terça-feira, 29 de dezembro de 2015

A história de um mau perder... muito caro

Por estes dias de Natal e Ano Novo (enquanto não chega o Dakar...) seria ótimo falar sobre historietas que andam por aqui de vez em quando nessa Internet fora. Esta que apresento hoje é boa porque foi dada por um amigo meu, o António, e também porque fala da magnifica história de um carro que esteve no fundo de um lago entre a Suiça e a Itália por mais de 70 anos, e agora está num museu da California, depois deste ter sido recuperado, há alguns anos. E a história envolve uma aposta e um mau perder muito caro.

Recuemos 81 anos, até 1934. René Dreyfuss é um dos melhores pilotos de então em França. Nascido em 1905 em Nice, Dreyfuss vence na primeira corrida em que entra, em 1924, e seis anos depois, vence o GP do Mónaco, então apenas na sua segunda edição, a bordo de um Bugatti. Nos anos seguintes, torna-se num dos melhores pilotos franceses e compete contra Tazio Nuvolari, Rudolf Caracciola ou Hans Stuck, mas em carros algo datados, quando aparecem os Flechas de Prata. Apesar disso, em 1935, ele consegue um segundo lugar no GP de Itália, a bordo de um Alfa Romeo da Scuderia Ferrari.

Contudo, algum tempo antes, Dreyfuss era dono de um Bugatti Type 22 Brescia Roadster. E um dia, algures em 1934, estava a jogar cartas com o suíço Adalbert Bodé, um playboy de fama internacional. Ele apostou o seu carro contra ele... e perdeu. Contudo, Bodé não gozou muito o carro. Mal chegou à fronteira, foi parado pela Alfândega e sem dinheiro no bolso para pagar as taxas, ele foi apreendido pela policia local. Mas sem saber o que poderiam fazer, pois aparentemente aquele carro parecia não ser muito útil, decidiram atirar o carro para o fundo do Lago Maggiore, onde repousou a cerca de 30 metros de profundidade.

Ninguém mais quis saber desse carro nos próximos 30 anos até que em 1967, um mergulhador local, Ugo Pillon, ouviu falar dessa história e foi à procura. Facilmente encontrou esse carro, mas este ficou no fundo do lago nos 40 anos seguintes, onde os mergulhadores locais iam lá numa peregrinação curiosa.

Contudo, em 2009, um grupo de mergulhadores decidiu que era hora de o tirar do fundo do lago. A razão era triste: um dos seus membros, Damiano Tamagni, tinha sido brutalmente espancado por um grupo de jovens e acabaria por morrer. Para juntar dinheiro no sentido de criar uma fundação para a prevenção da violência juvenil, decidiu-se que retirar o Bugatti do lago e o colocar em leilão seria uma excelente ideia.

No final, demorou nove meses e mais de trinta voluntários, mas a 12 de julho de 2009, o carro foi retirado do fundo do lago. Apesar do seu aspecto ferrugento, havia detalhes que impressionavam. Exemplo? Ainda havia ar nos dois pneus que tinham sobrado! Feito o resgate, decidiu-se que seria vendido tal qual como estava, num leilão da Bonhams, no ano seguinte. E o resultado foi bem impressionante: 350 mil dólares. Por um carro com 80 anos, 70 dos quais no fundo de um lago.

O carro está agora num museu na California, e exposto tal qual foi tirado do fundo do lago, pois seria mais interessante vê-lo assim.

Quanto a Dreyfuss, o piloto? A sua carreira também foi interessante. Correu pela Delhaye nos anos 30, e não foi muito mais longe por ser judeu (só por isso não poderia andar nos Flechas de Prata alemães, por exemplo). Contudo, em 1940, o governo francês lhe pediu para competir nas 500 Milhas de Indianápolis, a bordo de um Maserati, ao mesmo tempo que a sua terra era invadida pelos nazis. A 30 de maio, quando os panzers estavam em Dunquerque a assediar a Força Expedicionária Britânica, Dreyfuss levava o seu carro ao décimo posto final... apesar de não saber falar inglês para comunicar com os mecânicos.

Após essa corrida, radicou-se nos Estados Unidos, onde ajudou o exército americano, abriu um restaurante em Nova Iorque, e continuou a correr até 1955, aos 50 anos. Tornou-se cidadão americano e acabaria por morrer a 16 de agosto de 1993, aos 88 anos.

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