Não existiam grandes expectativas sobre a reunião que o Grupo de Estratégia teve ontem, mas parece que algumas das resoluções que saíram de lá mostraram que não foi uma reunião inútil. E a primeira das grandes resoluções foi o regresso dos reabastecimentos, em 2017, que os pneus serão maiores e o design dos carros será mais agressivo. E poderão ter aprovado a ideia do chassis-cliente. Mas outras coisas como uma dualidade de motores V6 Turbo e V8 aspirados, ficaram para outras calendas.
Primeiro que tudo, começamos pelo fim. Apesar de Ron Dennis ter dito que se vai fazer um "estudo sério" sobre o tema, com propostas a todas as equipas para um relatório a ser apresentado em julho, insiders como Joe Saward afirmam que é altamente provável que a ideia vá para a frente, porque Ron Dennis é adepto da ideia, pelo simples facto de precisar de mais chassis e mais motores Honda para que estes possam rolar e acumular quilómetros.
Mas há um problema, como diz o próprio Saward: é um tiro no pé. É que se as equipas compram os chassis dos outros, arriscam a ter uma competição monomarca, como é a IndyCar. Imaginem todas as equipas que têm agora motores Mercedes, como a Force India, Williams ou Lotus. Ano que vêm, as três equipas bem poderiam acabar por abdicar de construir os seus chassis e comprar o pacote completo a Brackley, não é? E a mesma coisa em relação à Ferrari e à Red Bull, com a Renault. Começava logo com a Toro Rosso, por exemplo...
É que para piorar as coisas, os custos não serão contidos, bem pelo contrário. O risco de decadência tornar-se-ia bem mais real, e eventuais rivais, como a Endurance e a Formula E, cresceriam de tal forma que suplantariam. E para piorar as coisas, a visão de longo prazo não existe. E já sabem, Bernie Ecclestone vai a caminho dos 85 anos e a CVC Capital Partners só pensa em amealhar a sua parte.
Aliás, a analogia que Saward arranja é bem... interessante:
"Se o mundo da Formula 1 fosse um bordel, seria explicado da seguinte forma: as meninas ainda estão ocupadas, mas o chulo vendeu os lugares para os clientes mais chamativos. O chefe de polícia foi subornado. Os clientes querem serviço gratuito, porque são os donos do lugar, então eles dizem as meninas "Você não sabem quem eu sou?" E com o tempo essas pessoas vão se afastar e não serão encontrados os devidos substitutos. O lugar acabará por fechar e no seu lugar aparecerá um novo hotel chique. Vai-se chamar de Fórmula E Hotel."
A única coisa que as grandes equipas não estão a ver (ou pior, não querem ver) é que isso vai destruir a base deste desporto - a única coisa que o torna diferente. Que isto vai fazer com que as grandes equipas sejam inalcançáveis e significa também que não vais ter nenhum dono de equipa jovem e ambicioso, mesmo sonhando em correr com carros-cliente, porque nunca será capaz de dar o salto até se tornar um construtor próprio. As equipas cliente nunca baterão as fábricas (aliás, por que isso seria permitido?) e vão ficar com o melhor,enquanto que os fabricantes mais pequenos vão ser empurrados para baixo e acabarão por morrer. No final, não haverá clientes, a menos que as grandes equipas possuam e financiem equipes secundárias (mais Toros Rossos). Isso vai ser como no final dos anos 30, quando a Mercedes e AutoUnion colocavam mais e mais carros nas corridas porque a oposição tinha morrido.
Assim, para a próxima geração de Ron Dennises e Frank Williams, não haverá esperança e eles vão ter que correr em outro lugar, como as equipas de GP2 e da IndyCar agora fazem. Como resultado, a Formula 1 enfraquecerá, a Fórmula E vai crescer, e a Endurance será mais forte.
Não sei se é por teimosia, arrogância, falta de visão ou por puro egoísmo, mas parece que não querem discutir o óbvio e vão andar entre tiros no pé até que a decadência já seja irreversível, talvez a partir de 2020, ou quando Bernie Ecclestone morrer. A solução mais simples é o teto salarial, algo do qual o Grupo de Estratégia não quer sequer ouvir falar. Mas o Joe fala que, caso a ideia dos chassis-cliente vá para a frente, as equipas mais pequenas poderão fazer queixa à União Europeia e esta comece a espreitar e ver os podres daquilo que o "tio" Joe chama de "bordel"...
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