quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

A imagem do dia


Hoje em dia, quando caminhamos alegremente para o primeiro quartel do século XXI, mesmo os que tem um conhecimento profundo do automobilismo tem alguma dificuldade em saber dos pilotos de há cem anos, e do seu palmarés. Pode-se ler numa enciclopédia sobre o piloto, mas se quiser saber sobre "como chegou lá", dessa parte, 99 em 100 amantes do automobilismo não te consegue responder. Para ver que a memória só irá até certo ponto. Quando desaparecem as últimas testemunhas oculares, sem outros testemunhos - cinematográficos e fotográficos, essencialmente - o nome pode estar lá nos livros, mas o entusiasmo não é grande. 

O que é pena, porque desse tempo dos "gloriosos malucos das máquinas rolantes" existiram gente que fariam mossa a alguns dos pilotos de hoje em dia, e é por isso que a discussão sobre "o melhor piloto de todos os tempos" é tão estéril quando saber o sexo dos anjos. Porque... daqui a cem anos, gente como Lewis Hamilton, Sebastien Loeb ou Kalle Rovanpera continuarão a ser saudados como são agora? 

Daí hoje falar de Ray Harroun. Para quem não sabe, o primeiro triunfador em Indianápolis. Mas foi muito mais que isso. 

Nascido a 12 de janeiro de 1879, ele se apaixonou pelo automobilismo no final da adolescência. Começou a correr em 1903, quando começou a dar nas vistas batendo o recorde de distância entre Chicago e Nova Iorque. Repetiu o feito no ano seguinte, estabelecendo nas 58 horas e 36 minutos. 

Quando Carl Fisher decidiu construir uma pista oval em Indianápolis, no final da primeira década do século XX, não era por acaso: a cidade era o centro de uma industria automóvel emergente, ainda antes de Detroit levar a melhor. Ter uma pista por ali seria excelente para testar as inovações que esses pioneiros tinham em mente e melhorar os carros que fabricavam. E um deles era a Marmon, no qual Harroun era um dos seus pilotos de testes e um engenheiro qualificado. 

Em 1911, Harroun já tinha 32 anos, mas tinha pendurado o capacete no final da temporada anterior - onde acabou campeão da AAA, a associação automobilística americana, a antecessora da IndyCar - ajudando na fábrica. Contudo, a corrida de 500 Milhas - 800 quilómetros - era algo bem interessante porque testava a resistência e durabilidade dos carros, algo que era importante nesses tempos onde as estradas eram pouco mais que carreiros de terra batida. Marmon decidiu construir o Wasp, e cedo se tornou um dos favoritos. A razão? Enquanto todos os outros eram alargados para poder ter um mecânico no lugar do passageiro, o carro colocava um espelho retrovisor em cima do piloto, tornando-o num monolugar, bem mais leve. Foi a primeira vez que se correu um monolugar tal como conhecemos hoje em dia. 

Das 200 voltas, Harroun liderou em 88 e a uma média de 120,060 km/hora, triunfou, entrando na história por ser o primeiro vencedor naquela que viria a ser a corrida mais importante nos Estados Unidos. 50 anos depois, em 1961, foi homenageado, aparecendo na televisão ao lado do triunfador desse ano. O nome? A.J. Foyt, então no começo da sua lendária carreira no automobilismo.  

E Harroun não era um mero piloto: era um excelente engenheiro. Para terem ideia fundou a sua própria marca de automóvel, que durou quatro anos, entre 1916 e 1920, e dos menos de três mil carros fabricados, apenas existem... dois, que sobreviveram até aos dias de hoje. Um deles foi vendido em leilão em 2019 por 39 mil dólares.

Ray Harroun morreu pouco depois de fazer 89 anos, a 19 de janeiro de 1968. Faz agora 55 anos que desapareceu de cena um dos pioneiros do automobilismo americano, cuja contribuição é mais duradoira que se pensa.  

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