E porque nunca o ouvimos falar, apesar de todos os feitos que falarei nas linhas a seguir? Se calhar, não havia televisão, as corridas que ele ganhou não são assim tão conhecidas - não creio, ele ganhou uma edição das 500 Milhas de Indianápolis. A minha explicação mais simples é esta: todos os que viram correr já morreram. É simples.
Jimmy Murphy, californiano de origem irlandesa (à direita na primeira foto), nasceu a 12 de setembro de 1894 e ficou órfão muito cedo, em 1906. Muito cedo, aos 18 anos, se meteu pelo automobilismo, que se tornou sua paixão e carreira. Começou como mecânico - nessa altura, os espelhos ainda não tinham sido colocados no modo geral nos carros, e as corridas eram bem longas, em circuitos enormes - e ali, aprendeu os truques do volante. No final da I Guerra Mundial, começa a ir para o lugar do condutor e, reconhecendo o seu talento a guiar, em 1920, na inauguração do Beverly Hills Speedway, nos arredores de Los Angeles, Murphy pega num Duesenberg e vence.
Pequeno detalhe: essa pista era um "Motordrome", ou seja, uma oval construída inteiramente em... madeira!
Depois dessa vitória, Tommy Milton, ex-piloto e também diretor desportivo da Duesenberg, apostou em Murphy para a sua equipa, no objetivo de ser o campeão da AAA (American Automobile Association, uma antecessora da IndyCar Racing), e a equipa tinha um objetivo em mente, no outro lado do Atlântico: o GP de França, a corrida mais prestigiada do mundo, então.
Em 1921, a corrida estava de volta, depois da interrupção causada pela Primeira Guerra Mundial, em 1914. Realizada em Le Mans, o local do primeiro Grande Prémio de sempre, em 1906, a equipa americana corria contra a italiana Fiat, as francesas Ballot e Talbot-Darracq e a britânica Sunbeam. Contra ele tinha o veterano Jules Goux - o primeiro europeu a ganhar as 500 Milhas de Indianápolis, em 1913 - o seu compatriota André Boillot, os britânicos Henry Seagrave e Kenelm Lee Guiness e o americano Ralph de Palma, que corria pela francesa Ballot. Com um regulamento que de uma certa maneira copiava o das 500 Milhas de Indianápolis, que permitia carros com motores até 3 litros, os Dusenberg tinham chances de algo inédito: a vitória.
E foi o que aconteceu: Murphy ficou com a liderança na segunda volta e só perdeu na volta 11, quando foi apanhado por Jean Chassagne, no seu Ballot de 3 litros. Contudo, na volta 17, quando reabastecia, o depósito rompeu-se e o carro de Chassagne foi pasto das chamas, impedindo-o de prosseguir. Murphy ficou com o comando da prova, depois do seu companheiro Joe Boyer ter tido problemas de motor e acabara também por desistir.
Quando ganhou, tinha feito história: aos 26 anos, era o primeiro americano a ganhar uma corrida europeia, e num carro americano! O que não se sabia era que iria ser a primeira de muitas vitórias. Ele ganharia as 500 Milhas de Indianápolis no ano seguinte - e no mesmo carro! - e seria o campeão da AAA no final de 1922. Em pouco mais de dois anos, tinha-se tornado num dos melhores pilotos americanos.
Quanto ao Grande Prémio, impacto foi tal nos habitantes e nas forças vivas da cidade que queriam algo permanente para trazer espectadores a Le Mans. Foi assim que nasceu a corrida das 24 Horas: mais que uma prova de resistência de carros e pilotos, era um chamariz para os espectadores nesta nova competição que era o automobilismo. E os americanos só voltariam a ganhar ali 46 anos depois, com um Ford GT40, guiado por Dan Gurney e A.J. Foyt. Curiosamente, uma semana depois de Gurney ter ganho o GP da Bélgica, no seu Eagle-Westlake.
A 15 de setembro de 1924, Murphy apareceu em Syracuse, em Nova Iorque, numa pista de "dirt track", a convite de um amigo, proprietário daquela pista. Murphy liderava o campeonato da AAA, e começou a corrida na liderança, bem à vontade. Contudo, na volta 138, de 150, aparentemente escorregou numa poça de óleo, o carro deslizou para um guard-rail de madeira, embateu forte e uma das tábuas entrou no carro e o empalou, tendo morte imediata.
Dias depois, foi proclamado campeão nacional, o seu segundo título, depois de ter ganho em 1922. Como seria de esperar, foi atribuído a título póstumo.
No seu elogio fúnebre, Fred J. Wagner, um dos dirigentes da AAA, afirmou:
"O espírito desportivo, como qualquer outra qualidade moral, não é instintivo. Deve ser adquirido. Jimmy Murphy, como nenhum outro, possuía a qualidade de um desportista a cem por cento. Invariavelmente, quando vencia, atribuía o seu sucesso à deusa da fortuna. Transportava as suas honras com mais alegria do que qualquer outro homem com quem tive contacto nos meus 30 anos como dirigente. Aceitou a vitória sem zombarias ou ostentações, e a derrota sem protestar. Era um em um milhão."
Murphy, provavelmente o melhor piloto americano da sua geração, morreu três dias depois de fazer 30 anos. E esta semana, passou-se um século do seu acidente mortal.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Comentem à vontade, mas gostava que se identificassem, porque apago os anónimos, por bem intencionados que estejam...