Há 30 anos, no final de 1994, a Formula 1 soube que iria aparecer mais uma equipa. Numa temporada onde iriam assistir ao desaparecimento de Larrousse e Lotus, e existiam duvidas sobre a continuidade de Pacific e Simtek, a equipa liderada por Guido Forti estava a correr contra a corrente. Mas existia uma boa razão atrás disso: era o projeto pessoal de Pedro Diniz, cuja família era das mais ricas do Brasil, e queria colocar um dos seus membros na categoria máxima do automobilismo. A aventura durou apenas uma temporada e meia, e agora, 30 anos depois, é uma história que vale a pena ser contada.
AS ORIGENS
A Forti é o resultado de uma parceria. Começa por ser o projeto de Guido Forti, um antigo piloto que se tornou em homem de negócios, que conheceu e fez amizade com Paolo Guerci, um engenheiro, e montaram a equipa em Alessandria, no norte de Itália. Registada como uma “Società a Responsabilità Limitata” (SRL), começou a correr nas Formulas inferiores, como a Formula Ford e a Formula 3, quer a italiana, quer a europeia. Os resultados forma quase imediatos, quando em 1977, Teo Fabi ganha a Formula Ford 2000, num chassis Osella. Quase uma década depois, torna-se numa das equipas dominantes da Formula 3, primeiro com Franco Forini, em 1985, depois com Enrico Bertaggia, em 1987, Emanuelle Naspetti, no ano a seguir, e Gianni Morbidelli, em 1989.
O domínio na Formula 3 italiana foi tal que Bertaggia ainda ganhou o GP do Mónaco e de Macau, ainda em 1988. Foi o suficiente para ter o impulso para subir, rumo à Formula 3000, o escalão imediatamente inferior à Formula 1. Com um chassis Dallara, os resultados foram nulos, antes de passar para um chassis Lola, ainda em 1988, com Bertaggia ao volante. As coisas melhoraram quando acolheram Morbidelli em 1989. Campeão na Formula 3 italiana, em 1990, foi para a Formula 3000, onde ganhou uma corrida e três pódios, conseguindo 20 pontos. No final do ano, Morbidelli acabou a correr na Formula 1, com muita da sua carreira a ser feita graças a Forti e Guerci.
No ano seguinte, a Forti dominou: com dois carros, um para Emanuelle Naspetti e outro para Fabrizio Giovinardi, ganharam quatro corridas, e Naspetti seria o campeão da competição, continuando em 1992, até meio da época, onde foi correr para a Formula 1 pela March. O seu substituto foi Andrea Montermini, que ganhou três corridas, dando o segundo lugar da classificação à Forti. Alessandro Zampedri foi o companheiro de equipa de ambos os pilotos, conseguindo cinco pontos no total.
Por esta altura, Forti conhece Abílio Diniz, um empresário brasileiro. Dono da cadeia de supermercados Pão de Açúcar, nessa altura, uma das mais importantes do Brasil, a família adorava automobilismo, com o próprio Abílio ter guiado – e ganho – as Mil Milhas Brasileiras, no Circuito de Interlagos. Em 1992, quando conhece Forti, a ideia é de colocar o seu filho, Pedro Diniz, então com 22 anos, no caminho da Formula 1. Começa ali o longo caminho até lá chegar.
NADA É FÁCIL, BEM PELO CONTRÁRIO
Mas as coisas não iriam ser fáceis. Em 1993, ele entra na equipa, ao lado do monegasco Olivier Beretta – curiosamente, familiar da marca de armas com o mesmo nome – e se ele ganha uma corrida, em Donington Park e consegue 20 pontos, já Diniz alcança... nenhum. Logo, no final da temporada, ele ficará mais uma temporada para aprender mais do ofício. Para 1994, ele alinha ao lado do japonês Hideki Noda, e se o brasileiro consegue um quarto lugar no Estoril, já Noda tem um terceiro lugar em Enna-Pergusa. No final, foram nove pontos e o japonês, mal acabou a temporada, foi participar nas três corridas finais da Formula 1 pela Larrousse.
Mas por essa altura, já pensava na Formula 1. No inicio da década, tinha visto o que Eddie Jordan tinha feito, quando pegou na sua equipa e a levou para a categoria máxima do automobilismo, com grande sucesso. A parceria com Diniz era proveitosa, e ainda por cima, tinha ainda outro potencial patrono para a equipa: o italo-brasileiro Carlo Gancia, que comprou a parte que pertencia a Guerci – que se manteve, como engenheiro. Ambos tinham um objetivo: treinar Diniz para ser um piloto de Formula 1.
O projeto continuou ao longo de 1994. O chassis estava a ser construído por Sergio Rinalnd, o diretor desportivo iria ser Cesare Fiorio, René Arnoux foi contratado para ser consultor e treinador para Diniz, e o pai conseguiu o apoio de imensas empresas, a mais importante era a Parmalat, a empresa italiana de lacticínios cuja distribuição no mercado brasileiro era assegurado pela Pão de Açucar. Em suma, o orçamento era totalmente garantido por eles.
No final, o orçamento ficou-se pelos... 17 milhões de dólares. Inferior a muitas das equipas, sim, mas eles não estavam preocupados: o acordo era de três temporadas, até ao final de 1997.
Contudo, Forti decidiu construir o seu próprio chassis, em vez de procurar o apoio de Dallara ou Lola. Em quase duas décadas, Forti nunca tinha feito isso e o resultado, é que o FG01... estava obsoleto à partida. Ou como alguém chamou desde logo: uma sucata.
Desenhado por Sérgio Rinland, com a ajuda de
Giacomo Caliri e
Giorgio Stirano, tinha como base o Fondmetal GR02 de 1992, desenhado por Rinland, e quando foi feito, descobriu-se que era 60 quilos mais pesado que a maioria. O motor, um Ford de oito cilindros, não era dos melhores, com menos 100 cavalos que a concorrência – e financiado pela Ford do Brasil – e pior: seria a única equipa sem caixa de velocidades semiautomática, que os faria quase um segundo mais lentos por volta! Logo, o carro iria ficar, inevitavelmente, nos últimos lugares da grelha. E viram isso logo nas primeiras voltas do “shakedown”, feito em Itália.
Anos depois, Stirano falou dos imensos trabalhos que tiveram ao longo da temporada para colocar o chassis competitivo.
“Simplesmente [o chassis] não era eficiente e tivemos de o reiniciar. Tirámos mais de 60 quilos da primeira versão para a última e em Silverstone [para o Grande Prémio da Grã-Bretanha de 1995] estávamos no limite mínimo de peso. Durante o ano também tivemos que re-homologar o nariz e os side pods, desenvolver a caixa de velocidades semiautomática, que valia cerca de meio segundo por volta, e redesenhar o monocoque, não em termos de forma, mas em termos de disposição das camadas."
O segundo piloto foi logo escolhido: acabou por ser Roberto Moreno, piloto experimentado com passagens por AGS, Coloni, Andrea Moda, Benetton e Jordan, entre outros. Contudo, a ideia inicial era colocar um segundo piloto mais competitivo – e se tivesse dinheiro, melhor – e entre algumas hipóteses, antigos pilotos da equipa como Naspetti e Montermini, mas os apoiadores brasileiros insistiram em Moreno. Mais tarde, Forti tentou meter Hideki Noda, mas ele não tinha a Super-Licença, apesar de ter corrido três provas pela Larrousse, na temporada anterior.
Apesar de todas estas contrariedades, a equipa testou muito na pré-temporada e Diniz conseguiu acumular experiência com o carro. Mas quando alinhou na primeira corrida do ano, o GP do Brasil, ele era... sete segundos mais lento que o poleman!
Mas sobre isso e o resto da primeira temporada, fala-se no próximo episódio.