quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

Roborace e as corridas sem piloto

Já se sabe desde há algum tempo que os engenheiros estão a trabalhar na condução autónoma. O potencial é enorme - reduzir os acidentes de viação em 90 por cento e o fim dos engarrafamentos tal como conhecemos hoje em dia - e há empresas que estão a trabalhar muito nesse sentido. Desde marcas de carros como a Tesla, até... empresas de tecnologia como a Google e a Apple, com maiores ou menores resultados. Os testes estão a acontecer em força e não fiquemos admirados se em 2020 comecemos a ver os primeiros sistemas a serem comercializados e usados "en masse".

Mas a tecnologia foi um pouco mais além: a competição automobilística. Desde meados de 2015 que sabemos que a Formula E está a desenvolver o conceito de "Roborace". Eles anunciaram que iriam construir uma competição com carros autónomos, sem piloto, do qual iriam fazer correr na duração de um Grande Prémio. A primeira grande demonstração aconteceu este final de semana, em Buenos Aires, com dois carros... e não correu lá muito bem, porque um dos carros bateu e o outro acabou por vencer. Mas evitaram um cão que passeava na pista...

"Um dos carros estava a realizar uma manobra, quando ele foi realmente acelerou numa esquina bastante acentuada e tocou na barreira de proteção", disse à BBC Justin Cooke, o chefe de marketing da Roborace.

Apesar de tudo, ele considerou que a demonstração foi positiva: "É realmente fantástico para nós, porque quanto mais vemos esses momentos, mais somos capazes de aprender e entender o que era o pensamento por trás do computador e seus dados. O carro foi danificado, com certeza, mas pode ser reparado. E a beleza é que nenhum motorista sairia magoado porque... eles não estão lá", concluiu.

A coisa interessante sobre estes carros é que, ao contrário do que passa quando temos carros comandados por controle remoto, eles aqui usam dados de computador. Inteligência artificial, e o controlo por uma espécie de radar, para ver onde andam os carros à sua frente, e sensores para evitar colisões caso o carro à frente seja sujeito a uma travagem brusca. A organização da Roborace disse que existirão mais demonstrações até ao final da temporada, antes de no final deste ano, termos pelo menos dez carros a participar na primeira temporada desta competição.

Agora que vemos que a competição autónoma está a acontecer, queremos saber se é isto que queremos. Não digo que isto seja o futuro do automobilismo - não é, digo desde já - mas sim, um futuro para o automobilismo. Quero acreditar que isto vai ser um desses futuros, da mesma forma que a automação vai ser um futuro para o trabalho nos seres humanos, e que nem todos os trabalhos serão ocupados por autómatos ou androides, daqui a vinte anos. Daquilo que li e aprendi da história, e especialmente da história do automobilismo, uma competição como a Roborace é importante. Mas não vejo a Formula 1, ou a Endurance - nem mesmo a Formula E! - ser subsistida por uma competição sem pilotos. 

Aliás, eu considero que todos têm espaço, porque queremos ver pilotos a guiar, e é disso do qual vejo muita a gente a queixar-se hoje em dia. Os críticos podem falar de disparates como o ruído do motor, mas tem coisas que falam com razão, como o excesso de eletrónica que tirou ao piloto a sua capacidade de pilotar. Há muitas coisas que os pilotos têm à mão, como controle de tração, direção assistida, DRS, KERS, asas móveis... parece que facilitaram as coisas. Eles desejam que os pilotos lidem com "cavalos selvagens", sem auxiliares eletrónicos, apenas com mecânica e alguma aerodinâmica. Em suma, o seu maior desejo é que estes pilotos lidassem para sempre com máquinas construídas em 1976, apenas com os seus chassis feitos de fibra de carbono.

Mas vamos ver a coisa de outra forma: gostaríamos de ver essas máquinas a se guiarem sozinhas? Pensem bem: uma McLaren sem Fernando Alonso ao volante? Uma Ferrari sem Sebastian Vettel ou Kimi Raikkonen? Tirando a Ferrari e a McLaren (em menor grau), torcemos por pilotos, não tanto por equipas. E vamos ser honestos, sem os pilotos, o automobilismo perde metade da graça.

Não sou daqueles que dizem que vai ser uma curiosidade e vai desaparecer no futuro. Vi muitos "profetas da desgraça" e predizerem que coisas como o automóvel ou o avião não teriam futuro, e deu no que deu. Uma competição como a RoboRace não é uma ameaça aos pilotos, porque já se demonstrou ao longo da História que há lugar para toda a gente. Poderá haver uma competição destas, mas vai ser mais uma que alinhará ao lado das 24 Horas de Le Mans, com pilotos humanos a guiar máquinas potentes. Uma RoboRace é útil para a tecnologia que nos guiará, um dia, para o espaço sideral em enormes naves especiais, para escavar minas em asteróides, sem a presença humana, por exemplo. E isso é importante.

Sem comentários: