quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

No aniversário da morte de Colin Chapman, volto a falar da herança...

Pessoalmente, voltar constantemente à história das Lotus começa a ser uma tarefa cansativa, e sou o primeiro a confessar tal coisa. Mas hoje há excelentes razões pelo qual faço esta incursão, e tem a ver com o dia em si e em dois desenvolvimentos sobre a luta "Lotus Cars vs Team Lotus" que aconteceram ontem e hoje.

Primeiro que tudo, digo que hoje passam 28 anos sobre a morte precoce de Colin Chapman, o fundador da Lotus Cars e da Team Lotus. Falecido precocemente aos 54 anos, tinha todas as razões de saúde para ter o fim que teve. Se forem ver as suas fotografias do inicio dos anos 80, vêm um homem cansado e com cabelos brancos desde muito cedo. Essas fotos, tiradas quando mal tinha alcançado 50 anos, demonstram que o trabalho em gerir todo um grupo Lotus era enorme. Além de pouco delegar as tarefas, o facto de viver num tempo onde as regras começavam a apertar cada vez mais, e os custos a aumentarem cada vez mais, com poucos resultados, o fez ficar cada vez mais desiludido com o automobilismo.

E para piorar as coisas, as suas escolhas no final da vida, especialmente a partir de 1980, eram no minimo polémicas. Primeiro com David Thieme, o patrão da Essex Petroleum, com sede no Mónaco e que não era mais do que um especulador que tinha feito fortuna com a segunda crise petrolifera de 1979-80 (cerca de 70 milhões de dólares). Numa altura em que as vendas de automóveis tinham diminuido, especialmente na América, aquela injeção de dinheiro era bem vinda. Em 1980, Thiemme (com o seu chapéu preto e óculos de sol) e Chapman eram inseparáveis e ele tinha investido um milhão de dólares na equipa, para começar.

Mas a meio de 1981 o balão rebentou: o preço do crude desceu, o fisco suiço investigou as contas e prendeu temporáriamente Thiemme sob pretexto de fraude fiscal - depois foi libertado sem acusações - e a Essex Petroleum desapareceu pouco depois, bem como Thiemme. E isso aconteceu na pior altura possivel, pois Chapman tinha investido tudo no Lotus 88 de chassis duplo, que a FISA declarou ilegal desde o primeiro momento.

Depois veio a história da DeLorean. Chapman tinha feito um acordo com John DeLorean no final de 1978 para desenvolver o chassis DMC-12, e no meio disto tudo, o governo britânico decidiu conceder subsidios na ordem das 100 milhões de libras para a construção de uma fábrica em Dunmurry, na Irlanda do Norte. O carro começou a ser produzido em 1981, mas o chassis era mau de todo e os trabalhadores eram inexperientes. Ao fim de um ano, a fábrica fechou, por ordem do governo britânico, depois de DeLoeran ter sido apanhado pelo FBI sob acusações de tráfico de droga. Mas o governo britânico estava a investigar o paradeiro dos milhões perdidos, eventualmente desviados para outros bolsos, e Chapman, bem como o seu contablista Fred Bushell e braço direito, já estavam a ser investigados. Mais tarde, em 1992, Bushell foi condenado a três anos de prisão por fraude.

Para piorar as coisas, Chapman tomava anfetaminas desde há algum tempo e a sua vida pessoal estava a ficar lentamente num caos. E foi nesse aperto quase sufocante que Chapman morre aos 54 anos, depois de uma viagem a Paris no seu jacto privado. Tão de repente, e com a história do funeral ter sido feito em caixão fechado, fez despertar a teoria da conspiração que Chapman teria fugido para Mato Grosso do Sul, para gozar com os milhões que teria tirado do esquena da DeLorean. Quando tiverem tempo, aconselho-vos a ver o documentário da BBC chamado "The Secret Life of Colin Chapman", e vejam as declarações do David Thiemme, por exemplo. Não vos faz lembrar ninguém?

Passada a parte histórica, vamos à actualidade: antes de me deitar, ontem à noite, andei ler um post escrito pelo James Allen, pois ele tinha sido um dos poucos jornalistas convidados pelo Dany Bahar para um jantar com a imprensa britânica onde ele expôs as suas planos para expandir a marca um pouco por todo o lado. E as suas declarações, que a principio me pareciam mirabolantes à primeira vista, após uma segunda leitura, merecem ser referidas. Porquê? No meu ponto de vista, demonstram que Bahar é um caso clinico, para ser meigo.

Vou explicar: Bahar planeia usar a mesma tática que deu resultado na Red Bull, e no qual ajudou a erguer. Ou seja, quer usar o nome Lotus e o seu significado para elaborar um plano muito ambicioso, que envolve a Formula 1, a GP2, a GP3, a Indy, Le Mans e a construção de pelo menos quatro modelos de estrada, com o objectivo último de transformar a Lotus numa "Porsche britânica", tudo isso num espaço de quatro anos. O preço disso tudo? 700 milhões de libras, vindos quase totalmente dos cofres do estado malaio. Não é dos cofres da Lotus nem da Proton, será um pais inteiro a apoiar a sua megalomania.

No jantar, ele fez declarações afirmando que menorizava as tentativas da parte de Tony Fernandes, afirmando que não estava interessado na herança da Team Lotus, e que não importava que o projecto de Fernandes ficasse com ele. Estranhas declarações, para uma companhia que coloca orgulhosamente os feitos da equipa de Formula 1 nas paredes da fábrica de Hethel...

Para piorar as coisas, Bahar disse que tinha feito uma proposta para Fernandes para fazerem um acordo de parceria e que Fernandes tinha recusado, afirmando que após essa recusa de acordo é que tinha ido para o acordo com a Renault. Tony Fernandes negou terminantemente tal coisa à Autosport britânica:

"Nunca existiu uma oferta. Existe a ideia de que o envolvimento da Lotus com a Renault está avaliado em 20 milhões de libras, o que quer dizer que eu estava a pedir 60 milhões - o que é uma completa invenção. Nunca passámos de um jantar inicial. O Dany Bahar e o Riad Asmat encontraram-se e foi isso. Nunca se trocaram ofertas", referiu.

"Estávamos abertos à parceria, ao trabalho conjunto e a outras combinações. Queríamos trabalhar para o bem da marca Lotus e fazia sentido combinar. (...) Penso que com o conjunto que temos, para o final da próxima época não deveremos andar longe da Renault F1 e se tivesse havido um pouco mais de paciência e de abertura teria existido uma super colaboração", acrescentou.

E Fernandes aproveitou para atacar as declarações desta semana: "Está a ser demasiado. Nos últimos dias, recebi ataques da parte de Dany Bahar, Eric Boullier e Gérard Lopez. Pessoalmente, penso que ficou fora do controlo e muito foi inventado. Como pode o Eric Boullier dizer que enganámos os adeptos - penso que isso é um insulto para os adeptos. Eles decidem pela sua própria cabeça. Se não estivermos à altura, os adeptos não nos darão o seu apoio. Não se pode enganar ninguém. Esta será a minha última declaração acerca deste assunto e espero que o bom senso impere. Tudo o que queríamos era trazer de volta a Lotus à competição e construir uma boa relação com o Grupo Lotus e penso que essa teria sido a melhor solução para todos", concluiu.

De uma certa maneira, ele tem razão. As declarações dos últimos dias fazem a impressão de que isto tudo é uma cortina de fumo por parte de Bahar, tentando convencer a opinião publica, maioritariamente apoiante de Fernandes, de que eles são os herdeiros, enquanto que na realidade, não são. E a sensação que fico depois de ler isto tudo é que Bahar é mais um caso clinico do que outra coisa. Ontem falei que ele não era nenhum Dietrich Mateschitz, e mesmo que fosse, a sua estratégia do austriaco funcionou com uma lata que custa dois ou três euros a unidade. Neste caso, estamos a falar de carros de estrada que valem 30 mil libras, no minimo. E na caixa de comentários do James Allen, alguns começam a comparar Dany Bahar ao John DeLorean, o tal que queria construir o seu modelo e acabou a ser preso por tráfico de cocaína no inicio dos anos 80. E a comparação não era inocente: afinal de contas, Colin Chapman foi arrastado nesse esquema, que o acabou por o matar precocemente há exactamente 28 anos.

E quanto ao James e o Autosport, nada contra, mas fico com a sensação que foram "convertidos" pelo Bahar. Não ficam com essa impressão?

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