quinta-feira, 2 de abril de 2015

A foto do dia

Em fevereiro de 2009, na apresentação do seu livro "Manoel de Oliveira, piloto de Automóveis", na cidade do Porto, o autor comentou sobre as diferenças entre o seu tempo e a atualidade, bem como as suas preferências pessoais: “Hoje, os carros são muito mais evoluídos, inclusive para defesa do piloto. Mesmo assim, o brasileiro Ayrton Senna foi desta para melhor. Era um bom piloto, até já estive no seu túmulo, em São Paulo, e chamou-me a atenção a placa que lá tinha: 'Podem-me roubar tudo, menos o meu amor a Deus'. Mas, para mim, Juan Manuel Fangio ficará como o melhor de sempre. O Tazio Nuvolari também ganhou muitas corridas, só que o argentino ainda lhe era superior”.

Estes últimos dez anos mostraram facetas de Manoel de Oliveira - morto hoje, aos 106 anos de idade - desconhecidos do grande público. Alguns sabiam que ele era irmão de Casemiro de Oliveira, piloto de automóveis nos anos 30 e 50, e que chegou a se inscrever para o GP de Portugal de 1958, num Maserati 250, do qual não chegou a participar, mas muito poucos já se lembravam que ele também tinha sido piloto de automóveis nos anos 30. E não só ganhou corridas em Portugal, como aproveitou a sua paixão pelo cinema para divulgar a sua aventura no automobilismo.

Foi uma carreira curta, terminada por causa da II Guerra Mundial e pelo facto de se ter casado com a mulher com quem ficaria até aos seus últimos dias. Mas nesse tempo, ajudou a pilotar e a divulgar o projeto Edfor, num chassis baseado num Ford A, feito Eduardo Ferreirinha (o Ed de Edfor é dele) com um motor V8 de 3 litros, quase como que um antepassado dos Cosworth V8. Afinal de contas, o Edfor é um antepassado daquilo que chamamos hoje de preparadores.

Conto hoje esta história de Manoel de Oliveira no sitio Motordrome. Lá, falo do convite que Manoel e Casemiro receberam em 1938, para participar no Circuito da Gávea, no Rio de Janeiro, apelidado de "Trampolim do Diabo" pelos locais. O circuito era enorme, desafiador, a ao convite, responderam pilotos como Carlo Pintacuda, no seu Alfa Romeo oficial. A corrida foi a 12 de junho desse ano, mas dias antes, ambos tinham sido recebidos em apoteose pela comunidade portuguesa. Manoel ia no seu Edfor, enquanto que Casemiro ia num Bugatti. Ambos fizeram corridas cautelosas, mas compensou, quando ele subiu ao degrau mais baixo do pódio, apenas batido por Pintacuda e o argentino Arzani.

Depois, Oliveira e Ferreirinha tentaram vencer os seus chassis Edfor, e até fizeram um filme promocional de dez minutos, de seu nome "Já Se Fabricam Automóveis em Portugal", onde se mostrava o processo de fabrico dos chassis e de preparação dos motores. Infelizmente, apenas quatro chassis foram construídos e um deles sobrevive nos dias de hoje no Museu do Automóvel do Caramulo.

A carreira dele acabou em 1940, apesar de fazer alguns ralis até 1953. Apesar de ter se dedicado ao cinema, o automobilismo não esteve muito longe dos seus pensamentos, apesar de nunca mais ter feito um filme sobre o assunto. Continuou a guiar até aos 97 anos, até que decidiu não renovar a carta condução por “não ter mais pachorra para fazer testes psicotécnicos”, tinha declarado em 2009 numa entrevista à revista Visão.

De uma certa forma, era o último dos moicanos. Provavelmente, o último piloto vivo a vencer uma corrida antes da II Guerra Mundial, e o mais velho de sempre, e isso seria mais uma honraria a acrescentar à honraria de ser o realizador mais velho de sempre em atividade, fazendo filmes até praticamente os seus últimos dias. Tornou-se num mito, que foi para além das fronteiras da cidade do Porto, e deste retângulo à beira-mar plantado.

1 comentário:

André Candreva disse...

Como eu disso pro Jaime,

Seu Manoel fez história nas pistas e nas telas...

descanse em paz...