quarta-feira, 6 de setembro de 2023

No Nobres do Grid deste mês...


O verão é boa altura para pausa, e agosto, ainda melhor. Não é por acaso que chamam por aqui de "meu querido mês de agosto", porque é quando aqui em Portugal, dezenas de milhares de pessoas, especialmente de lugares como França, Luxemburgo, Suíça, Alemanha ou Reino Unido, por exemplo, regressam às suas terras, especialmente no interior, para passar um mês a visitar os seus parentes. 

E, como sabem, o automobilismo também aproveita o agosto para fazer uma pausa, decidi pegar noutra minha atividade favorita: a leitura de livros. E peguei num que apanhei, por acaso, numa Feira do Livro por aqui e comprei, esperando por uns dias na praia para fazer as devidas leituras. 

E o livro que andei a ler por estes dias foi a autobiografia de Enzo Ferrari: "As Minhas Amargas Alegrias". Até calha bem, porque este ano passam os 125 anos do seu nascimento e os 35 da sua morte. Bastou-me um fim de semana para lê-lo - comecei numa sexta-feira à tarde e acabei dois dias depois - e é sobre ele que irei falar. 

(...)

Escrito originalmente em 1962, mostra uma faceta de um Ferrari que era notoriamente reclusivo. Mostrar-se como ser humano não era algo normal, e na altura, as suas memórias - ou autobiografia, se preferirem - foi um grande sucesso, acabando por se vender cerca de cem mil exemplares, só em Itália. Tanto que existiram reedições e modificações em 1964 e um dos seus capítulos - "Piloti, che gente!" - deu até um livro à parte, que teve atualizações até 1987, um ano antes de morrer, e com uma introdução de Piero Lardi Ferrari, o seu segundo filho e herdeiro.

Ali, explica as suas origens, na Emilia-Romagna natal - ele é de Modena - e que foi registado dois dias depois do seu nascimento, alegadamente por causa de um nevão. Fala também de uma adolescência dificil - combateu na I Guerra, numa altura em que morreram o pai e o seu irmão mais velho - de como foi à procura de trabalho em Milão e acabou como piloto, primeiro na CMN, antes de ir para a Alfa Romeo, onde correu ao lado de alguns dos melhores pilotos italianos da época, como Ugo Sivocci, Giuseppe Campari, António Ascari e sobretudo, Tazio Nuvolari. Depois, fala da sua transição para diretor da equipa - funda a Scuderia Ferrari em 1929, para lidar com carros da Alfa Romeo - e da razão pelo qual deixou de correr: o nascimento do seu filho Alfredino (Dino), em 1932.

Ele depositou imensas esperanças nele. Não só por ser seu filho, mas também por ser um engenheiro capaz - o motor Dino de 2.4 litros é obra dele - mas sofria de nefrite, uma doença nos rins, e acabou por morrer em junho de 1956, aos 23 anos. Ferrari sofreu imenso pela sua perda - aliás, é a ele que dedica a sua autobiografia - e sentiu a sua falta até ao fim, porque sabia que tinha imensas coisas em comum, e acreditava - não fala explicitamente, mas entende-se nas linhas - que acreditava que poderia continuar com o legado da Scuderia. 

(...)

Um capítulo à parte é um dedicado aos pilotos. Sendo ele um antigo piloto, Ferrari não coibiu de fazer avaliações sobre pilotos de três gerações, que abarcaram quase um século de automobilismo, desde os primeiros tempos - gente como Felice Nazzaro ou Piero Bordino, que competiram antes da I Guerra Mundial - até aos anos 80, como Nigel Mansell, Gerhard Berger, Michele Alboreto, Alain Prost ou Ayrton Senna.

Há parágrafos inteiros dedicados a pilotos que admirava e teve nas suas fileiras: Antonio Ascari, Ugo Sivocci, Giuseppe Campari, Tazio Nuvolari, Achille Varzi, Alberto Ascari, Froilan Gonzalez, Eugenio Castelloti, Mike Hawthorn, Peter Collins, Phil Hill, Lorenzo Bandini, Ricardo Rodriguez, John Surtees - e nas edições posteriores, Ludovico Scarfiotti, Jacky Ickx, Niki Lauda, Jody Scheckter, Gilles Villeneuve e Michele Alboreto.  

Fora desse núcleo, outros pilotos deu extensos parágrafos, especialmente dois: Juan Manuel Fangio e Stirling Moss. Também falou sobre Jim Clark, Jackie Stewart, Emerson Fittipaldi e Ronnie Peterson, do qual correu apenas na Endurance. (...)

A literatura automobilística é fascinante, e este ano, Enzo Ferrari, estará nas bocas do mundo. Michael Mann estreou por estes dias um filme sobre um período da sua vida, e por acaso, consegui ler a sua autobiografia, "As Minhas Amargas Alegrias". O relato é fascinante de pilotos, pessoas, lugares e carros, numa altura em que a Europa e o mundo saia da II Guerra Mundial e a Itália passava por um desenvolvimento sem precedentes. 

Sobre isso e muito mais, falo este mês no Nobres do Grid.

Sem comentários: