terça-feira, 14 de abril de 2020

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No final de 1961, Stirling Moss tinha 32 anos e uma década de Formula 1, um feito numa competição onde as chances de ter um acidente grave e de morrer eram muito altas. Nem o próprio Moss tinha escapado a um acidente grande, quando nos treinos do GP da Bélgica de 1960, se despistou com o seu Lotus e acabou no hospital com fraturas e esteve mês e meio em convalescença, recuperando a tempo de vencer uma corrida em Riverside e outra no Mónaco, contra uma armada Ferrari que tinha tudo para ganhar, mas não conseguiu nas ruas apertadas do Principado.

Moss foi o melhor "não-Ferrari" nessa temporada, e foi bem melhor do que os carros oficiais da Lotus, que já tinham um piloto em potencial na figura do escocês Jim Clark. E ele sabia que poderia ser o seu rival, se quisesse ter uma chance para alcançar um título que rondava desde 1955, mas que nunca tinha alcançado.

A parceria com Rob Walker era perfeita, mas sabia que a Lotus, que tinha dado chassis desde 1960, com o modelo 18, e depois com o 21, não iria dar o 25, que iria se tornar no carro oficial, e seria o primeiro monocoque da marca. Para clientes como Walker, haveria o 24, que seria como o 25, mas sem o monocoque. E eles sabiam que teriam uma desvantagem à partida. 

Assim sendo, Walker falou com Enzo Ferrari, que expôs o problema e queria saber se poderia ceder um dos seus chassis 156 vitoriosos no ano anterior. O Commendatore disse sim, e Moss, que uma década antes tinha-se zangado com ele por causa de um contrato que não foi cumprido como o britânico queria, e jurou que não correria com os seus carros, aceitou a ideia. Mas até lá chegar, acabou por usar um modelo 24 para as primeiras corridas do ano, uma série de eventos no Reino Unido, pois nesse ano, a Formula 1 começava em paragens holandesas, em maio.

Na segunda-feira de Páscoa, em Goodwood, Moss corria com esse Lotus 24 inscrito pela British Racing Partnership, na Glover Trophy. Tinha feito a pole-position e a volta mais rápida, mas na oitava volta, um despiste o feriu gravemente. Tinha ficado preso no seu carro e desfalecido, a sua retirada do carro demorou algum tempo. Quando o conseguiram levar para o hospital, tinha ferimentos internos, o seu lado esquerdo paralisado e estava em coma. Apenas acordou um mês ais tarde, e teve uma lenta recuperação. No final do ano, já recuperado, fez um teste, num Lotus 19, e depois de ter feito algumas voltas um pouco abaixo do recorde da pista, sentiu que não tinha os reflexos de outrora e decidiu pendurar o capacete de vez.

Pelo menos, é essa a sua versão oficial. Muitos acreditam que ele, aos 33 anos de idade, poderá ter pensado duas coisas: que a sua sorte tinha chegado ao fim, e era melhor ficar vivo para contar a história, e já havia sangue novo no horizonte. Enquanto esteve convalescente, Clark mostrou todo o seu potencial na Lotus e tinha armado uma rivalidade com outro piloto, curiosamente da mesma idade que Moss: Graham Hill, piloto da BRM, e que tinha acabado por ser campeão do mundo. E como queria ser campeão do mundo, e sabia qual era o melhor chassis do marcado, ser cliente do melhor chassis do mercado reduziria imenso a sua chance de ganhar um título. Assim, pendurou o capacete e se tornou bom a ser... ele mesmo. E a sua história foi contada nas gerações seguintes por parte de multidões que nunca o viram correr, mas o admiram pelos seus feitos.

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