A 9 de setembro de 1945, no Bois de Boulogne, em Paris, um grupo de carros estava alinhado para uma série de corridas. Mas aqueles não eram carros quaisquer e aquela não era uma corrida qualquer. Era a primeira corrida em seis anos e a Europa saía de uma guerra que a dilacerou, com 60 milhões de mortos, entre alemães, britânicos, polacos, russos, italianos e muitas outras nacionalidades.
Tinham passado três meses desde as tropas aliadas marchavam sobre Berlim. Menos de um mês antes, um bombardeiro B-29 largou uma bomba nuclear sobre a cidade de Hiroshima, vaporizando-a e matando instantaneamente 80 mil pessoas. A dois de setembro, uma semana antes dessa corrida, em Tóquio, era assinado um tratado de paz com o império japonês, terminando definitivamente a II Guerra Mundial.
Seis anos antes, em Belgrado, os Auto Union e os Mercedes dominavam uma corrida quando as tropas alemãs já marchavam em solo polaco. Depois da bandeira de xadrez, e dos carros terem sido recolhidos às oficinas de Estugarda, só houve algumas corridas em Itália, entre os quais as Mille Miglia, antes desta entrar em guerra a 10 de junho de 1940.
A partir dali, foram tempos obscuros, pelo menos na Europa. Não havia automobilismo, pois a gasolina era toda racionada e dirigida para as máquinas de guerra de ambos os lados do conflito. E os pilotos e dirigentes tornaram-se mais engrenagens dessa máquina. Alguns decidiram ficar na margem como Rudolf Caracciola, que ficou na Suiça durante o conflito mundial, pago pela Mercedes-Benz. Pouca gente esteve realmente na frente, excepto Rudolf Hasse, piloto da Auto Union em 1936-37, que morreu na frente ucraniana em agosto de 1942, aos 36 anos. Contudo, foi de doença, em vez de ferimentos de guerra.
No lado italiano, não houve grande história, com algumas excepções. Enzo Ferrari, quando decidira abandonar a Alfa Romeo, ficou sem o direito de usar o seu nome por cinco anos, e construiu um carro em 1940 sob o nome de Auto Avio Construzione. Participou nas Mille Miglia, com dois carros, um deles guiado por Alberto Ascari, mas quando a guerra acabou, os cinco anos de proibição tinham acabado, e estava disposto a retomar a competição com o seu proprio nome, numa oficina na vila de Maranello, nos arredores de Modena, local onde se mudara depois dos aviões aliados terem bombardeado a cidade.
A Alfa Romeo tinha construído alguns exemplares do modelo 159 para correr na nova Formula de 4,5 litros, que era para ter acontecido em 1940, mas que não aconteceu por causa da guerra. A marca de Varese decidiu então esconder os carros num armazém de queijos durante a guerra, para evitar serem levados para a Alemanha como despojo de guerra, sobrevivendo ao conflito mundial. Pior sorte tiveram os carros alemães, especialmente os Auto Union, dado que a sua fábrica ficava em Zwikau, que no final, calhou na zona soviética. Os carros foram levados para lá, como despojos de guerra, e pelo menos dois foram descobertos apenas nos anos 90, um na Letónia e outro na República Checa.
Mas houve duas personagens que se destacaram nesse tempo, um francês e um britânico. William Grover-Williams e Robert Benoist. O primeiro tinha sido o primeiro vencedor do GP do Mónaco, em 1929, e o segundo tinha vencido o GP de San Sebastien em 1926 e as 24 Horas de Le Mans, em 1937, a bordo de um Bugatti. Em 1940, Williams, Benoist e Jean-Pierre Wimille foram para a Grã-Bretanha para se juntar ao Special Operations Executive (SOE) para se infiltrarem por trás das linhas inimigas. A França tinha sido ocupada no verão de 1940, depois de seis semanas infernais, e a resistência francesa tinha prometido ao exército ocupante fazer-lhe a vida negra.
Benoist tinha combatido na I Guerra Mundial como piloto de caças e metera-se no automobilismo em busca de adrenalina que faltava após o final do conflito. E em 1940, apesar de ter 45 anos, voltou de novo, apesar dos perigos de ser capturado como espião e executado como tal. E foi o que aconteceu em 1943, quando a rede que montou, a "Prosper", foi desmantelada e Gover-Williams foi apanhado e executado no campo de Sachenhausen.
Benoist tinha combatido na I Guerra Mundial como piloto de caças e metera-se no automobilismo em busca de adrenalina que faltava após o final do conflito. E em 1940, apesar de ter 45 anos, voltou de novo, apesar dos perigos de ser capturado como espião e executado como tal. E foi o que aconteceu em 1943, quando a rede que montou, a "Prosper", foi desmantelada e Gover-Williams foi apanhado e executado no campo de Sachenhausen.
Benoist foi capturado três dias depois, mas a caminho do quartel da Gestapo... conseguiu escapar, saltando do carro onde ia. Conseguiu voltar a solo britânico, e regressou à França por duas vezes, em setembro de 1943 e em fevereiro de 1944, antes de ser apanhado a 18 de junho, quando as forças aliadas já estavam em solo francês. Levado para Buchenwald, foi executado a 9 de setembro.
Precisamente um ano depois, no Bosque de Bolonha, a corrida principal recebeu o nome de "Coupe Robert Benoist", onde Amedée Gordini foi o grande vencedor, num carro feito por ele mesmo. O seu amigo Jean-Pierre Wimille ganhou outra, a "Coupe des Prisoniers".
2 comentários:
E curiosamente, Wimille morreria num acidente até hoje sem explicações numa prova em Buenos Aires, no ano de 1949.
Ele também serviu a França na Segunda Guerra.
Na verdade, Wimille venceu a Copa dos Prisioneiros, a última corrida do dia
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