quarta-feira, 18 de junho de 2025

E a seguir, Robert Kubica?


O que aconteceu no domingo, em Le Mans, foi o culminar de uma longa jornada de inferno, que cortou, se calhar os sonhos de grandeza de um piloto como Robert Kubica. Em fevereiro de 2011, quando treinava nos testes de pré-temporada da Formula 1, ao serviço da Lotus-Renault, tinha assinado um pré-acordo para correr na Ferrari a partir de 2012. De uma certa forma, parecia que iria ser o culminar dos seus sonhos, que começaram bem cedo, no inicio da adolescência, quando foi paara Itália e correr em kart, com o propósito de alcançar a Formula 1. Sonho esse que conseguiu em 2006, na BMW Sauber, quando substituiu Jacques Villeneuve, e conseguiu um terceiro lugar na sua terceira corrida da carreira, em Monza. 

Mas depois, foi participar num rali em Itália, a bordo de um Skoda Fabia S2000, e num domingo de manhã, o pesadelo começava. Primeiro, a sobrevivência, com um braço parcialmente decepado pelo impacto do guard-rail cockpit dentro - e daquilo que aconteceu anos depois com outros pilotos, foi o sortudo... - e depois de recuperar a saúde, começou a longa reabilitação para ter o seu braço direito funcional, especialmente, com todos aqueles que já tinham dado a sua carreira como encerrada, pelo menos na Formula 1.

O mais espantoso é que quando recuperou, ano e meio depois, foi para a mesma modalidade que quase o matou: os ralis. Abriu uma carreira bem interessante nessa modalidade, que lhe deu o título na WRC2 em 2015, e muitos resultados interessantes na classe principal. E depois, mais espantoso ainda, decidiu regressar à Formula 1, para ser, em 2018, piloto oficial de uma equipa como a Williams, onde voltou a pontuar!

Sim, é verdade, não foi um regresso pela porta triunfal. Não foi uma Williams no auge - bem pelo contrário - mas o fato de ter corrido quase duas dezenas de corridas - ainda andou duas corridas pela Sauber Alfa Romeo, em 2021 - de uma certa forma o fez as pazes com aquela parte do automobilismo. Simbolicamente, regressou e cumpriu essa parte. 

"Aos 35 anos, depois de correr em muitas categorias, tudo se tornava um pouco normal”, destacou na conferência de imprensa depois da prova. "Mas Le Mans devolveu-me aquela sensação de desconhecido, aquele frio na barriga de enfrentar um desafio novo. Fez-me lembrar os primeiros dias no karting, em que tudo era uma primeira vez. Adorei essa sensação e apaixonei-me por esta corrida."


Quando Kubica foi para a Endurance, começou pela classe LMP2, e adaptou-se muito bem, ao ponto de ter ganho o título mundial nessa classe em 2022, e até ganhou vitórias à classe em Le Mans. Em 2024, chegou o seu sonho: correr pela Ferrari, que tinha regressado à Endurance, depois de meio século de ausência. O regresso não foi pela equipa oficial, mas pela AF Corse, que tinha um carro amarelo, para se diferenciar dos oficiais, vermelhos, com os números 50 e 51. O carro dele era o 83. 

O mais espantoso - pelo menos na edição deste ano de Le Mans - é que Kubica não se poupou dentro do cockpit do seu Ferrari amarelo, Ele, agora com 40 anos, e apesar daquele braço direito todo maltratado, por causa do seu acidente em 2011, no rali Ronda di Andora, andou dentro daquele "cockpit" em 43 por cento do tempo, e na maioria das quais sem conseguir beber água no carro. Não é muito recomendável... mas tiremos o chapéu por isso.

E na tarde deste domingo, aos 40 anos - nasceu a 7 de dezembro de 1984 - Kubica torna-se no primeiro polaco a ganhar em La Sarthe, ao lado do chinês Yifei Ye, também o primeiro chinês a ganhar em Le Mans, e Phil Hanson. Para melhorar as coisas, foi no carro numero 83, da AF Corse, um carro amarelo, para se distinguir dos carros vermelhos, oficiais. Ou seja, os paralelismos com os vencedores de 1965, Masten Gregory e Jochen Rindt, também num carro de uma equipa privada, num carro antigo, são evidentes. E aqui, em 2025, não tempo um piloto fantasma!


E a seguir, para Robert Kubica? Provavelmente... encerrará a carreira na Endurance. Pelo menos, foi isso que disse no final da corrida, perante os jornalistas. E parece que deseja regressar aos ralis. 

"Em 2021, disse ao então meu colega Louis [Deletraz] que, se ganhasse [as 24 Horas de Le Mans], nunca mais voltaria. E há dois dias disse o mesmo a um amigo da Ferrari. Ele respondeu que isso nunca iria acontecer. Mas acrescentei que, se ganhasse, voltaria aos ralis. Portanto, normalmente cumpro o que prometo. Veremos o que o futuro me reserva."

A primeira coisa que se tem de saber é se estará presente em Interlagos, para as Seis Horas, dentro de um mês. Se ficar a guiar o Ferrari da AF Corse até ao final da temporada, então, estará a cumprir o contrato. E depois, se em 2026 decidir regressar às estradas. é saber se arranja um Rally2 para ver se correr num campeonato local ou mundial. Porque, como sabem, os regulamentos irão mudar imenso. E ver se continua a ter aquela vontade de competir e ganhar. Nem que seja para ajustar contas. 

Claro, todos nós, que acompanhamos a sua carreira, pensaremos sempre naquele "e se". Mas acho que, como ele disse, não deixou de ser feliz onde correu, e provou ao mundo que mesmo não seguindo a trajetória habitual, voltou a ser feliz no desporto que mais ama. E sinceramente, não sei se, caso tivesse tido uma carreira "normal", estaria naquele pódio em Le Mans.

Sem comentários: