Algumas semanas depois, surgiu um problema inesperado. Carlo Caparino, o projectista da marca, ficou doente. A principio, pensava-se que seria uma gripe, mas as coisas tenderam a piorar, com uma pneumonia, do qual levou a uma longa convalescença para conseguir curá-la. Durante uma das visitas ao hospital, Andrea de Agostini ouviu da boca dele de que teria de arranjar um novo projectista para o ajudar, pois já antes disso, começava a ter dificuldades com todo o trabalho que estava a ter para desenhar os carros de estrada e os carros da Formula 1 e da Interseries. Caparino tinha a mania da perfeição e achava que desdobrando-se em muitos sitios, a qualidade dos bólides ressentia-se. Agostini viu a dimensão do problema e concordou com a ideia de arranjar um projetista autónomo da divisão de estrada.
Para Cavenaghi, aquela doença era a pior coisa que poderia acontecer a tão poucas semanas da estreia oficial na Interseries. Era amigo de Caparino e precisava dele para a continuidade do projecto. A sorte, no meio de todo aquele azar, era que ambos os carros já estavam prontos, embora em traços simples e algo grosseiros. Mas Cavenaghi sabia que para os desenvolver, tinha de arranjar alguém para os fazer, mesmo depois de Caparino regressar ao trabalho. Telefonou à Bertone e Pinifarina para saber de algum estagiário com conhecimentos de aerodinâmica. Telefonou a amigos em Itália, França e Grã-Bretanha, para saber se conheciam algum desenhador e aerodinamista desempregado, ou com vontade de mudar de ares. Falou com Tony Rudd, inicialmente no sentido de o contratar, mas este perguntou:
- Não falaste com o Bertone?
- Falei, mas porquê?
- Perguntaste por um Andrew Bennett?
- Não, porquê?
- Homem, é o homem certo para ti! Está em Itália, acho que se ofereceu à Ferrari, mas recusaram-no. Ele quer tentar a sua sorte na Formula 1, parece-lhe uma obsessão...
Cavenaghi ficou espantado. Conhecia a Bertone, devido às grandes ligações que ambas as empresas tinham, mas eles nem sequer lhe tinham falado de tal personagem. Depois da conversa com Rudd, voltou a telefonar para eles e perguntou se não o podia chamar para a sede. Na segunda feira da segunda semana de Janeiro de 1972, quando se preparava a apresentação oficial da equipa, em Sant'Agata Bolognese, aparece à porta da fábrica um Fiat 850 vermelho, guiado por um jovem rapazinho com óculos quadrados de massa. Ao seu lado, o banco do passageiro estava cheio com rolos de projectos para mostrar, e o banco traseiro também tinha mais algumas pastas, certamente cheias de projetos de carros, tudo isto, provavelmente, colocados naquele pequeno automóvel com uma grande vontade de convencer os patrões de que era a pessoa certa para aquele lugar.
Pedro Cavenaghi via os projectos de Bennett, e apesar de estar num ramo diferente da mecânica, sabia reconhecer um bom projecto, e via que estes desenhos poderiam ser de uma enorme utilidade para o futuro.
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Poucos dias depois daquela visita, a 20 de Janeiro de 1972, a imprensa mundial estava em peso em Sant'Agata Bolognese para ver o novo bólido da Lamborgnhini. Tinha sido algo preparado com antecedência: os convites tinham sido feitos à imprensa nacional e internacional, aos patrocinadores e demais convidados, e em principio, a paresentação deveria ser no extetior da fábrica. Mas o boletim meteorológico tinha dado as voltas: nevou nesse dia. Assim, a apresentação teve de ser movido para o seu interior, e muitos dos convidados estiveram ausentes, retidos pelo mau tempo.
O projecto era apoiado pela firma de bebidas Martini & Rossi, e começaria com apenas um carro, pilotado por Michele Guarini, e com a estreia marcada para o GP de Espanha, quarta prova do Mundial, depois das viagens sul-americanas e do GP sul-africano. Apesar destas ausências, o tempo que tinham era mais do que suficiente para fazer testes extensivos no carro, para que Bennett começasse a ver onde poderia melhorar no chassis desenhado por Carlo Caparino.
John Hogarth tinha conseguido estar na apresentação antes que as coisas se agravassem em termos de tempo, e tinha trazido consigo um jovem rapaz de cabelo castanho longo, nariz aquilino, de estatura média e um sorriso permanente. Como ambos falavam inglês com o mesmo sotaque, Cavenaghi supôs que fosse americano… mas na realidade não era assim.
- Pedro, apresento-te Patrick Truffaut. É piloto.
- Como vai? Pedro Cavenaghi.
- Como vai, é um prazer conhecer. Têm umas belas instalações. E uns belos carros.
- O que acha do nosso projecto?
- O John teve a falar sobre ele. Existem muitas esperanças depositadas, suponho eu.
- E o senhor de onde?
- Trois-Riviérs.
- De que estado é?
- Quebec.
- Não me recordo dos Estados Unidos terem um estado com esse nome.
- Ele é canadiano, Pedro.
- Ah… desconhecia, confesso. Qual foi o grande feito dele?
- Foi o “Rookie do Ano” na USAC, na equipa do Dan Gurney.
- Ahhh… tem experiência de carros.
- USAC, Can-Am… fui o primeiro canadiano a ganhar nas duas competições.
- Que idade tem?
- 26 anos. Nasci em 1945, a 8 de Março, mais concretamente.
- Já correu nas Interseries?
- Não, mas creio que não deva ser muito diferente do que a Can-Am. E a mesma coisa poderei dizer de um Formula 1, que não deve ser muito diferente de um carro da USAC. E já dei umas voltas num McLaren, no final do ano passado…
- De certeza que não te recordas dele? perguntou Hogarth. Terceiro lugar, Watkins Glen...
Pedro lembrou-se do rapaz que num McLaren pintado de azul, espantara meio mundo ao dar luta ao Apollo de Monforte e ao Ferrari de Van Diemen quer em Mosport, onde acabou no sexto lugar, e depois subiu ao pódio quando Philipp de Villiers conseguira a sua inesperada vitória na corrida americana, depois de passar o Jordan de Kahola numa manobra pouco ortodoxa. Ambos tinham observado com algum espanto aquele estranho canadiano, que não o tinham visto de lado algum a não ser nos potentes carros de Can-Am, onde a bordo de um McLaren tinha dado um segundo show, agora com o nome de “Pete & Jack Racing Show”, sendo o Pete o primeiro nome de Peter Revson, e Jack o nome de Jack Thompson, que agora era a dupla da McLaren numa carreira tripartida entre a Can-Am, a USAC e a Formula 1. Patrick Truffaut tinha participado nessas três categorias, sempre em part-time, mas em 1972, não tinha contrato assinado com os “laranjas”. Sem grandes perspectivas de futuro, e quando pensava seriamente em correr na USAC, John Hogarth aborda-o e convence-o de que a Lamborghini tinha um projeto muito aliciante para 1972 e seguintes. E decidira alinhar.
- Pena não me derem um carro de Formula 1…
- Quem diz que você não vai conduzir um desses?
- Não sei, só vejo um piloto.
- Caro Patrick, se tudo correr bem, haverá um segundo carro no final do ano para si. Entretanto, ajude-nos na Interseries, ao lado do Michele.
- Então, que seja. E isso inclui Le Mans?
- Obviamente. Aí esperamos ter dois carros.
- Com quem mais?
- O Manfred Linzmayer, É veterano, mas sabe do que faz.
- E quem mais?
- Há mais alguns nomes a considerar. Pensamos no Bob Bedford, mas queríamos um grande nome, algo como um Pieter Reinhardt.
- O Patrick Van Diemen seria o ideal. Corre na Ferrari...
- Estou a ver que este é um senhor projeto.
- Vai ser grande, acredite. Da minha parte e do John, estamos a fazer tudo para isso.
(continua amanhã)
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