domingo, 5 de julho de 2009

Anatomia de dois génios da Formula 1 actual

A revista portuguesa Autosport traz esta semana um excelente comparativo sobre as carreiras dos dois homens que estão por detrás dos melhores carros da Formula 1 da actualidade: o Brawn BGP 001 e o Red Bull RB5. Já entenderam: vou falar de Adrian Newey e Ross Brawn. O jornalista Luis Vasconcelos decidiu fazer um artigo para mostrar quem são e como trabalham estes dois homens que são veteranos do pelotão da Formula 1, com uma carreira de sucesso com mais de 25 anos cada um.

ROSS BRAWN E ADRIAN NEWEY: DUELO DE GÉNIOS

Ross Brawn e Adrian Newey são os lideres técnicos das duas equipas que estão a dominar o Mundial de formula 1 deste ano. Numa temporada em que os regulamentos foram alterados e os projectos feitos a partir de uma folha em branco, os dois génios que restam na formula 1 estão a bater os grandes construtores, mas qual deles é o melhor?

LUIS VASCONCELOS

Não podia ser só uma coincidência, pois não? Com as equipas a terem de começar do zero os projectos dos chassis de 2009, Ross Brawn e Adrian Newey fizeram melhor trabalho do que a generalidade dos seus rivais e depois de oito corridas, só os seus carros venceram Grandes Prémios, enquanto que a Ferrari, McLaren e BMW estão longe de conseguir um triunfo.

Se o Brawn GP 001 começou a temporada em alta, o Red Bull RB5 mostrou-se competitivo, mas um pouco frágil nas primeiras corridas do ano, dando uma grande passo em frente antes do GP da Grã-Bretanha, com Vettel e Webber a dominarem por completo o fim de semana de Silverstone. Não havia quem defendesse no "paddock" que o chassis de Newey era o melhor de todos desde o inicio do ano, com a diferença para a Brawn a ser feita pela inexistência de um duplo difusor no RB5. Uma ideia que ganhou maior peso graças aos acontecimentos de Silverstone, onde a versão completa do duplo difusor do Red Bull fez a sua estreia, com resultados devastadores.

DIFERENÇAS EVIDENTES

Se nos resultados, Brawn e Newey são semelhantes - entre 1992 e 2004 só carros projectados por estes dois homens venceram o Mundial, com uma vantagem de sete a seis para Brawn - a nivel de temperamento e forma de funcionar, as diferenças não podiam ser maiores. Alexander Wurz, que foi piloto de testes da McLaren quando Newey era o Director Técnico e está ligado a Ross Brawn desde que este chegou à Honda, explica as diferenças: "Apesar de ter passado mais tempo na McLaren do que na Honda e na Brawn, e de ter feito muitos mais testes na McLaren, porque agora as restrições são enormes, confesso que tenho muito mais contacto com o Ross do que alguma vez tive com o Adrian.

O Adrian aparece pouco nos testes, intervêm pouco nos 'briefings', mas toma muitas notas e depois decide quais as alterações a fazer. O Ross está sempre presente, tem muito mais contacto com os pilotos, ouve as nossas opiniões de forma muito mais atenta e depois propõe uma solução, mas sempre ouvindo as nossas opiniões. Não posso dizer qual o melhor, porque são os dois geniais, maos com o Ross sinto-me muito mais parte da decisão do que com o Adrian, porque ele interioriza tudo o que ouviu e chega ao caminho ideal por si próprio".

As diferenças são evidentes na forma de relacionamento com a equipa e o resto do "paddock", como nos explicou Pat Symmonds: "Com a ressalta de ter trabalhado cinco anos com o Ross, quando ele esteve na Benetton, e nunca ter trabalhado com o Adrian, tenho de admitir que é mais fácil ter um relacionamento com o Ross apesar dele ser bastante reservado. Mas quando te conhece um pouco melhor é bastante aberto e a sua contribuição nas reuniões técnicas é bastante importante. Já o Adrian é pouco dado a grandes colóquios, perfere mandar outras pessoas às reuniões técnicas, mais quando está presente dá sempre uma contribuição preciosa. Penso que o Ross funciona muito bem como o lider de um grupo, enquanto que o Adrian funciona melhor sozinho, com um grupo de trabalho que o entenda bem a trabalhar sob as suas ordens."

PENSAMENTO RADICAL

Se há uma caracteristica de Adrian Newey que faz parte do folclore da Formula 1 é a sua dificuldade de aceitar compromissos nos seus projectos, sacrificando tudo à eficácia aerodinâmica dos seus chassis. Afragilidade mecânica dos primeiros McLaren e dos dois primeiros Red Bull que projectou são prova disso, mas na Williams, onde esteve entre Junho de 1990 e o final do ano de 1996 - tendo ainda projectado o carro de 1997 - teve em Patrick Head um travão a quaisquer exageros.

O sócio minoritário da Williams admite que "trabalhar com o Adrian foi dos maiores prazeres profissionais da minha vida. Ele veio para a equipa colmatar uma área em que não sou especialista, a da aerodinâmica, mas foi ganhando espaço no seio do nosso departamento técnico. Claro que sendo jovem e determinado, ele tinha ideias bastante radicais, mas não posso dizer que fosse dificil trabalhar com ele, pois as nossas posições eram bem claras e o relacionamento pessoal foi sempre bom. Mas se eu não fosse chefe dele, talvez o nosso relacionamento não fosse tão fácil e profícuo, pois quandl ele tem uma coisa em mente, é complicado demonstrar-lhe que está a ir longe demais!"

EFEITO ESTABILIZADOR

Também Ross Brawn passou pela Williams, entre 1979 e 1982, deixando excelente impressão em Head: "Ele chegou para trabalhar na fábrica, mas em pouco tempo passou a trabalhar na área de projecto e acabou por ficar na área da aerodinâmica. Nâo posso dizer que esperava que um dia ele tivesse uma equipa sua a ganhar corridas, mas impressionou-me a sua capacidade de organização, o seu raciocinio lógico e a vontade de aprender, pois chegou ainda bastente verde à Williams".

O homem que ajudou Michael Schumacher a vencer todos os seus sete títulos mundiais é um elemento estabilizador nas equipas por onde passa, como nos contou Alan McNish, seu piloto de testes na Benetton: "Talvez por ter sido mecânico, projectista, engenheiro de pista e agora até patrão de uma equipa, o ross tem uma cpmpreensão de tudo o que se passa numa equipa que é pouco comum encontrar em qualquer categoria. Quando trabalhei com ele espantou-me o tempo que ele dedicava a ouvir as minhas ideias, mas precebi que ele fazia o mesmo com os engenheiros e os mecânicos, pescando um pouco das nossas ideias para chegar a uma decisão. Por ser extremamente calmo, ele é um elemento estabilizador nas suas equipas e o homem capaz de tomar as decisões mais dificeis sem pestanejar quando a pressão é enorme".

Os chassis da Brawn nunca estiveram muito longe da controversia regulamentar, tanto na Benetton, como na Ferrari, como agora na Brawn, enquanto que Newey teve diversos projectos seus aprovados pela FIA antes de os ver banidos, por ter ido mais além do que o legislador tinha visto. Talvez por isso, a melhor definição que ouvimos de ambos foi dada pelo nosso colaborador Ivan Capelli: "Quando penso no Adrian, vejo-o a fazer um barbecue em casa com a familia e os amigos e deixar a carne esturricar na grelha porque teve uma ideia genial e foi para a sua prancheta de desenho desenhá-la, e esquecendo por completo o que estava a fazer antes. Já quando penso no Ross, vejo-o sentado na sua secretária, até altas horas da noite, com o regulamento técnico da Formula 1 numa mão e o dicionário de Inglês na outra, para ver quantas interpretações diferentes se pode ter da mesma regra e encontrar, depois, aquela que mais vantagem trará aos seus projectos!"

Os historiais, métodos e temperamentos podem ser radicalmente diferentes, mas os resultados são muito semelhantes entre Ross Brawn e Adrian Newey. Prova que o génio assume muitas formas, para bem da Formula 1, que tem nestes dois técnicos os herdeiros legitimos dos Colin Chapman e Mauro Forgheri de outros tempos.

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