Hoje em dia, se falarmos a um americano entendido de automobilismo sobre as 500 Milhas de Indianápolis, provavelmente falará dos Unser, dos Andretti, de A.J. Foyt, de Rick Mears, dos estrangeiros que ganharam por lá, desde Emerson Fittipaldi a Hélio Castro Neves, passando por Jim Clark. Os ainda mais entendidos falarão se calhar de Dan Gurney, de Ray Harroun, o primeiro vencedor, dos homens que salvaram a pista em 1944, como Wilbur Shaw e Tony Hulman. Há quem falará de Eddie Rickenbacker, e ficará espantado como ele, um ás da aviação, tinha a ver com automobilismo. Ou que o fundador da Chevrolet era o irmão mais velho de um dos vencedores da competição.
Mas seu falar de Ray Keech, se calhar 99 em 100 me perguntarão quem ele é. Pois bem, posso responder que ele é o único que teve duas coisas: a vitória no "Brickyard"... e um recorde do mundo de velocidade. E como no caso de Jimmy Murphy, que vos falei há uns meses, teve uma vida - e carreira - curta, interrompida bruscamente por um acidente fatal. E como a história é fascinante, de algo que aconteceu há mais de 90 anos, achei por bem trazer para aqui, pois provavelmente já não há quem esteja vivo e que tenha assistido aos seus feitos automobilísticos.
Então, agora, falo de Ray Keech, provavelmente um os mais interessantes pilotos que andavam por aí há mais de 90 anos. (...)
(...) Por esta altura, o recorde estava nas mãos de Malcom Campbell, que o tinha batido em fevereiro, quando estabeleceu um recorde de 333,048 km/hora no primeiro dos seus Bluebirds. Depois do carro ter passado pelo crivo dos escrutinadores, ele começou a fazer as suas tentativas de recorde, e a 22 de abril, conseguiu uma média de 334,02 km/hora, batendo por pouco o recorde anterior e fazendo com que este ficasse nos Estados Unidos. O seu nome estava nas paragonas dos jornais, mas não ficaria por ali. Poucas semanas depois, iria correr o seu primeiro Indianápolis 500, a bordo de um Miller, que também iria ser a primeira corrida da temporada americana.
(...) Maio [de 1929] é o mês das 500 Milhas, e Keech era dos pilotos a ter em conta na prova, a par de Cliff Woodbury, o vencedor do ano anterior, Lou Moore. Até havia pilotos estrangeiros por lá, como o monegasco Louis Chiron, a bordo de um Delage, tentarem a sua sorte. Um grande curiosidade é que o seu Miller tinha sido inscrito... por uma mulher, Maude A. Yagle, Ele ficou em sexto na grelha, fazendo uma média de 116,914 milhas por hora (184.923 km/hora) confirmando de uma certa maneira que ele poderia ser um dos candidatos ao primeiro lugar.
Nas primeiras voltas, Keech saltou para a segunda posição, atrás de Leon Duray enquanto atrás na volta 10, Bill Spence sofria um despiste e era ejetado do seu carro. Socorrido de imediato, acabou por morrer a caminho do hospital, com uma fratura do crânio, tornando-se no primeiro piloto a morrer na corrida desde 1919. Nada disso afetava Keech, que na volta 21, trocou de pneus e voltava à pista na décima posição. subiu até ao quarto lugar perto da primeira metade da corrida, até parar pela segunda e última vez na volta 109, para trocar de pneus e reabastecer, algo que durou três minutos.
Regressando na décima posição, rapidamente chegou ao segundo posto, atrás de Louie Meyer, que acabou por ir às boxes, mas a sua paragem para reabastecer foi um desastre e durou... sete minutos! Moore ficou como segundo posto, mas a duas voltas do final, o seu motor estava nas últimas e na curva 2, este cedeu, perdendo o segundo lugar para Meyer, que tentava recuperar o tempo perdido. Vitorioso na sua segunda participação e recolhendo 31.350 dólares de prémio, ele era o favorito à vitória do campeonato, porque vencer ali era o equivalente a mil pontos. Chiron foi o melhor estrangeiro, terminando em sétimo. (...)
Ray Keech foi uma verdadeira estrela cadente. Bastaram duas temporadas para passar de mero desconhecido para ser recordista do mundo, vencedor das 500 Milhas de Indianápolis e um dos melhores pilotos do seu tempo. Vice-campeão da AAA em 1928 e 1929, teve um final abrupto e trágico aos 28 anos, quando liderava uma corrida em Altoona. E é sobre este piloto do qual quase toda a gente já esqueceu que falo neste mês no Nobres do Grid.
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