nas carenagens das equipas, pois já sabiam que isso traria má publicidade. E os próprios pilotos tinham visões pessoais sobre isso... mas eram pagos para correr, e esta aconteceu a 19 de Outubro de 1985, um Sábado.
Alinharam 21 carros à partida e no final chegaram sete. A Williams fez dobradinha com Nigel Mansell e Keke Rosberg, que fez uma excelente corrida, após ter feito uma má partida, no final da sexta volta já era o lider. Alain Prost completou o pódio, enquanto que Stefan Johansson, Gerhard Berger e Thierry Boutsen completaram os lugares pontuáveis.
Apesar de tudo, ainda depois dessa corrida, a FISA e a FOCA de Bernie Ecclestone queriam continuar a correr na Africa do Sul, pois sabia-se que era um evento apoiado indirectamente pelo governo da altura, através do jornal "The Citizen". Só para terem uma ideia, à chegada das equipas e dos pilotos ao aeroporto, eram entregues a mecânicos, dirigentes e pilotos um salvo-conduto de forma a não terem nos seus passaportes o carimbo sul-africano, que poderia ser um motivo para barrá-los noutros paíeses... contudo, as pressões das cadeias de televisão e dos patrocinadores fizeram com que Ecclestone desistisse da ideia de vez.
A Formula 1 só voltaria a Africa do Sul e a Kyalami em 1992, quando as leis anti-apartheid foram abolidas de vez. Mas quando voltaram, o velho circuito de Kyalami tinha sido remodelado, e curvas como Carwthorne Corner não existiam mais, no seu lugar estava um condomínio de luxo.
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