quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Os Pioneiros - Capitulo 52, a América entra na guerra

(continuação do capitulo anterior)


1917: OS ESTADOS UNIDOS ENTRAM NA GUERRA


Quando começa o ano de 1917, a Guerra na Europa já leva dois anos e meio de duração. Por esta altura, todos já sabiam do inferno que era estar nas trincheiras na Frente Ocidental, com dezenas de milhares de mortos a cada ofensiva feita para tentar abrir uma brecha na trincheira inimiga. Ofensivas como as do Somme, que começara a 1 de julho de 1916, tinham causado sessenta mil mortos... só no primeiro dia. Ainda mais, nesse anos de 1916, centenas de milhares de soldados, franceses e alemães, tinham morrido ao longo de quatro meses na zona de Verdun, no sentido de conquistar e recuperar faixas de terreno de pouco mais de dois quilómetros quadrados.

Um desses soldados e aviadores mortos em Verdun nesse ano de 1916 tinha sido Georges Boillot. Motorista do general Joffre no inicio da guerra, o vencedor do Grande Prémio francês em 1912 e 1913 queria mais ação e decidiu juntar-se à nascente Força Aérea. Adaptou-se rapidamente e abateu aviões suficientes para ser considerado como um "ás" e ser condecorado com a "Croix de Guerre" e a Legião de Honra. Porém, a 19 de maio de 1916, Boillot foi cercado por cinco aviões Fokker e abatido perto de Bar-Le-Duc. Gravemente ferido, foi socorrido, mas acabou por morrer pouco depois dos seus ferimentos. Tinha 31 anos de idade.

Os Estados Unidos, sendo neutros, tinham ficado de fora de todo este flagelo que atingia a Europa, mas sofriam com uma das maras usadas pela marinha alemã: os submarinos, que atacavam os navios aliados que abasteciam a Grã-Bretanha. A 7 de maio de 1915, os americanos tinham ficado agitados e chocados com o afundamento do paquete Lusitânia, afundado ao largo da Irlanda, levando para o fundo do mar 1195 pessoas, 128 das quais americanas. O afundamento causou indignação e hostilidade dos americanos para com a Alemanha imperial, e por pouco, não fez entrar os Estados Unidos na guerra.

Mas no inicio de 1917, os alemães decidem fazer guerra submarina total, o que implicava também o afundamento de navios mercantes ou de passageiros vindo de países neutros, incluindo os Estados Unidos. Ao mesmo tempo, o ministro alemão dos Negócios Estrangeiros, Robert Zimmerman, tinha decidido tentar influenciar o México para invadir os Estados Unidos, no sentido de os manter afastados da guerra na Europa. O telegrama foi interceptado, e uma nova onda de indignação foi sentida nos Estados Unidos. Farto da hostilidade e das provocações, Wodrow Wilson, o presidente americano, decidiu a 6 de abril de 1917, declarar guerra à Alemanha imperial e aos seus aliados.

O impacto dessa declaração fez eco na comunidade automobilística. Carl Fisher, o proprietário do circuito de Indianápolis, decidiu que a corrida, que iria acontecer no final de maio, seria imediatamente cancelada e as suas instalações disponibilizadas para o exército como um campo de treino para a nascente Força Aérea. Apesar do campeonato não ter parado, muitos dos pilotos decidiram alistar-se na Força Aérea. Um deles, Eddie Rickenbacker, foi para a França e tornou-se no maior ás da aviação americana, com 26 vitórias aéreas, um recorde que só seria suplantado na II Guerra Mundial. Devido aos seus feitos, Rickenbacker foi condecorado com a Croix de Guerre francesa e a Medalha de Honra americana e na América, foi recebido de volta como herói, partindo para uma carreira distinta.

Grande parte das corridas foram canceladas, especialmente as de estrada. A Vanderbilt Cup, a Astor Cup e o Grande Prémio americano não correram, e com o triunfo das pistas de madeira, só voltariam muito mais tarde. A Vanderbilt Cup tentou voltar em 1935, mas por pouco tempo, enquanto que o Grande Prémio só regressou em 1959, já quando a Formula 1 era uma realidade. A Astor Cup nunca mais voltou como corrida única, embora hoje em dia, o troféu sirva para premiar os campeões da IndyCar. Anos antes, a Vanderbilt Cup era entregue aos campeões da CART.


O FINAL DE UMA ERA


A 9 de novembro de 1918, em Compiegne, numa carruagem de comboio, Aliados e alemães assinaram o Armisticio, que marcava o final das hostilidades para as onze da manhã do dia 11 de novembro de 1918. Quatro anos de guerra chegavam ao fim com mais de nove milhões de mortos e uma geração marcada pela devastação causada pela carnificina das armas modernas, como a metralhadora, e a eliminação sucessiva de homens, como "carne para canhão", vitimas da incapacidade dos seus generais de modificar as táticas de modo a poupar os homens da guerra de trincheiras que o conflito se tinha tornado, pelo menos na Frente Ocidental.

Quando as provas automobilísticas voltaram, no inicio de 1919, muitos dos pilotos que estiveram na pré-guerra voltaram a correr, como Felice Nazzarro, Jules Goux, Christian Lautenschlager e Louis Wagner. Mas eles agora lidavam com uma nova geração de pilotos que eram mais novos do que eles e mais aguerridos. Essa geração ainda correu na década seguinte, conseguindo vitórias importantes como Lautenschlager, vencedor da Targa Flório de 1922, Nazzaro, em 1924, ao vencer o GP de França, ou Goux, que venceria o GP de Espanha de 1926.

Muitas das marcas da pré-Guerra não voltaram. A Peugeot decidiu não participar mais na competição, deixando espaço para marcas como a Delage, Ballot e sobretudo, Bugatti. No lado alemão, a Mercedes voltou à competição em meados da década de 20, conseguindo vitórias importantes, mas só voltará a ter grande importância a partir de 1934, com as Flechas de Prata. A grande vencedora nesses primeiros tempos do pós-guerra será a italiana Fiat, que constroi carros e apresenta pilotos de renome como Biaggio Nazzaro, sobrinho de Felice.

Outra marca italiana que surge do pós-guerra vêm de Milão: a Alfa Romeo, e esta terá pilotos de calibre de Antonio Ascari e dará a chance a dois jovens. O primeiro, de Modena, tinha sido condutor de camiões na frente italiana. Chamava-se Enzo Ferrari. O segundo, que vinha de Mântua, andava em motociclos, a partir de 1930 passa para os carros, conquistando o público num estilo de condução nunca igual. Esse chamava-se Tazio Nuvolari.

Em 1914, o automobilismo tinha vinte anos de idade e tinha evoluído muito. De simples "carruagens sem cavalos", máquinas com dois e quatro cavalos, vindos da produção de série, para máquinas enormes, com mais de 200 cavalos e capazes de andarem a mais de 250 quilómetros por hora em reta, desafiando a morte para serem os mais velozes. Os fabricantes de automóveis tinham descoberto que a competição serviria para vender os seus carros e espalhar o uso do novo invento um pouco por todo o mundo, e no inicio da década de 20, graças também a carros como o modelo T da Ford, o automóvel era barato e acessível a todos que poderiam comprá-lo. O grande objetivo tinha sido alcançado, e mais do que isto, o automobilismo tinha criado uma geração de heróis, e cultivou o imaginário de toda uma geração.

Os primeiros vinte anos serviram de base para a criação de grande parte dos componentes automobilísticos e o triunfo do carro a gasolina, que iria dominar todo o século XX. Em termos de organização, criaram grande parte das provas que conhecemos hoje em dia, embora faltasse apenas um campeonato mundial que ligasse todas essas provas a uma grande competição. Isso só seria alcançado após a II Guerra Mundial, com o Mundial de Formula 1. E mesmo uma prova de Endurance como as 24 Horas de Le Mans, começada em 1923, teve como base as corridas de 1906 e 1911, a última dos quais feita a partir de um desenho que seria usado em grande parte como o Circuito de La Sarthe.

Em jeito de conclusão, grande parte do que conhecemos sobre o automobilismo foi feito nestes primeiros vinte anos de vida do automóvel. Moldou mais do que uma geração e ajudou ao nascimento e crescimento de marcas miticas, do qual ainda ouvimos hoje. Os nossos carros de estrada têm componentes que foram desenvolvidos nas corridas deste inicio de século, cumprindo o desejo de que o automobilismo, como banco de ensaios para a utilização quotidiana, fosse cumprido. E não só ajudou ao nascimento de uma industria importante na Europa e nos Estados Unidos (mais tarde, no Japão, Coreia do Sul e China) como moldou gerações inteiras, criando sonhos e imprimindo um legado durável até aos dias de hoje.

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