quarta-feira, 17 de julho de 2024

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A história começa a se contar desta maneira: um dia, algures no final dos anos 80. A BBC decide contratar um jovem jornalista para um programa sobre automóveis, e imediatamente dão se bem pelo seu estilo convencido, juvenil e algo arrogante. Tem quase 30 anos e cedo torna-se alguém com destaque. Chama-se Jeremy Clarkson, e torna-se um dos apresentadores de um programa que existe desde 1977: Top Gear. Uma das pessoas com quem se dá muito bem é Andy Wilman, produtor e, a certa altura da vida... colega de turma de Clarkson. E também de um rapaz que depois se tornou desenhador de automóveis na Formula 1 chamado Adrian Newey

Em 2001, Wilman perguntou à BBC se não poderia redesenhar o Top Gear. Eles ouviram o que tinha para afirmar e concordaram. No ano seguinte, ele e Clarkson apareceram com um novo programa, num velho nome. Foram buscar um jovem, então com 32 anos, chamado Richard Hammond, que tinha jeito para a coisa e disseram que ele complementaria Clarkson. No ano seguinte, substituíram outro apresentador, Jason Dawe, e foram buscar outro jornalista que tinha acabado de fazer 40 anos: James May.

Ele não era virgem no Top Gear. Tinha estado na versão antiga, em 1999, apresentando alguns episódios. Anos antes, em 1992, quando se aborrecia a escrever no anuário da Autocar, deciciu colocar uma mensagem à vista de todos. "So you think it's really good, yeah? You should try making the bloody thing up; it's a real pain in the arse." (Tradução: achas que isto é bom, hein? Tenta montar esta treta, é uma chatice do cara***) 

Claro, acabou por ser dispensado, depois de descobrirem essa brincadeira. 

Cedo, os três causaram química. Um pretensioso pomposo, acompanhado por um interessado pela mecânica e um "book worm", e alguém que se tem a sensação que está a segui-los e não muito mais. Clarkson cedo deu nomes aos outros dois: "Capitão Lento" para May, "Hamster" para Hammond. E os outros não ficaram para trás: "Orangotango" e "Chimpanzé Gigantesco" eram os mimos mais simpáticos que os outros deram a Clarkson. 

E com isto, criaram um dos melhores programas sobre automóveis da história. Ao ponto de serem entrevistados pelo programa "60 Minutos", da CBS, o que é alguma coisa na América, que raramente faz algo vindo do estrangeiro. 

Mas em 2015, Clarkson passou dos carretos e agrediu um membro da equipa de filmagens, o que deu à BBC pretexto para o despedir. Hammond e May (e Wilman) seguiram-no, em solidariedade com ele. Foram para a Amazon Prime e decidiram criar "The Grand Tour". Continuaram com o programa até 2018, altura em que relegaram a fazer especiais na estrada, indo a sítios desde a Mauritânia até à Polónia, da mesma forma que no Top Gear foram a lugares nos quatro cantos do mundo. Memoráveis foram as passagens pelo leste de África, pela América do Sul, pela Índia (até o então primeiro-ministro, David Cameron, fez um "cameo" à porta de Downing Street, onde falou 'não façam asneira!')

Contudo, tudo que é bom... acaba.  

O evento foi no passado dia 11, mas agora é sabido. A produtora W. Chump and Sons, que produziu o programa The Grand Tour, dissolveu-se depois de 21 anos de bons serviços.  E claro, é o final de uma era. 

Mas pensando bem, é melhor que aconteça agora: Clarkson tem 64 anos, May 61 e Hammond, o mais novo de todos, está a caminho dos 55. O tempo passa por todos, sabemos que foi uma excelente viagem e eles, de uma certa forma, moldaram uma maneira de ver os automóveis: mais do que testá-los e afirmar como são e se recomendam comprá-los (ou não), podes usá-los como pretexto para fazer as melhores viagens do mundo.

Ainda faltará um programa para ser apresentado, onde foram ao Zimbabwe, mas quando for para o ar, mais tarde no ano, será com um sentimento de nostalgia nos nossos pensamentos.   

Estes "três estarolas" deram, para muitos, as melhores risadas à frente de uma televisão, e fizeram que gostássemos de automóveis. E, de uma certa maneira, agora que partem para as suas vidas - Clarkson tem uma quinta, Hammond uma oficina de restauro de automóveis, May anda por aí a ser "o homem deles" - de uma certa maneira, e volto a afirmar, é o final de uma era. 

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