Mas quem assistia a isto na Europa, antes do futebol, havia a Formula 1. Nesse sábado, havia o GP dos Países Baixos, no circuito de Zandvoort, a sexta prova do calendário. Ali, entre a estreia de um novo piloto na Ferrari, Clay Regazzoni, outro novo piloto na Tyrrell, Francois Cevért, e outro novo piloto na McLaren, Peter Gethin, e o regresso de Dan Gurney, todos a entrar numa equipa que estava em rescaldo da morte abrupta do seu fundador, Bruce McLaren, no meio da grelha via-se um solitário De Tomaso, conduzido por um rico herdeiro apaixonado pelo automobilismo, e liderado por um dos seus melhores amigos, que tinha uma paixão assolapada pelas corridas. Tão grande quanto aquela que tinha à sua mulher.
Nascido a 27 de maio de 1942, Piers Courage era o herdeiro da uma marca de cervejas na Escócia, a Courage fundada por um antepassado seu, John Courage, em 1787. Seu pai, Robert, era, para além do diretor da companhia, o "Lord of the Manor of Edgcote", basicamente uma propriedade rural em Northampton, no centro da Grã-Bretanha. Nascera e crescera no Edgecote Hall, uma mansão construída no século XVIII e foi educado em Eton, o colégio da elite britânica.
Courage começou a correr num Lotus 7, antes de, em 1964, começar a correr na Formula 3. No ano a seguir, a bordo de um Brabham, estableceu uma aliança com um rapaz, então com 23 anos, de seu nome Frank Williams. Tinha tentado a sua sorte como piloto, mas descobriu que era muito melhor como organizador. Depois de uma temporada interessante na Formula 2, em 1966, num Lotus 41, no ano seguinte partiu para a Reg Parnell, na Formula 1, onde a sua fama de piloto rápido, mas propenso a acidentes, começou a surgir. Primeiro guiando num BRM, conseguiu os seus primeiros pontos em 1968, com um quarto lugar como melhor resultado.
No ano a seguir, o seu amigo Frank Williams apareceu e decidiu arranjar um Brabham BT26A. Com ambos, piloto e carro, fundou a Frank Williams Racing Cars, e com isso encarou de frente toda uma fauna automobilística. E com enorme sucesso: dois pódios, dois segundos lugares, em Monte Carlo e Watkins Glen, e mais duas corridas nos pontos deram-lhe 16 pontos e o oitavo lugar do campeonato, e a ideia de que ele poderia ser um dos pilotos mais prometedores deram as luzes da ribalta.
No final de 1969, Frank Williams aceitou a proposta de Alejandro de Tomaso, construtor italo-argentino que queria construir um chassis de Formula 1. O projeto, de seu nome 505/38, era desenhado pelo jovem projetista Gianpaolo Dallara, totalmente novo, mas tinha grandes defeitos: era ineficaz e obeso. E claro, muito pouco competitivo. Uma das coisas que fizeram para diminuir o peso foi um chassis de magnésio, um material leve, mas inflamável. Um terceiro lugar no International Race of Champions de 1970 foi o melhor resultado, porque no Mónaco, problemas do seu carro fizeram que acabasse a 12 voltas do vencedor, não se classificando.
Em Zandvoort, nos Países Baixos, as coisas, aparentemente, iam melhor. Tinha conseguido o nono posto na grelha, e nas primeiras voltas, ele subia posições atrás de posições, lutando pelos pontos com gente como o Matra de Jean-Pierre Beltoise, o Lotus de John Miles ou o McLaren de Peter Gethin. Contudo, na volta 22, Courage batera um dos seus pneus contra a berma e a suspensão ficara afetada. Depois, nova passagem pela berma causou mais stress numa suspensão já afetada e esta quebrou-se. Batendo contra as redes de proteção e um muro de areia, o carro incendiou-se, com Courage lá dentro. O fogo foi intenso, queimando os arbustos à volta, tudo isto enquanto a corrida prosseguia, com bandeiras amarelas a serem agitadas.
Quando os bombeiros retiraram do carro, Courage estava morto. Tinha 28 anos e deixara mulher e dois filhos. Tempos depois, disse-se que ele poderia ter muito provavelmente morrido no impacto, com um dos pneus da frente a serem arrancados e a atingirem em cheio a cabeça do piloto. Foi enterrado no jazigo de família em Brentwood, no Essex britânico.
Courage era bom amigo de Jochen Rindt, e algures em 1969, no GP de França, ele emprestara o seu capacete ao austríaco. No final da corrida, depois de o ter vencido com o seu Lotus 72 - a primeira do chassis - aparentemente, dissera à sua mulher Nina que, se fosse campeão do mundo, penduraria o capacete. Nunca se soube se era verdade ou se era lenda, mas ficou por muito tempo.
Outro que ficou afetado com a sua morte abrupta fora o próprio Frank Williams. Ficou deprimido e a sua atitude futura em relação aos pilotos, o seu desprendimento com eles, tinha a ver com o que acontecera com Courage.
Três anos depois, numa coincidência macabra, outro piloto britânico, Roger Williamson, morreria na mesma pista, alguns metros do local onde Courage tinha perecido. E pior, foi perante o mundo inteiro, filmado em direto pela televisão, ao vivo e a cores.