sexta-feira, 17 de abril de 2020

A(s) image(ns) do dia



Em 1955, Stirling Moss teve a sua grande chance de guiar um carro de uma equipa de primeira linha. Essa chance aconteceu depois de, no ano anterior, o seu pai lhe ter comparado um Maserati 250F e ter conseguido um pódio na Bélgica, suficiente para que a equipa oficial o assistisse para o resto da temporada. E claro, pelo caminho, tentou convencer Alfred Neubauer de que o piloto. então com 25 anos, tinha talento suficiente para correr nos carros alemães, que faziam o seu regresso pela porta da frente, vencendo quase todas as corridas até então - a sua derrota em Silverstone, às mãos do Ferrari de Froilan Gonzalez também tinha sido épica.

Nessa temporada, Moss tinha como companheiro de equipa Juan Manuel Fangio, para além dos alemães Hans Hermann e Karl Kling. Com quase 18 anos de diferença entre os dois, ambos formaram uma rivalidade nas pistas e uma amizade fora delas. Unia-os um sentimento de que estavam a arriscar o pescoço sempre que corriam, sabendo que poderiam não mais voltar a casa. Moss sabia que Fangio era veloz, e o que tinha de fazer era de ver como ele conseguia conduzir para que ele seguisse e quando a oportunidade aparecesse, o passasse. Foi uma temporada harmoniosa: o carro era bom, eles dominavam, normalmente com Fangio em primeiro e Moss em segundo. E por uma vez guiaram juntos: nas 24 Horas de Le Mans, a infame edição onde Pierre "Levegh" perdeu o controle do seu carro quando o Jaguar de Mik Hawtohrn travou à sua frente com os seus travões de disco, e causou o acidente que matou mais de 80 espectadores.

Com esse acidente, as coisas mudaram: Moss e Fangio estavam a caminho da vitória quando a marca alemã decidiu retirar os carros da prova, e grande parte dos organizadores decidiu cancelar as corridas de Formula 1 do calendário. A Suíça, por exemplo, proibiu as provas de circuito até aos dias de hoje, abrindo recentemente a excepção à formula E. Naquele verão, o automobilismo esteve muito perto de terminar, devido à falta de segurança, que começava a ser intolerável.

Mas houve poucas corridas que se mantiveram. Grã-Bretanha era uma delas, e nesse ano iriam correr em Aintree, numa pista desenhada na mítica pista de cavalos nos arredores de Liverpool. Os Mercedes dominram nos treinos, ficando com quatro dos primeiros cinco lugares da grelha, o único a incomodá-os foi Jean Behra, terceiro no seu Maserati. Mas na corrida, eles andaram à vontade, com Fangio na frente, seguido por Moss. O britânico passou-o na terceira volta, até ir às boxes, onde o argentino ficou de novo na frente. Depois das paragens, Moss ficou na primeira posição, enquanto Fangio o seguia de perto. 

O jovem britânico pensava que iria ver um sinal das boxes, de Neubauer, para que deixasse passar o argentino e ficar com o primeiro lugar, mas dali, nada apareceu. As coisas foram assim até à meta, quando Moss atravessou no primeiro posto, perante o júbilo dos locais. Afinal de contas, era o primeiro britânico a vencer em casa. No final, perguntou a Fangio se o deixou ganhar. Este negou: "não, hoje simplesmente foste o melhor". O argentino manteve a narrativa até morrer, e Moss foi para a tumba convencido do contrário.

A realidade era esta: os Mercedes ficaram com os quatro primeiros lugares, com Kling a completar o pódio, na frente do veterano italiano Piero Taruffi. Foi o último tetra da marca alemã. No final do ano, retiraram-se da Formula 1 e só voltariam 55 anos depois.

Automobilismo e o coronavirus: As novidades do dia 17

Começamos pela Formula E, que ontem decidiu que iria adiar por mais um mês o seu recomeço. Depois de ter decidido suspender o campeonato em março, adiando para maio, decidiu hoje dar mais um mês para ver "como param as modas", saber se por essa altura haverá condições para o retomar de um campeonato que é liderado por António Félix da Costa.

Entretanto, Alejandro Agag coloca a chance de correr em circuitos convencionais, talvez quando o Gen3 estiver pronto. Como é sabido, foi adiado por um ano a estreia do Gen2 Evo - iria ser em 2020-21 - que teria mais apêndices aerodinâmicos, e a ideia de ter um carro a acelerar a 300 km/hora, com uma autonomia de uma hora, começa a ser uma realidade. E ele acha que isso é possivel.

Vai haver um amanhã e vai ser diferente. Temos de nos preparar para isso. Acho que com as medidas já tomadas, agimos bem, dando flexibilidade às equipas. Mas, podem haver mais medidas de cortes no futuro.”, começou por dizer à autosport.com.

Vamos pensar e discutir com todos os envolvidos para depois tomarmos uma decisão. A prioridade é controlar e reduzir os custos no futuro.

Imaginem que o Gen3 é capaz de andar a 300km/h, e tem autonomia de uma hora. Se calhar vamos pensar em circuitos convencionais. Isso reduz os custos. Não digo que o vamos fazer, mas digo que temos muitas variáveis a discutir.”, concluiu.

Na Formula 1, com todos a falarem sobre o que poderá ser o calendário, e que muitos desses Grandes Prémios poderão ser realizados à porta fechada, a Liberty Media admite que terão de fazer novo calendário, adaptado às circunstâncias, pois é muito provável que este comece no verão, à medida que alguns países levantarem as restrições à circulação.

Num comunicado oficial nesta quinta-feira, eles falam sobre isso, e sobre aqueles que compraram bilhetes para corridas que foram adiadas ou canceladas.

A nossa intenção é começar a temporada 2020 neste verão. Neste momento, ninguém pode saber exatamente quando a situação vai melhorar, mas quando isso acontecer, estaremos prontos para correr novamente. Estamos todos comprometidos em levar aos fãs um campeonato.”, começa por dizer.

Atualmente, a Fórmula 1 está a trabalhar com nossos promotores num calendário repensado que provavelmente irá ser significativamente diferente do nosso calendário original de 2020. Isso será publicado no devido tempo.

Se comprou bilhetes para corridas que foram adiadas ou canceladas pelo F1Tickets.com, F1 Paddock Club e F1 Experiences, atualmente estamos a trabalhar com cada promotor nas opções de transferência e reembolso disponíveis. Estamos a trabalhar com rapidez para finalizar essas opções e entraremos em contacto em breve com os implicados”, dizia o comunicado.

Os titulares de bilhetes que não compraram pelos meios acima refeeridos devem receber as informações mais recentes sobre transferências ou reembolsos por meio de seu ponto de compra, seja o revendedor relevante ou o site oficial do promotor, pois os processos de transferência ou reembolso podem diferir para cada corrida.”

Para corridas não adiadas, os bilhetes já adquiridos permanecem válidos.”, concluiu.

quinta-feira, 16 de abril de 2020

Youtube Formula 1 Video: Os dez melhores dos anos 60

O Josh Revell está a fazer uma contagem sobre os melhores pilotos de cada década e agora, chegou aos anos 60 do século XX, ou seja, a segunda década da Formula 1, onde muitos dos pilotos que admiramos correram nessa era. Claro, o numero um têm o seu lugar garantido, e o seu bom humor está bem intacto, especialmente com as descrições sobre Denny Hulme, Dan Gurney, Graham Hill e um certo pretendente à Tripla Coroa...

Enfim, vale a pena.

quarta-feira, 15 de abril de 2020

Noticias: GP da Áustria pode acontecer de portas fechadas

Poderá estar a aparecer no horizonte a corrida que marcará o inicio da Formula 1 em 2020. Esta quarta-feira, o governo austríaco afirmou que não objeta à chance de ter o GP da Áustria, no circuito Red Bull Ring, na data indicada e de portas fechadas.

Falando numa conferência de imprensa na quarta-feira, Werner Kogler, o ministro do Desporto e também o vice-chanceler austríaco, disse que o governo não se oporia à realização da corrida, desde que se realize sem espectadores.

"Não queremos interferir", começou por dizer Kogler. "Esta é uma situação completamente diferente da dos jogos [de futebol] num estádio. Várias pessoas seriam afectadas. As regras de distância mínima teriam que ser observadas da mesma maneira, é claro. Mas isso parece possível.", continuou.

"Não quero esconder o fato de que estou em contacto com o governador da Styria a esse respeito. Isso estaria no calendário existente em julho. Por fim, as federações desportivas devem decidir isso por si mesmas. E eu também estava em contacto com Helmut Marko, que por sua vez desempenha um papel correspondente na Red Bull e actuou como mediador. Eu disse a ele que gostaria de honrar isso, que encaminharemos todas as directrizes aplicáveis às associações relevantes de automobilismo como um serviço, para que elas possam ver o que é possível ou não", concluiu.

Desde esta semana que a Áustria - que tem 14,234 casos, com 384 mortes e 7633 pacientes curados - levantou algumas das restrições em relação aos estabelecimentos, mantendo, porem, as regras de distanciamento social. Espera-se que o governo comece a levantar progressivamente alguns dessas restrições nas semanas seguintes, dependendo do aumento do número de casos ou não. A corrida está marcada para o dia 5 de julho, no calendário inicial, aconteceria entre as corridas de França - que não oficialmente, está condenada a não se realizar na data prevista - e o da Grã-Bretanha, previsto para o dia 12 de julho. 

Youtube Formula 1 Video: A apresentação do jogo de 2020

Esta quarta-feira, a Formula 1 e a Codemasters decidiram lançar o video para o anuncio da sua versão de 2020, de uma temporada que, como todos sabem, está em suspenso. e se calhar pode ser que nem arranque...

Mas mesmo assim, vale a pena saber que poderemos ter a possibilidade de montar a nossa própria equipa, a famosa 11ª (finalmente, vou montar a minha Speeder Racing Tech!) e no capitulo dos pilotos do passado, poderemos andar nos carros que consagraram a carreira de Michael Schumacher, agora que se comemora o 20º aniversário do seu primeiro título mundial ao serviço da Ferrari. Logo, o F2000 e o Jordan 191, onde ele se estreou no GP da Belgica de 1991, estão disponíveis.

Parece que esse jogo vai ser interessante. Em principio, será laçado em julho.

terça-feira, 14 de abril de 2020

A imagem do dia

No final de 1961, Stirling Moss tinha 32 anos e uma década de Formula 1, um feito numa competição onde as chances de ter um acidente grave e de morrer eram muito altas. Nem o próprio Moss tinha escapado a um acidente grande, quando nos treinos do GP da Bélgica de 1960, se despistou com o seu Lotus e acabou no hospital com fraturas e esteve mês e meio em convalescença, recuperando a tempo de vencer uma corrida em Riverside e outra no Mónaco, contra uma armada Ferrari que tinha tudo para ganhar, mas não conseguiu nas ruas apertadas do Principado.

Moss foi o melhor "não-Ferrari" nessa temporada, e foi bem melhor do que os carros oficiais da Lotus, que já tinham um piloto em potencial na figura do escocês Jim Clark. E ele sabia que poderia ser o seu rival, se quisesse ter uma chance para alcançar um título que rondava desde 1955, mas que nunca tinha alcançado.

A parceria com Rob Walker era perfeita, mas sabia que a Lotus, que tinha dado chassis desde 1960, com o modelo 18, e depois com o 21, não iria dar o 25, que iria se tornar no carro oficial, e seria o primeiro monocoque da marca. Para clientes como Walker, haveria o 24, que seria como o 25, mas sem o monocoque. E eles sabiam que teriam uma desvantagem à partida. 

Assim sendo, Walker falou com Enzo Ferrari, que expôs o problema e queria saber se poderia ceder um dos seus chassis 156 vitoriosos no ano anterior. O Commendatore disse sim, e Moss, que uma década antes tinha-se zangado com ele por causa de um contrato que não foi cumprido como o britânico queria, e jurou que não correria com os seus carros, aceitou a ideia. Mas até lá chegar, acabou por usar um modelo 24 para as primeiras corridas do ano, uma série de eventos no Reino Unido, pois nesse ano, a Formula 1 começava em paragens holandesas, em maio.

Na segunda-feira de Páscoa, em Goodwood, Moss corria com esse Lotus 24 inscrito pela British Racing Partnership, na Glover Trophy. Tinha feito a pole-position e a volta mais rápida, mas na oitava volta, um despiste o feriu gravemente. Tinha ficado preso no seu carro e desfalecido, a sua retirada do carro demorou algum tempo. Quando o conseguiram levar para o hospital, tinha ferimentos internos, o seu lado esquerdo paralisado e estava em coma. Apenas acordou um mês ais tarde, e teve uma lenta recuperação. No final do ano, já recuperado, fez um teste, num Lotus 19, e depois de ter feito algumas voltas um pouco abaixo do recorde da pista, sentiu que não tinha os reflexos de outrora e decidiu pendurar o capacete de vez.

Pelo menos, é essa a sua versão oficial. Muitos acreditam que ele, aos 33 anos de idade, poderá ter pensado duas coisas: que a sua sorte tinha chegado ao fim, e era melhor ficar vivo para contar a história, e já havia sangue novo no horizonte. Enquanto esteve convalescente, Clark mostrou todo o seu potencial na Lotus e tinha armado uma rivalidade com outro piloto, curiosamente da mesma idade que Moss: Graham Hill, piloto da BRM, e que tinha acabado por ser campeão do mundo. E como queria ser campeão do mundo, e sabia qual era o melhor chassis do marcado, ser cliente do melhor chassis do mercado reduziria imenso a sua chance de ganhar um título. Assim, pendurou o capacete e se tornou bom a ser... ele mesmo. E a sua história foi contada nas gerações seguintes por parte de multidões que nunca o viram correr, mas o admiram pelos seus feitos.

Motores e o coronavirus: As atualizações do dia 14

Depois da Páscoa, as noticias relacionadas com o automobilismo continuam a ser calendários desfeitos, corridas caneladas ou adiadas para uma altura melhor, e hoje começa com uma dessas noticias. O GP de França poderá ser o próximo a cair no calendário, depois de ontem, o presidente francês Emmanuel Macron ter dito que todas as realizações desportivas ao ar livre estarem proibidas até meados de julho, altura para qual está marcado o GP francês.

Além disso, as restrições a entradas de pessoas vindas de fora do país continuam, pelo é cada vez menos provável que a Formula 1 arranque ainda em julho. Não que o circuito de Paul Ricard seja uma corrida espectacular - toda a gente sabe que não é... - mas cada vez mais se observa que até meados do verão, não haverá um arranque da competição. E se calhar, é cada vez mais provável que não haja corridas em 2020, a não ser que façam uma divisão em duas temporadas.

E é sobre isso que Max Mosley saiu da sua toca e falou para um orgão de comunicação especializado. No dia em que comemorou o seu 80º aniversário, o ex-presidente da FIA, cargo que ocupou entre 1991 e 2009, afirma que a temporada de 2020 deveria ser abandonada devido à incerteza sobre a pandemia e concentrar-se em 2021.

"A situação corre o risco de piorar se esperarmos", começou por dizer o antigo dirigente britânico numa entrevista à agência DPA.

"Não há garantia de que poderemos competir novamente em julho, é muito incerto. Se cancelarmos a temporada agora, ficará mais claro para as equipas e organizadores dos Grandes Prémios tomarem medidas e planearem o futuro. Desde que não saibamos o que a pandemia fará da perspectiva global, é impossível fazer planos racionais para a Fórmula 1", concluiu.

Não é o único a apelar ao cancelamento puro e simples: Bernie Ecclestone já tinha feito apelos nesse sentido desde há umas semanas para cá. 

Jean Todt falou esta semana sobre a situação atual e adotou um discurso realista. O atual presidente da FIA falou à alemã Auto Motor und Sport e referiu que não pode descartar a chance de perder equipas devido à crise pandémica.

O único cenário que exigiria um ajuste seria a perda de algumas equipas, o que não podemos descartar. Espero que não entremos nessa situação. Então teríamos que fazer perguntas fundamentais com os detentores de direitos comerciais e analisar como deve ser a Fórmula 1 no futuro? No pior cenário, a Fórmula 1 como a conhecemos hoje não seria mais possível.”, começou por comentar.

Sobre a chance de diminuir ainda mais o teto orçamental, agora colocado em 150 milhões de euros, Todt afirmou que tem uma visão pragmática desta situação:

Entendo essa posição, mas não acredito em milagres. As diferenças entre equipas grandes e menores devem ser reduzidas, mas não devemos começar a sonhar. Nunca será o caso de uma equipa pequena competir regularmente contra uma equipa grande em pé de igualdade.”

Não devemos mentir para nós mesmos. Se falamos de 120, 130 ou 140 milhões de dólares, ou seja, o limite de custo, sem exceções, para as grandes equipes, essas exceções representam mais de cem por cento do limite orçamental. Agora, quando o limite é reduzido, eles até expressaram o desejo de estender as isenções. Mas sou contra.”, concluiu.

Eis a situação por estes dias. Mais novidades aparecerão à medida que os dias avancem, agora que é provável que alguns países comecem a sair da situação de "lockdown" completo, embora este comece a ser muito gradual, e com muitos cuidados.

Youtube Motoring Ad: Chrysler Valliant, 1970

Na semana da morte de Stirling Moss, recuo meio século no tempo, até 1970, quando a Chrysler Austrália apresentou o seu carro, o Valliant, para o publico do seu país. Com 41 anos de idade e já retirado, o piloto inglês falou sobre o motor Hemi, de seis cilindros em linha, uma novidade num carro que já existia desde 1962, e continuaria por ali até 1981, três anos depois das operações da Chrysler Australia serem adquiridas pela japonesa Mitsubishi.

São três anúncios num, mas vale a pena. O mais estranho no meio disto tudo é ver um anuncio australiano de um carro de origem americana, cujo garoto-propaganda é um ex-piloto britânico...


domingo, 12 de abril de 2020

Youbue Motoring Ad: Stirling Moss e o seu Renault Twizy

Em 2015, a Renault fez um anuncio publicitário com Stirling Moss e o seu Renault Twizy especial. O antigo piloto, então com 85 anos, vivia no centro de Londres, em Mayfair, e já há muito tinha largado os grandes carros e andava com os pequenos, especialmente um Smart com uma matricula personalizada. Mesmo já idoso, não era assim tão "agarrado" ao passado, pois era mais pragmático que muita gente. Assim sendo, o Twizy era para ele o ideal para as suas saídas de casa...

E foi com isso em mente que a Renault fez este anuncio publicitário. Tenho de reconhecer que o carro é engarçado e tem agilidade para as voltas na cidade... e pouco mais. Afinal de contas, só tem 80 quilómetros de autonomia. Mas o anuncio tem o que de divertido.

A imagem do dia

Costuma-se dizer que dos derrotados, não reza a história. Depende sempre se o perdedor sobrevive, pois caso isso aconteça, ele têm o poder de contar a sua versão dos acontecimentos. E sempre que o conta, se o faz com graciosidade e bom humor, sem ressentimentos, é capaz de conquistar a audiência. Napoleão Boanaparte fê-lo nos seus dias de exílio perpétuo em Santa Helena, e deu o mote para que outros contassem as suas versões. Reparem na equipa de futebol holandesa: nunca venceu um campeonato do mundo de futebol, mas o encanto que deixam nos relvados do mundo inteiro, e graças a pessoas como Johan Cruyff, o colocam no panteão dos gloriosos. Derrotados, mas gloriosos na mesma.

De uma certa forma, foi assim que se encarou Stirling Moss. Um piloto que se tornou no favorito de toda uma geração, os seus feitos nas pistas de todo o mundo, ao volante de diversos carros ao longo de uma década, fê-lo cair no goto dos fãs de automobilismo e o seu charme e bom humor foi suficiente para conquistar o carinho dos fãs, suficiente para compensar os títulos mundiais que poderia ter tido, mas não teve. E os campeonatos de 1956 e 58 poderiam ter sido dele, se tivesse tido mais sorte.

Mas os campeonatos que perdeu são compensados com muitas vitórias. E uma delas, para ele se tornou a sua favorita: o GP do Mónaco de 1961, prova de abertura do campeonato desse ano.

Moss tinha tido uma temporada de 1960 atribulada. Vencera no Mónaco com autoridade, mas duas corridas depois, sofreu um grave acidente nos treinos do GP da Bélgica, onde ficou em coma por algumas semanas, recuperando totalmente e correndo a tempo de vencer na última prova desse ano, em Riverside, palco do GP dos Estados Unidos.

Em 1961, os carros iriam adoptar os novos regulamentos, com os motores de 1500cc aspirados, e os Ferrari, com o modelo 156, parecia que tinha o favoritismo. E a sua equipa tinha alguns dos pilotos do momento: os americanos Phil Hill e Richie Ginther e o alemão Wolfgang Von Trips. Com a Lotus a alinhar com Jim Ckark e Innes Ireland, e a Cooper com Jack Brabham e Bruce McLaren, Rob Walker alinhava com Moss e o veterano francês Maurice Trintignant. O favoritismo dos Lotus foi abalado por ele, que conseguiu a pole-position.

Na corrida, as coisas começaram com Clark e Ginther a ficar com o comando, deixando Moss no terceiro posto. Mas cedo do escocês da Lotus teve problemas com a sua bomba de gasolina, e acabou com onze voltas de atraso. Moss, no seu Lotus-Climax com menos potência, conseguia converter fraquezas em forças, e foi para a frente, depois de passar Ginther para ficar com o comando, enquanto os Ferrari se viam aflitos para passar o Porsche do surco Jo Bonnier. Por causa disso, Moss conseguiu um avanço de dez segundos antes dos Ferrari se livrarem do sueco e se aproximarem do britânico.

A corrida no Mónaco era exaustiva. Eram cem voltas no principado, e os pilotos mexiam na caixa de velocidades mais de 1500 vezes para trocar de marchas, e isso fazia cansar os pilotos. A sua concentração no final da prova não era a mesma do inicio, e o cansaço por vezes traía-os a eles batiam no muro, que não os perdoava. E para piorar as coisas, nessa tarde estava calor, e Moss tinha pedido aos mecânicos para que tirassem os painéis laterais do carro, para poder arrefecer. Que poderia fazer tal coisa agora? 

Na parte final da prova, a partir da volta 58, Moss, para além do cansaço natural, estava a lidar com um Ginther que se aproximava perigosamente. A potência dos Ferrari levava o seu melhor e pensavam que com o tempo, iriam levar a melhor.

Enganaram-se: sempre que eles se aproximavam, Mosse reagia, sendo mais veloz nas curvas, digamos assim. Ginther queria ganhar, e tentou a partir da volta 91 atacar decisivamente a liderança do britânico, mas este aguentou firme as investidas do americano, acabando por sair vencedor, pela terceira vez nas ruas no Principado e logo na primeira corrida do ano, nos novos regulamentos. Contrariando as expectativas, e deixando toda a gente agarrado à pista, quase sem respirar, Moss era o vencedor. 

Claro, o resto da temporada pertenceu aos carros de Maranello, mas quando as coisas pareciam mais duras, onde o estilo de pilotagem contava, Moss conseguia ser melhor, e provou isso no GP da Alemanha, no Nurburgring Nordchleife, com mais uma excelente condução. E tudo isto a caminho dos 32 anos, e com dez anos de Formula 1 pelas costas, num tempo onde um erro e era literalmente, a morte do artista. 

The End: Stirling Moss (1929-2020)

Stirling Moss, vencedor de 16 Grandes Prémios e um dos grandes nomes do automobilismo dos anos 50, morreu este domingo aos 90 anos de idade, na sua casa de Mayfair, em Londres. Era o último dos pilotos ainda vivos da primeira década da Formula 1, e estava doente desde há algum tempo, após uma grave infeção pulmonar em 2016, em Singapura, quando fazia um cruzeiro.

Filho de Alfred Moss, dentista e piloto nos anos 20 - também participou numa edição das 500 Milhas de Indianápolis, em 1924 - e irmão de Pat Moss, que fez carreira nos ralis, Stirling nasceu a 17 de setembro de 1929 em Londres. Começou a correr em 1948, pouco depois da II Guerra Mundial, correndo na classe 500, ao volante de um Cooper - foi um dos seus primeiros clientes - antes de experimentar diversos chassis ao longo dos 14 anos seguintes. Em 1951, estreou-se na Formula 1, no GP da Suíça, ao volante de um HWM oficial, onde terminou no oitavo posto. No ano seguinte, a bordo de um Sunbeam, foi segundo classificado no Rali de Monte Carlo e em 1953, guiando um Jaguar e tendo Peter Walker como co-piloto, foi também segundo classificado nas 24 Horas de Le Mans.

Durante esse mesmo tempo, andou em chassis da ERA, Connaught e Cooper, até em 1954 o seu pai lhe ter arranjado um Maserati 250F, onde conseguiu um terceiro lugar no GP da Bélgica. Foi o suficiente para arranjar um lugar na equipa oficial para o resto da época, especialmente após a morte do argentino Onofre Marimon, nos treinos para o GP da Alemanha, no Nordschleife. 

No ano seguinte, Moss foi para a Mercedes, correr ao lado de Juan Manuel Fangio. O argentino era seu primeiro piloto, e o britanico limitou-se a segui-lo na sua cauda, nas máquinas alemãs que dominavam os circuitos de Formula 1. Contudo, noutras competições, mostrava-se, como nas Mille Miglia desse ano, onde com Dennis Jenkinson como navegador, venceu a prova com larga vantagem sobre a concorrência. Em Le Mans, era co-piloto, partilhado a condução com Juan Manuel Fangio, mas foi testemunha do pior acidente da história do automobilismo, matando 80 espectadores nas bancadas da reta da meta. 

Poucas semanas depois, em Aintree, entrou em duelo com Fangio pela vitória no GP britânico, que levou a melhor depois de ter saído melhor na troca de pneus. Houve quem tivesse dito que o argentino o deixou ganhar, mas quer Fangio, quer Moss, negam terminantemente que o resultado tivesse sido combinado. Acabou em segundo lugar nesse ano, o primeiro dos seus quatro vice-campeonatos.

Em 1956, com a Mercedes a abandonar o campeonato, Fangio e Moss seguiram rumos diferentes. O argentino foi para a Ferrari, enquanto Moss foi para a Maserati - teve um desaguisado com Enzo Ferrari no inicio da sua carreira, e ele jurou que não iria guiar para ele - onde venceu no Mónaco, a primeira de três triunfos no Principado. Venceu também em Monza, mas perdeu o campeonato a favor de Fangio quando o seu compatriota Peter Collins cedeu o seu lugar ao argentino, batendo-o por um ponto.

Em 1957, Moss passou para a Vanwall, a primeira equipa britânica a tentar alcançar o título mundial, e ao lado de compatriotas seus como Tony Brooks, venceu três corridas e acabou na segunda posição pela terceira temporada seguida, longe de Fangio, que tinha alcançado o seu quinto título com a Maserati, culminado com um memorável triunfo na Alemanha, batendo Mike Hawthorn e Peter Collins, ambos a guiar Ferraris.

Moss começa o ano de 1958 em terras argentinas, ao volante de um pequeno Cooper de motor atrás. Os organizadores nem queriam acreditar quando o viram naquele bólido diferente, mas graças a uma estratégia inteligente - tinha menor consumo de gasolina e não trocou de pneus - conseguiu superar os Ferrari e Maserati da concorrência, dando à Cooper o seu primeiro triunfo na Formula 1 e o primeiro com motor atrás desde os anos 30 do século XX, com os Auto Union. Sem ninguém saber, ele tinha aberto uma nova era no automobilismo. 

Depois do "milagre" argentino, continuou a temporada ao serviço da Vanwall, venceu mais três corridas - Holanda, Portugal e Marrocos - num duelo com Mike Hawthorn. O piloto da Ferrari foi mais regular, pois apenas venceu em Reims, no GP de França, mas no final triunfou com um ponto de vantagem sobre o seu compatriota, para depois se retirar de cena. Algumas semanas antes, num gesto de cavalheirismo, Moss avisou os comissários de pista do circuito da Boavista, no Porto, de que Hawthorn tinha voltado à pista pelos seus próprios meios, revertendo a desclassificação que tinha sido dada. Isso foi suficiente para ser campeão do mundo...

A partir de 1959, Moss correu ao serviço da Rob Walker Racing, que inscrevia carros Cooper e Lotus. Herdeiro da fortuna da Johnny Walker, e piloto de automóveis na sua juventude, Rob Walker dedicava-se à gestão da sua equipa, e desde a vitória de ambos na Argentina, tornou-se numa referência, ajudando a tornar-se na mais bem sucedida equipa privada da Formula 1. Venceu em Monsanto e Monza, e foi terceiro classificado no campeonato, inercalando com duas corridas com um BRM inscrito pela British Racing Partnership, equipa fundada pelo seu pai.

Até então tinha tido a sua quota parte de acidentes, mas em 1960, nos treinos para o GP da Bélgica, Moss sofreu um acidente grave ao volante de um Lotus 18. Ficou algumas semanas hospitalizado, falhando boa parte da temporada e só voltando a competir na última parte da temporada, vencendo em Riverside, no GP dos Estados Unidos, depois de ter triunfado no Mónaco. 

A sua recuperação parece ter sido bem sucedida, porque logo no inicio de 1961, na primeira corrida do ano, e numa nova classe de motores, a de 1500cc, Moss fez aquilo que muitos consideram a sua melhor corrida da sua carreira. Aguentando os Ferrari no dificil traçado do Principado, o britânico fez uma condução de classe e depois de ter feito a pole-position, acabou por vencer com classe na frente de Richie Ginther e Phil Hill. Mais tarde, venceu também de forma imperial no Nurburgring Nordschleife, naquela que viria a ser a sua 16ª e última vitória na Formula 1. A sua última corrida foi em Watkins Glen, no GP dos Estados Unidos, onde desistiu ao fim de 58 voltas com problemas de motor.

No final desse ano, Moss e Walker entenderam que o futuro estava nas mãos de Jim Clark. Com os Lotus a melhorarem e Colin Chapman a dar o melhor para a sua equipa principal - estava a desenhar aquilo que viria a ser o modelo 25 e ele não queria dar mais do que o modelo 24 para os seus clientes - Walker tinha feito um acordo com Enzo Ferrari para lhe dar um dos seus chassis. Moss deixou o seu orgulho de lado e acedeu, parecendo que iria por fim guiar um dos carros de Maranello na sua longa carreira. Mas isso não aconteceu.

Em Goodwood, na segunda-feira de Páscoa, Moss guiava um Lotus 24 quando perdeu o controlo do seu carro e sofreu um forte acidente. Ficou em coma por algumas semanas, e quando voltou, Moss sentia que a sua força parecia ter esvaído. A caminho dos 33 anos, achou que era altura de pendurar de vez o capacete, precisamente no ano que poderia ter visto nas pistas a ascensão das equipas inglesas, onde depois da Cooper, BRM e Lotus os seguiriam e pilotos como Jim Clark e Graham Hill iriam carregar o bastão da competitividade britânica na categoria máxima do automobilismo.

Depois da sua carreira de piloto, tornou-se chefe de equipa e comentador de Grandes Prémios nos anos 70. Voltou a pegar no capacete em 1980 para correr de Audi nos Turismos britânicos, mas foi um regresso breve. A partir de então, decidiu ser Stirling Moss, à medida que os anos passavam e crescia a sua lenda. Continuava a guiar clássicos de forma competitiva até 2010, altura em que largou o volante, e era frequentador assíduo de concentrações como Goodwood, onde atraía multidões.

Foi-se o ser humano, ficou a lenda para a eternidade, como o último dos grandes pilotos da primeira década da Formula 1. Ars lunga. vita brevis, Stirling.