domingo, 8 de agosto de 2010

Grand Prix (numero 48 - Gran Prémio de España, V)

19 de Abril de 1970. Jarama, dia de corrida.

Era um tipico dia de Primavera, com nuvens ao horizonte, dispersas sobre a meseta ibérica, mas que não eram ameaça para ninguém. Os carros estavam alinhados na pré-grelha de partida, com os mecânicos à volta para ver os últimos pormenores antes da partida. Os ânimos estavam altos, muitos dos pilotos que estavam ali mostravam-se sorridentes antes da corrida, vendo que o autódromo se enchera para os ver.

Alexandre de Monfote conversava com Bob Turner, definitivamente o velhote do pelotão, com o seu bigode reluzente e o seu BRM agora pintado de creme, o seu novo patrocinador para esta e as temporadas seguintes. Estava sempre a tentar pegar o novato, que levava as piadas com bom humor, esperando que os minutos passasem logo para se livrar de um lendário, mas chato, oponente. Pete Aaron observava deliciado a cena, enquanto que Pam dizia:

- Até fico admirado por ele não se ter pegado com o loirinho.

O "loirinho" de que Pam falava era Antti Kalhola, que estava calado e sorridente, a observar tudo com algum nervosismo. Mal falava com os outros, talvez por falar pouco inglês ou algo parecido, e quando teve a oportunidade, foi para o seu carro para ouvir o que Henry Temple tinha para dizer, ele que falava um bom finlandês para ele. Era obviamente a sua estreia oficial, mas também o era para Monforte e estava bem menos nervoso.

Don Arturo tinha dado as habituais instruções sobre o estado da pista e sobre os cuidados que deveriam ter nas primeiras voltas, normalmente as mais criticas. O circuito tinha instalado durante o Inverno barreiras duplas em algumas partes da pista, especialmente as curvas mais fechadas, e esta seria a primera grande prova após as remodelações. Esperava-se que tudo corresse bem nesta tarde e que a no dia seguinte os jornais falassem dela apenas com a foto do vencedor e não com a foto de um carro qualquer acidentado. Era essa a sua esperança.

Quando faltava um minuto, as máquinas começaram a funcionar e a grelha foi evacuada. Os carros avançaram alguns metros, para a linha branca, sendo guiados por Don Arturo, que tinha a bandeira espanhola, com a águia imperial por cima do escudo dos Borbón, debaixo do braço. Este colocou-se de lado e ergueu a bandeira, enquanto olhava pela última vez os três carros que tinha à sua frente: o Matra de Beaufort, o Jordan de Reinhardt e o Apollo de O'Hara. Todos prontos, os motores rugiam ao máximo.

Instantes depois, a bandeira baixava e todos arrancavam a grande velocidade para a primeira curva. Após a Fangio, Pierre de Beaufort conseguira manter a liderança, com O'Hara a superar Reinhardt e atrás dele estavam o Ferrari de Van Diemen, o Apollo de Solana e o BRM de Gustafsson, que de repente começou a galgar lugares desde a partida. Suspeitava-se que ele tinha feito falsa partida, mas nisso não havia certezas. O que se via era que estava à frente do seu compamheiro, Bob Turner! Passada a primeira volta, sem incidentes de maior, Beaufort continuava na liderança, com Carpentier a tentar passar Gustafsson no final da recta, e a conseguir. Este depois ficara preso atrás do Ferrari de Van Diemen, que o tentava passar, mas que o belga não deixara, dpeois de ter sido surpreendido por Solana, que o ultrapassara.

Jarama tem muitas curvas lentas, feitas em segunda velocidade, e uma delas, a Le Mans, tinha uma saída a subir, rumo a outra curva lenta. Normalmente, aquele era um excelente ponto de ultrapassagem que muitos aproveitavam, incluindo um Gustafsson que decidiu arriscar o pescoço e passar dois carros de uma vez só. A manobra não só era arriscada como também era suicida. E foi o que aconteceu.

A grande testemunha do grande evento da tarde Gilles Carpentier. Pelo seu canto do olho, no seu Matra, viu um carro creme a passar disparado da sua esquerda, tentando travar o mais tarde possivel para passar a ele e ao Ferrari de Van Diemen. A seguir viu o seu carro atingir em cheio o carro do belga e ambos entrarem em chamas defronte dele.

Num instante, deflectiu-se para a esquerda, no primeiro buraco que viu e institivamente virou-se para lá. A seguir sofreu um toque do outro BRM de Bob Turner, mas ambos puderam continuar sem problemas, impedindo por pouco que a pista ficasse bolqueada e a corrida interrompida. Os dois pilotos conseguiram sair das chamas sem ferimentos de maior, pelo seu próprio pé. Van Diemen rebolou-se pelo chão, enquanto que os comissários atiravam-se para Gustafsson, ambos com chamas à volta do seu macacão.

Um carro de bombeiros passava pelo local, encostou-se e apagou as chamas do BRM, que tinha ficado do outro lado da pista. A neve carbónica fazia esbranquiçar os carros que passavam, desde o Matra de Beaufort até ao McLaren laranja de John Hogarth, o último classificado à partida, mas que em duas voltas já tinha ganho duas posições e era 12º Algumas voltas depois, as chamas estavam apagadas, mas o cenário dos carros calcinados no circuito era uma tremenda lembrança da periculosidade desde desporto. Para os pilotos, que os viam sem saber da sorte dos seus colegas, para os espectadores, que viam o fumo e estavam ansioso por saber se eles estavam vivos ou mortos, e para aqueles que sabiam do resultado e que estavam aliviados pela sua condição, mas que tinham consciência de que hoje tinha sido o seu dia de sorte.

E era verdade: Patrick Van Diemen e Anders Gustafsson estavam vivos, apenas com ligeiras queimaduras nos braços e pernas, bem como uma ligeira concussão da parte do belga, pois tinha levado com o impacto do BRM. À medida que a noticia se espalhava pelo paddock, os sinais de alivio eram mais do que presentes. Especialmente Don Arturo e o seu convidado especial, o Principe Juan Carlos, herdeiro do trono e verdadeiro "aficcionado" por automóveis.

As voltas passavam, e Beaufort lá estava, solitário e sem problemas. As tais noventa voltas ao circuito de Jarama eram um verdadeiro suplício, um teste de resistência para máquinas e pilotos. Carpentier e Turner, tocados, não aguentaram até à volta dez, algura em que a suspensão do Matra cedeu em Portago, causando um despiste. Duas voltas depois, a BRM chama Turner para ver o estado do seu carro e descobriram a suspensão frente-direita torta, com possibilidade de quebrar a qualquer momento. Apesar de Turner poder guiar em condições, decidiu-se retirar o carro.

Com isto, Monforte era sexto, entalado entre dois McLarens, o de Bruce e o de Peter. Ele tentava acompanhar os dois carros, guiados por pilotos bem mais experientes, mas tinha algumas dificuldades em acompanhar o ritmo. Na volta 28, não evitou a ultrapassagem de Revson no mesmo local onde acontecera o acidente, mas não houve nada. Mas na volta 31 voltava aos pontos, depois do motor de Rinhardt ter explodido em plena recta. Sobrava Bedford, que era um pálido oitavo, atrás de Bernardini, e pressionado pelos Jordan-Turer de Kalhola e Hocking.

Bruce Jordan abanava a cabeça em sinal de descrença. Quando é que teria aquele chassis em condições?

As voltas passavam, e Beaufort alargava a sua diferença sobre os Apollo. John O'Hara decidiu não puxar muito pelo seu carro, mas Teddy decidiu atacá-lo para ir buscar o segundo lugar e partir ao encalço do francês. No final da recta da meta, passa O'Hara e vai em busca do Matra, mas na volta 45, para de repente sem qualquer motivo aparente. Tinha ficado sem pressão de combustivel e o carro deixava de responder. Por essa altura, a diferença era de 15 segundos, menos 12 quando tinha passado o seu companheiro.

Com este precalço, Pete agora esperava que ele e Monforte chegassem ao fim. O sildavo já acusava algum cansaço devido a problemas de sobreaquecimento, que o fazia derreter no "cockpit". O seu ritmo começou a ser mais lento, mas nada de preocupante. Agora era quinto, mas iria perder uma volta dentro em breve, e os que estavam atrás dele estavam mais de meio minuto atrás de si. Os dois Jordan Temple e o McLaren-Lamborghini estavam a lutar a sua própria batalha pelo último lugar pontuável, depois de Bernardini ter desistido e Bedford se ter atrasado com um furo, e estar a tentar apanhar aqueles três pilotos. Em suma, podia estar descansado e gerir a corrida.

Na volta 72, o motor de Peter Revson explodia e ficava parado na berma na subida para Portago. O quarto lugar era um bom começo para o sildavo, enquanto que atrás, John Hogarth conseguira superar os dois Jordan-Temple e aproximava-se dele a uma media de um segundo por volta. Bob Bedford também se livrava dos privados, mas na volta 84, a sua suspensão cedeu e ficava apeado. Quando viu esse espectáculo e os mecânicos da Jordan arrumavam as suas coisas com a perspectiva de zero pontos, Sinead começou a contar os carros em pista. Eram sete, davam mesmo à justa. E agora era fazer figas para que nenhum desistisse.

A duas voltas do fim, o Temple-Jordan de Antti Kalhola estava encostado a`berma com um problema qualquer, à entrada da boxe. Ele saiu do carro, caminhou calmamente enquanto via atrás de si a multidão a levantar-se para aplaudir Pierre de Beaufort a caminho da sua primeira vitória oficial do ano, com uma vantagem de 55 segundos sobre John O'Hara e de Bruce McLaren, que estava a uma volta, o mesmo que Alexandre de Monforte, o melhor privado e a mostrar que aquele chassis estava ainda pelas curvas.

Don Arturo levantava a bandeira de xadrez e Beaufort erguia os punhos em sinal de vitória. Todos estavam felizes por terem chegado ao fim. John O'Hara tinha agora 15 pontos e era o lider incontestado, Pierre de Beaufort tinha finalmente vencido após o seu titulo mundial e Bruce McLaren estava no pódio com o seu carro, pela primeira vez este ano. Alexandre de Monforte marcava os seus primeiros pontos, tal como Brian Hocking e John Hogarth era um homem feliz por ter levado aquele motor ao fim, mesmo que fosse a duas voltas do vencedor. Mas não era último.

(continua)

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