Karel Pieter Antoni Jan Hubertus (Carel) Godin de Beaufort. Longo nome, hein? Esta aristocrata holandês foi provavelmente um dos últimos amadores da Formula 1. Homem fiel à Porsche, foi ele a alma da Ecurie Maasbergen, que andava nas pistas com um Porsche laranja, digno da casa de Oranje, a casa real holandesa. Das 28 vezes em que andou na categoria máxima do automobilismo (e conseguiu quatro pontos), em apenas duas vezes andou com outros carros. Da primeira vez, em 1959, foi com um Maserati 250F. Da segunda vez, foi com um Cooper T51.
A foto que meto aqui trata-se da mais famosa das suas estorietas, que aconteceu em 1959, em Avus. A correr num Porsche numa das corridas de suporte do GP da Alemanha desse ano. Têm um pouco de cómico e trágico, pois ele foi bafejado com a sorte quando o seu carro saiu de pista no temivel "banking", mas ele caiu de pé, ou seja, não capotou. Não querendo acreditar na sorte que teve, Beaufort simplesmente ligou o carro de novo e continuou na parte de baixo, regressando à pista! Os comissários decidiram aplicar a bandeira preta e desclassificá-lo, mas depois de se convencerem de que ele não era um fantasma!
No dia seguinte, Beaufort comemorou a sua sorte sentando-se no banking com as suas sapatilhas Converse calçadas. A foto deu polémica, pois se ele comemorava a sua finta contra a morte, isto acontecia no dia seguinte à morte de outro piloto, quase no mesmo local, o francês Jean Behra.
Se estivesse vivo, Carel de Beaufort faria hoje, 10 de abril, 81 anos. Mas ele não se levava muito a sério. Tanto que ele estava por vezes acima do peso (e chegou a pedir ajuda à lenda do judo holandês Anton Geesink para emagrecer), e por vezes corria descalço no seu modelo 718. Um desses exemplos aconteceu na sua corrida fatal, em Nurburgring, onde chegou a fazer umas voltas... com uma cabeleira dos Beatles! Mas há mais "estorietas" onde ele era protagonista, e a sua propensão para brincadeiras era lendária.
Uma delas, contada pelo jornalista holandês Rob Widenhoff, afirma que em Rouen, palco do GP de França de 1962, ele encontrou com Beaufort no "lobby" de um hotel local, aliviado por falar em holandês com alguém nesse fim de semana. O jornalista tinha aparecido por lá num enorme Chevrolet, e Beaufort pediu a ele se não podia dar-lhe boleia até ao local onde o seu carro estava a ser reparado pela equipa oficial da Porsche.
Chegados lá, rebocaram o carro, em troca de uma bela grade de cerveja holandesa, e na volta, iam calmamente a caminho do circuito, quando viram um agente da Gendemarie. Beaufort virou-se para ele e disse "Acelera, não temos nada a ver com essa gente!", ao mesmo tempo que colocava o seu pé em cima no de Widenhoff, que estava sobre o acelerador. Eviraram atropelar o "gendarme" por muito pouco, mas compensou: na corrida, vencida por Dan Gurney, noutro Porsche, Beaufort foi sexto, conseguindo o seu segundo ponto da sua carreira.
No ano seguinte, outra estória noutro circuito francês, em Reims. Durante minutos, nada se sabia da sua presença, temendo que se tivesse despistado e dado cabo do seu carro. Na realidade, estava a passear pela pista com uma bela "madmoiselle" ao seu lado, mostrando a pista e os seus arredores, a uma velocidade de passeio. Claro, os organizadores ficaram zangados...
O fim foi agonizante. Projetado para fora do seu Porsche, sofreu um traumatismo craniano e agonizou por dois dias antes de morrer, num hospital de Colonia. O seu acidente foram duas grandes ironias. primeiro, porque aconteceu em Bergwerk, numa das partes mais sinuosas do circuito, e segundo, De Beaufort tinha a fama de ser um piloto cauteloso. Aliás, o seu apelido no meio era "Veilige Careltje", ou seja, "pequeno e seguro Carel"...
No seu funeral, o seu caixão passeou por cima de um... Porsche, e entre os que carregavam o seu féretro estavam o Barão Huscke von Hanstein, Graham Hill, Ben Pon e Bob Anderson, entre outros. Na sua tumba, uma frase em francês: "Vertu est un Beaufort". A virtude está em Beaufort.
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