![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhZL6c_fA2g3NaWrvUvzsxzWbinFCCOLYGyQ9zYyPqTzyzCzjrnHCYIDJx6RWgbHElW_ePAIDgyfPhOvSP5ugh6rZgYAE-o37qYWydBz8QbnEpvTj331g89ESPfYuPCHBbqcrSzv0DS02Q/s400/1973,+GP+Inglaterra,+Silverstone.jpg)
Hoje dei por mim a fazer este exercício de reflexão. O
Heath Ledger puxou-me para isto, mas quando estava a ver a sério o site do
Robert Murphy e as suas reflexões sobre o automobilismo, decidi fazer algo semelhante.
Primeiro que tudo: para aqueles que começaram a ver Formula 1 a partir de 1995, vocês estão safos: não tem que fazer este tipo de lista. Mas como eu tenho 31 anos de idade e 26 de Formula 1, já tenho a minha lista de nomes para lembrar. Ao todo são nove, mas acrescento mais dois, que não tem a ver com a Formula 1, mas que estão também imprimidos na minha memória.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg5NZ4GL6FpXyxg3DXadAznRpfw39v9sKwllha9uKbTzBUxFu5ctlVOLDSEYyK-RmJ-xJDdYHmgpswUKn8TJTjQu6gMzre4GscH9vSIUARmbRwTN66u3-C7Ehy5BcEQwWwt_VMs2Te79bg/s400/Belgica+82.bmp)
Começo com
Gilles Villeneuve. A minha imagem mais distante da Formula 1 é ver o grande Gilles a ir pelo ar, depois de tocar no March de
Jochen Mass, em Zolder. E de abrir Telejornais com as imagens do acidente, e da minha familia a falar sobre outros pilotos do passado, especialmente a minha mãe a falar sobre um "Pato"... na inocência dos meus cinco anos, e não ligando a caras, pensava que o Villeneuve era o Piquet! E o "Pato" era o
José Carlos Pace.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiIdkjbjImttqC63OvIVP_FiJPM3t45Dbv7coegOgBoqIqEETHzSEz299_QeAiz62kt4Rl1YzSk7idMBgs1TJ3OI4f19NoN1v7iimz9fFf3xppjf952FGwcU61cXMoF7fzGpNi4IELNACY/s400/Canad%C3%A1+82+2.bmp)
Semanas depois, estava a ver
Ricardo Palleti preso no seu carro, fatalmente ferido, e de repente, o carro pegou fogo. Mais uma vez, a minha familia a reviver tudo de novo. Mas eu não ligava nenhuma. Afinal, tinha 5 anos...
Quando tudo voltou a acontecer, passaram-se três anos. Estamos em 1985, e já era um apaixonado pela Formula 1, mas nem sabia que os pilotos podiam correr por outras provas. E quando soube que num espaço de três semanas, dois talentosos pilotos alemães, Manfred Winkelhock e Stefan Bellof, tinham morrido em provas de Sport-Protótipos, fiquei confuso, mas sabia quem era Stefan Bellof: muito talentoso e muito rápido. Achava que ele seria um bom rival de Ayrton Senna. E fiquei chocado com a noticia da sua morte, quando tentava uma ultrapassagem impossivel ao Jacky Ickx na zona do Eau Rouge.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgiezFArpR-h5mxAN8sCUpiI4WXEHX8uwCFJlxhGAWuwLioBNGpa9C6-w4xJlla8kXZLnaJrcMHhseNUv81ywH471L0BlJEPvdYC5Ib6c-l7RVPp6VO6Cnz9-eVzC1NezsRs3QyaqTBo5k/s400/Elio+de+Angelis.jpg)
Poucos meses mais tarde, em 1986, senti melhor esse impacto: as mortes do Dakar (
Thierry Sabine), a tragédia da Pena, no Rali de Portugal, e depois...
Hari Toivonnen e
Elio de Angelis. Em pouco mais de 15 dias, via dois talentosos pilotos a morrerem em circunstâncias difrentes. Então o De Angelis... tinha visto o acidente, mas sabia do seu desfecho. Dias depois, quando entrevistaram o Senna, que estava de passagem por Portugal, e comentou a morte de De Angelis, soube do que tinha acontecido.
Quanto ao Toivonnen: eu já começava a gostar de Ralies, mais pelo espectáculo do que a torcer por A ou B. Dele, lembro-me de duas coisas: de como ficou reduzido o seu carro, depois do despiste na volta à Corsega, e lembro do histerismo da imprensa depois, a saber o porque é que tudo isto estava a acontecer. Era a minha primeira experiência de como os meios de comunicação social disseminam o problema, mas não apresentam a solução...
Mas para mim, ficou-me como o meu primeiro "maldito Maio".
Os anos passam, e as coisas melhoram. Vês acidentes espectaculares, em que o piloto saia do carro a sacudir o pó e nada mais. continuavam a desafiar a morte, é certo, mas safavam-se sempre. Mesmo quando o Martin Donnely teve aquele acidente grave em Jerez, em que acabou a sua carreira competitiva, achei que as mortes na pista tinham ido de vez.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi7e9-CgOJzz-VBnlGdSAxfjMfE2AducgsGdasEgjIB7XFJdVOygc_icBL7t9gzgvA3EBb4ePQMeAI_TbgGnPkA9VFFYzLs1wyhf0JR2z2xYwI-p1A_JT6wJ0LHj_A21zSrxs1T5AUK6lU/s400/1994,+Roland+Ratzemberger,+Simtek,+Imola.jpg)
Julgava isso tudo, até ao dia
30 de Abril de 1994. Estava a ver os treinos na Eurosport, na casa de um vizinho meu. Não vi o momento do acidente do
Roland Ratzenberger, mas vi as repetições, e pensei que era grave, mas que iria sobreviver. Como estava a demorar, tive que sair de casa para resolver umas coisas, e quando voltei, estavam a anunciar a morte dele. Sofri um baque. Não pensei que voltaria a ver isso de novo. E fiquei com a memória de um piloto esforçado, que guiava um carro patrocinado pela MTV, e que teve um incrível azar. Fiquei deprimido.
No dia a seguir, fui visitar os meus avós, e sabia que pela viagem, iria perder o inicio da corrida. Quando lá cheguei, a minha avó disse-me que tinha havido um acidente. Quando vi os destroços, pensei: "é o Damon Hill". Tu pensas sempre que o teu ídolo nunca morre, não é? Mas morreu. E lembro-me de tudo o que fiz nesse dia. Tudo...
A morte do Senna trouxe-me um paradoxo: passei a ver a Formula 1 de uma maneira desapaixonada. Não torcia por ninguém, excepto por algumas vezes, com Villeneuve Jr., Montoya, e agora Hamilton. Mas essas paixões passavam, pois o primeiro era o unico. E vi o meu segundo "maldito Maio": Wendlinger, Lamy, Montermini, o histerismo da imprensa, a FIA a fazer medidas à pressa...
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjfMlQTgpBYSHSy7ijSpT7uSdeiK_z67iAlEuMt4ZSkMMBxLt_slVsEdnYM0t8f_SaKtV1E0fmXA4bAMe3k7vgcZqIBGCrA13EMB9gzicLITLGv_P8fY_WfKj1Gj3FPUXRo4APgLISkfGQ/s400/Moore+1.jpg)
A minha última história ocorreu na
Noite das Bruxas de 1999. Estava a ver no Eurosport a última prova do campeonato CART, em directo, no ultra-veloz oval de Fontana. Enquanto
Dario Franchitti e
Juan Pablo Montoya disputavam o título, via
Greg Moore perder o controlo do seu carro e bater forte no muro. Quando o carro parou, sabia que ele estava morto. Sentia-o. Nem era preciso saber se mexia ou não. Eu já sabia, muito antes do médico confirmar.
E o resto daquela noite foi surreal: fui sair, ter com a minha namorada de então, e contei o que se tinha passado. E ela lá tentou animar-me no resto da noite, mas não: sentia uma "profunda, apagada e vil tristeza" (Camões)
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhNT4UXR-lRV9E-ZQwkWbOt53TzfvKq5zA7pH3BesxLveVxL7NkCUW2JPglWGZm1OMgtdRHZ3qKqik_bJGcdHU2j_LcTSV9CoDYhkCWPOMzF9fED3yygO8Bz-nDNcZmCmm0YVj0ZyImZ-k/s400/Kubica+07+4.jpg)
Vocês, os mais novos, que nunca viram mortes em directo, desejo que continuem assim. Mas quando me recordo do impacto dos acidentes do
Alex Zanardi, em 2001, no Lauritzring, e do
Robert Kubica, o ano passado, em Montreal, pergunto-me:
como é que o público em geral reagiria de novo a uma morte na Formula 1? Lembro-me como foi em 1986 e 1994...
E ainda me lembro de uma coisa: estava eu a estagiar na RTP, em 2006, quando chega a noticia da morte de Henri Magne, ex-navegador do Carlos Sousa, no Rali de Marrocos. Mesmo jornalistas tarimbados ficaram espantado com tão trágico destino. E falamos de um navegador...
Em suma: sou novo, mas já tenho as minhas cicatrizes, e algumas delas foram profundas. Hoje em dia, a unica coisa que posso fazer é homenageá-los e contar a história das suas vidas curtas e intensas. E torcer para que mortes destas em pista nunca mais voltem a acontecer.
Já agora, para acabar: tentem ler isto com uma banda sonora como fundo. Eu escrevi isto a ouvir
esta canção. Mas também poderia ter escrito a ouvir
esta canção ou
esta. A escolha é vossa, claro. Mas fiz isto como exercício de recordação, espero que façam o vosso.