Preferi escrever isto no final do dia pois queria ler as reações da gente ligada ao automobilismo à decisão da FIA de recolocar o GP do Bahrein a 30 de outubro, no lugar do GP da India, que em principio, será realizado a 11 de dezembro e será a corrida de encerramento do campeonato.
Nas horas que se seguiram ao anuncio oficial, a reação foi quase unânime: condenaram, de forma mais ou menos veemente, a decisão tomada pelo organismo comandado por Jean Todt, e cujos cordelinhos são movidos por Bernie Ecclestone. Ninguém tem dúvidas que foi Ecclestone que puxou as coisas para esse desfecho, pois foi ele o unico que defendeu o regresso da Formula 1 ao emirado, ainda em 2010, e no meio daquela agitação que ainda decorre, como vos falei ontem na minha habitual coluna.
Jornalistas consagrados como Adam Cooper ou James Allen já reagiram estando contra tal decisão. Joe Saward considera-a como "bizzara". Ex-pilotos como Stirling Moss e Martin Brundle também disseram no Twitter serem contra tal decisão, e mais reações surgirão ao longo das horas que se seguem. Quanto às equipas, depois do que a Red Bull disse, de modo oficioso, nada mais se ouviu falar, por agora, mas começa-se a entender que as equipas poderão marcar uma reunião para discutir este tema. Eles que sempre torceram o nariz para o regresso ao emirado, tem agora uma oportunidade de ouro para demonstrar para que serve a FOTA, se é uma união onde todos falam a uma só voz, ou algo inutil, que serve os interesses de equipa A ou B.
E esse é um ponto importante: equipas como a McLaren, Mercedes, Williams ou Ferrari que tem parcelas minoritárias pertencentes a fundos vindos do Golfo, como Qatar, Abu Dhabi ou Bahrein. Esses fundos são soberanos, ou seja, pertencem aos governos locais, e como sabem, já não eram conhecidos pelo seu bom comportamento em termos de direitos humanos, e agora com a "Primavera Árabe", e as respectivas reações, pior ainda.
O caso barenita é o mais exemplar deles todos naquela zona, e a sensação que fica é que a FIA volta para lá como forma de recuperar os 40 milhões de dólares que Bernie Ecclestone acordou com a familia real. Sempre acreditei nisso, por muito que ele diga o contrário, como disse esta manhã. E ao ver onde é que o Bahrein fica no "gordo calendário" de 2012, ao ser a prova de abertura, cinco meses depois desta corrida, só posso pensar que o Tio Bernie está obcecado com a sua parte de um bolo de 60 milhões de dólares.
Portanto, estamos a ver o autismo da FIA, de Jean Todt e de Bernie Ecclestone. Do anãozinho, nada de novo. Se ele elogia de quando em quando Adolf Hitler ou Robert Mugabe, é o sinal mais óbvio que ele não acredita na democracia, que o dominio de um homem só, decidindo como se fosse o representante de Deus na Terra é melhor do que todos decidirem em princípios elaborados num contrato social. Já fez isso no passado, quando a FIA ia alegremente à Africa do Sul nos anos 70 e 80, em plena era do dominio da minoria branca no pais, quando a FIFA, o Comité Olimpico Internacional e as federações de Cricket e Rugby expulsavam as selecções sul-africanas devido à sua politica de "apartheid". Só em 1985, quando algumas nações ocidentais apertaram os calos a algumas equipas, bem como os patrocinadores, é que deixaram de correr em Kyalami.
E é aí que quero pegar agora: há 25 anos atrás, o Ocidente foi bem sucedido em convencer a FIA a abandonar Kyalami. Será que não se poderá fazer o mesmo? Sei que a "realpolitik" muitas vezes tem dois pesos e duas medidas, e em muitos aspectos, os governos ocidentais não tem a mesma força para condenar o governo barenita da mesma forma que condenaram Muhammar Khadaffi ou Bashar Al-Assad. E mesmo assim, como sabemos, as reações foram diferentes: no caso libio, a NATO agiu, no caso sirio, pouco ou nada fazem para derrubar o regime dos Assad, enquanto que este massacra os seus concidadãos a seu bel-prazer.
Mas mesmo com a Realpolitik, os tempos são outros. Estamos numa altura em que a sociedade civil anda a descobrir as vantagens das redes sociais como o Facebook, porque não ser usado para apelar às equipas para que boicotem o GP barenita? Por mim, apesar de todo o meu cinismo e todas as minhas legitimas dúvidas, eu sou favorável a um boicote ao GP do Bahrein. Todos criticam a decisão e tal coisa seria bem vinda, e pressionar as equipas seria um primeiro passo para tal.
Um primeiro exemplo pode ser visto aqui, no site avaaz.org, onde em pouco mais de um dia já se conseguiu mais de 350 mil assinaturas um pouco por todo o mundo, e os numeros continham a aumentar, pelo que os 400 mil deverão ser atingidos lá por volta da meia-noite. A ideia é convencer a Red Bull em boicotar a corrida. E não é uma qualquer, como sabem: é a lider do campeonato e não tem ligações com os árabes, pelo menos na estrutura acionista. A revista britânica Motorposrt - que não é qualquer uma - também já apelou ao boicote. E fala-se que a Williams anda pelo mesmo caminho.
Em suma: a decisão de hoje foi apenas o começo da tempestade. Veremos como é que vai acabar.
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