quarta-feira, 11 de outubro de 2023

A imagem do dia (II)





Gentleman drivers, aventureiros com a paixão da Formula 1 sempre existiram. Mas no final dos anos 70 e inicio dos anos 80, isso tinha diminuído bastante por causa da quantidade de equipas que apareciam, que preenchiam as grelhas de partida, e faziam os seus próprios chassis. Mas existiam um ou outro privado, com a sua própria estrutura, gerindo os chassis dos outros. E nesse final dos anos 70, existia na Grã-Bretanha um campeonato nacional, o Aurora Series, onde pilotos corriam em chassis com um ou mais anos, experimentando as máquinas mais potentes, caso viessem da Formula 3 ou Formula 2, e claro, tentar a sua sorte na categoria máxima do automobilismo.

Um dos pilotos era o espanhol Emílio de Villota. Nascido a 26 de julho de 1946 em Madrid, desde 1972 que competia internacionalmente, primeiro nos GT's com o Seat 124, e depois, a partir de 1976, nos monolugares, com a ideia de participar na Formula 1. A última tentativa espanhola tinha sido quatro anos antes, com o catalão Alex Soler-Roig, que correram com Lotus, March e BRM, sem resultados.

De Villota chegou à Formula 1 no GP de Espanha de 1976 com um Brabham BT44B inscrito pela RAM Racing - curiosamente, ao lado de outro espanhol, Emílio Zapico, que corria num Williams FW04 - e ambos não conseguiram se qualificar. De Villota continuou nos anos seguintes, montando uma equipa e correndo com um McLaren M23, em 1977, antes de se virar para a série britânica, onde correu com um Lotus 78 em 1979, vencendo e andando na luta pelo título. 

Em 1980, ele tinha um Williams FW07, um dos carros do momento, e pretendia participar no GP de Espanha, que iria acontecer a 1 de junho. Mas nessa altura, a Formula 1 estava ao rubro com uma guerra entre a FISA e os construtores, representados pela Formula One Constructors Association, ou FOCA, dirigidos pelo patrão da Brabham, Bernie Ecclestone. Em causa estava uma multa de dois mil dólares aplicada aos pilotos que não participaram na conferência de imprensa do GP do Mónaco. As equipas queriam pagar a multa, mas Jean-Marie Balestre, o presidente da FISA, fez questão que os pilotos pagassem, caso contrário, seriam excluídos. A coisa ficou tão quente que existia o risco real de cancelamento do GP de Espanha, que iria acontecer a 1 de junho, e só com intervenção do rei Juan Carlos I que isso não aconteceu. 

Como se resolveu? Tirando a corrida das mãos da FISA e colocando no da RACE, o Real Automóvil Club de España. Logo, deixa de estar no calendário da Formula 1.

Contudo, houve repercussões. As equipas FISA - Ferrari, Renault, Alfa Romeo - retiraram-se, Balestre afirmou que esta corrida seria retirada do calendário, não contaria para os pontos, e apenas 22 pilotos alinharam, todas FOCA, e todos com motor Cosworth. E isso incluiu De Villota, no seu Williams. 17º na grelha, em 22 carros - ficou na frente dos Fittipaldi! - a corrida começou pelas 16 horas, depois de um atraso de duas horas por causa de se tentar chegar a um acordo de última hora entre as duas partes. 

Quando a corrida começou, debaixo de um calor de 38ºC, Carlos Reutemann fica na frente, sendo perseguido por Alan Jones e Jacques Laffite. E à medida que as voltas aconteciam, os carros não resistiam ao calor. Problemas de travões, e motores a explodirem faziam encolher o pelotão. Reutemann e Lafite lutam um contra outro na corrida... 

Até que na volta 35, ambos encontram o Williams de De Villota. Que ia levar com uma volta de atraso.

Quando ele viu Reutemann nos espelhos, meteu-se por uma linha interior para que o argentino passasse. Mas Laffite aproveitou a oportunidade para tentar uma manobra arriscada e bateu na traseira do Williams do espanhol. Na manobra, Reutemann foi também atingido e os três acabam por desistir. Os dois primeiros no momento, o espanhol algumas curvas mais tarde. 

No final, Alan Jones ganha a corrida. Apenas seis carros chegam ao fim, e no dia seguinte, a FISA considera que a corrida não conta para os pontos. Aliás, a FISA multou todas as equipas em 1400 dólares cada uma. 

De Villota voltaria a correr em 1982, num March, em cinco corridas. Não se qualificou em nenhuma delas, e entrou na história para ser o último privado a participar em corridas de Formula 1. 

Hoje conto a sua história para homenagear a a sua filha, Maria de Villota, que morreu faz agora 10 anos, um ano depois de um acidente com um chassis da Marussia, no Reino Unido, ter causado fraturas cranianas e a perda do seu olho direito. A autora hispano-venezuelana Rocio Romero escreveu hoje um texto em sua homenagem.

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