segunda-feira, 19 de julho de 2021

A imagem do dia


Até chegar a aquele momento, a McLaren teve de atravessar o deserto. Foi a primeira grade seca da história da marca e para que esta chegasse ao fim, foi preciso atravessar por uma mudança na gerência... e colocar uma novidade tecnológica do qual todos acabaram por seguir sem hesitar. 

Quando James Hunt cruzou a meta no primeiro lugar, naquele ensolarado GP do Japão de 1977, a McLaren poderia ter perdido o título, mas tinham esperanças no chassis M26, o sucessor do M23, que se tinha estreado em Espanha e lhe dera vitórias na Grã-Bretanha, Estados Unidos e ali, em Fuji. Para além disso, as três pole-positons naquele carro desenhado por Gordon Coppuck faziam pensar que, bem desenvolvido, seria um carro tão bom como os anteriores. Contudo, a decadência estava à esquina. 

Em 1978, Colin Chapman colocou em ação o seu Lotus 79 de efeito-solo, mostrando que todos os anos de desenvolvimento daquela ideia da asa invertia compensavam. O seu domínio e respetivo título naquela temporada, nos carros guiados por Mário Andretti e Ronnie Peterson, deixaram todos a chegarem à conclusão que, se o teu carro não tiver aquilo, não irão longe. E o M26, que não tinha sido adaptado à novidade, passou dos 39 pontos conquistados em 1977 para 15, e um só pódio para Hunt, em Paul Ricard. E no final desse ano, o britânico abandona a equipa, à procura de um carro de efeito-solo para se manter competitivo. 

Em 1979, a equipa constrói dois (!) chassis para se tentar manter competitivo, mas os carros, guiados por John Watson e Patrick Tambay, não são o sucesso que esperavam, e apenas conseguem um pódio, na Argentina, com o M28. Ao todo, mantiveram os 15 pontos de 1978, mas o dinheiro gasto pela Marlboro não compensava, e tentava-se encontrar uma maneira para dar a volta a isso.

Por esta altura, a Marlboro apoiava o Project Four, liderada por um antigo mecânico da Cooper e da Brabham, Ron Dennis. Estava a ter sucesso na Formula 2 com gente como Chico Serra e Andrea de Cesaris, e ele tinha aspirações para correr na Formula 1. Algo do qual tinha tentado em 1973, mas foi abortado por causa da primeira crise petrolífera e a retirada do seu patrocinador, a francesa Motul. Dennis nunca deixou de querer ir para a Formula 1 e pediu apoio à Marlboro. Que lhe fez uma contra-proposta: ficar com 50 por cento da McLaren, trabalhar ao lado do americano Teddy Mayer, que mandava na equipa desde a morte do criador, dez anos antes. 

Nesta altura, a McLaren tinha construido o M29, e tinha a seu lado um jovem promissor chamado Alain Prost, mas os resultados não melhoravam. Assim sendo, com a chegada de Dennis, ele sabia que tinha de fazer algo para mudar as coisas, e conhecia algumas pessoas que poderiam ajudar. Uma delas era John Barnard.

O jovem projetista britânico - 34 anos de idade em 1980 - tinha ajudado a construir o Chaparral 2K da CART, e dera a Johnny Rutheford o título da CART e as 500 Milhas de Indianápolis. Um carro de efeito-solo, com um motor turbo vindo da Cosworth, tinha vencido seis corridas, mas sobretudo o que tinha era que certos componentes daquele carro eram feitos de fibra de carbono um material leve e resistente. Mas poucos eram os que faziam e claro, era caro. Tanto que a firma que fazia isso, a Hercules Aerospace, de Denver, Colorado, fornecia componentes para, entre outros, a NASA.

Barnard, com a ajuda de Alan Jenkins e Steve Nichols - que depois se tornaram projetistas de renome na própria McLaren - desenharam e construíam um carro que todos sabiam ser avançado para a época. E cedo se mostrou que era muito bom. Mas depois de se estrear, nas mãos de Watson no GP da Argentina, a 12 de abril, demorou até se impor. Watson só pontuou em junho, em Jarama, quando foi impedido de vencer por causa da "carroça" ferrarista guiada por Gilles Villeneuve. Mas os dois pódios que teve ali e em Dijon, no GP francês, mostrava que estava no bom caminho, e em Silvrstone, o carro se portava bem, sendo ali quinto na grelha e o segundo melhor não turbo, batido apenas pelo Brabham de Nelson Piquet, que largava de terceiro. 

Foi uma corrida de atrito. Villeneuve tentou ganhar algumas posições e na terceira volta, causou uma carambola na Woodcote, levando consigo o seu companheiro Andrea De Cesaris, mais Alan Jones. Pouco depois, na volta 11, Piquet sofreu um furo e despistou-se, e na 17, Alain Prost, que liderava a corrida com o seu Renault, sofria uma avaria no distribuidor e entregava o comando para René Arnoux.

Com o passar as voltas, e boa parte do pelotão a encostar nas bermas do veloz circuito britânico, parecia que isto poderia acabar nas mãos de Arnoux, com Watson atrás. Afinal, a quatro voltas do fim, o francês sofria o mesmo problema e tinha de abandonar, entregando o comando a Watson, que iria vencer com quase 40 segundos de avanço para o Williams de Carlos Reutemann, o maior beneficiado daquela prova de atrito.

Naquela tarde, a travessia do deserto acabava ali. A tecnologia funcionava, só faltava um motor melhor. No final do ano, Meyer vendia a sua parte a Dennis e ele iria convencer Niki Lauda e voltar a colocar o seu capacete. Poucos meses, depois, convenceria um árabe chamado Mansour Ojjeh para encomendar e financiar um motor Turbo à Alemanha, e ali começava não só o seu domínio na equipa, como se escreviam as suas primeiras páginas de uma glória que se consagraria numa tarde de outono em Estoril.

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