A noticia surgiu ontem, através do jornal britânico The Independent: os proprietários dos circuitos de Formula 1 reuniram-se no passado dia 17 de maio em Genebra para celebrarem a fundação de uma associação de promotres, a Formula One Promoters Association, a FOPA. Presidida pelo australiano Ron Walker, o diretor do circuito de Melbourne, a ideia é ter uma palavra a dizer, defendendo os seus interesses perante Jean Todt, o presidente da FIA, e principalmente Bernie Ecclestone, o promotor da Formula 1. E eles, claro, já disseram ao que vinham: “Históricamente, têm-nos faltado uma voz unica, que nos fale por todos, e a the Formula One Promoters Association dá-nos essa oportunidade. Existem várias matérias de interesse comum do qual é importante que sejam ouvidas pelas entidades competentes.” afirmou Neil England, o presidente do circuito de Silverstone, entrevistado pelo jornal britânico.
O dinheiro que os circuitos movimentam é imenso. Graças aos acordos que Bernie Ecclestone assina com os proprietários, em 2011, estes vão gastar cerca de 409 milhões de euros, 309 milhões dos quais provenientes de fundos governamentais um pouco por todo o mundo. Segundo dizia ontem o James Allen no seu site, as receitas dos circuitos valem 33,6 por cento das receitas totais da Formula 1, mais 1,6 por cento do que as receitas provenientes das transmissões televisivas. Ao todo, a Formula 1 recebeu em 2011 977 milhões de euros em receitas, e é um negócio do qual Ecclestone recebe cerca de metade, através da CVC Capital Partners. E claro, passam pelos circuitos uma parte do segredo do sucesso de Bernie Ecclestone na Formula 1 e do qual ele seria beneficiado com esta associação: é que Ron Walker é um dos seus aliados mais próximos. E muitos outros proprietários de circuitos, como Tamas Rohonyi, diretor do circuito de Interlagos, também apoiam Ecclestone.
O surgimento da FOPA surge numa altura em que se discute o novo Pacto da Concórdia - que contrariamente ao que Bernie Ecclestone anuncia aos quatro ventos, ainda não foi acordado nem assinado - e também quando se prepara para uma futura entrada da Formula 1, através da CVC Capital Partners, na Bolsa de Singapura, para além dos novos regulamentos que a Formula 1 vai ter em 2014, nomeadamente o regresso dos motores V6 turbo de 1.6 litros. Apesar do projeto da OPA na Formula 1 estar a ser projetado, muito provavelmente não irá acontecer tão cedo.
Desconhece-se bem o que esta nova associação pode fazer na Formula 1. Mas provavelmente o anuncio de uma nova entidade para defender os seus interesses, certamente seria a última coisa que Jean Todt, o presidente da FIA, quer. É que segundo fala Chris Sylt, do site Pitpass - e autor do artigo do The Independent a anunciar a FOPA - a constituição da associação foi uma coisa planeada há mais de um ano, de forma discreta, e já houve ensaios bem sucedidos. Segundo conta Sylt, foram eles que no ano passado decidiram vetar o projeto dos motores híbridos para 2014, e foram eles que fizeram com que a FIA adotasse os motores V6 Turbo a partir desse mesmo ano.
E a razão pelo qual eles podem ser uma ameaça maior para Todt, é que poderão moldar os regulamentos segundo os seus propósitos, argumentando que são eles que fazem com que os espectadores venham aos circuitos e sigam a Formula 1, providenciando as devidas condições e cumprindo as regras de segurança elaboradas pela própria FIA. E também há outra ameaça que deve ser levada a sério: são eles os únicos circuitos de Grau 1 aprovados pela FIA, e em caso de "fuga em massa", a Formula 1 ficaria com poucos circuitos desse tipo para correr: Fuji, Dubai, Imola, Magny-Cours, Mugello, Paul Ricard e Zeltweg. A grande maioria dos circuitos são de Grau 2, que vai desde históricos como Anderstorp ou Mosport, até aos mais recentes, como Portimão ou Ordos, na China.
Para quem esteja a franzir um pouco o sobrolho sobre o meu aviso, um pouco de história: até ao inicio dos anos 70, os proprietários dos circuitos eram o lobby mais poderoso dos Grandes Prémios. As pessoas que estavam à frente de circuitos como Nurburgring, Spa-Francochamps, Monza, Mónaco ou Silverstone elaboravam as regras de segurança, estabeleciam os prémios monetários e verificavam se os carros estavam conforme as regras, que eram muito mais vagas do que são agora. E também eram eles que definiam quantos carros é que iriam alinhar nesses Grandes Prémios. Spa-Francochamps, por exemplo, poderia dizer num ano que alinhariam 18 carros, mas no ano seguinte poderia ser 16, como no Mónaco.
E foi para se libertarem da "ditadura" dos circuitos - especialmente no campo da segurança - que os pilotos, através da GPDA, e as construtoras - primeiro com a FOCA e depois com a FOTA - se juntaram em associações para defenderem os seus interesses e se aliaram em busca de maior segurança, modificando as pistas, algo que os proprietários dos circuitos estavam relutantes em prosseguir. Só quando começou a haver boicotes e ameaças de cancelamento, no inicio dos anos 70, é que eles conseguiram quebrar o poder que esses proprietários tinham. E claro, a entrada em cena de Bernie Ecclestone fez o resto.
E agora, este contra-ataque tem boas razões para acontecer: a cada ano que passa, esses proprietários pagam cada vez mais dinheiro e vêm as suas margens de lucro desaparecer. Lenta, mas inexoravelmente, circuitos como Spa-Francochamps estão a acumular prejuízos e a pensar largar a Formula 1 devido aos altos preços e às condições cada vez mais exigentes em termos de segurança, por exemplo. E também podem não estar a concordar muito com o rumo do automobilismo ir cada vez mais para paragens desconhecidas, mas também há outra boa razão para estarem zangadas: as mudanças no regulamento, que falei acima.
Em suma: este novo "lobby" é sério e como será de esperar em todos os "lobbies" tem interesses a defender. Mas estes estão mais dispostos a irem para a guerra do que as equipas de Formula 1. E a aparição de tal força, num ano em que se negoceia novo Pacto da Concórdia, não pode ser menosprezada.
Eu to dizendo... Este homem não perde nada nunca! Tem sempre uma carta na manga.
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