segunda-feira, 23 de julho de 2007

Extra-Campeonato: O "caso El Jueves"

O assunto do momento em Espanha é uma revista satírica catalã, de esquerda e vagamente republicana, com um humor que roça os limites: “El Jueves”. O que aconteceu? A edição da passada semana colocou uma caricatura dos Príncipes das Astúrias, Felipe e Letizia de Borbon, em “doggy style” na cama, e com o seguinte diálogo em espanhol:


"¿Te das cuenta si te quedas preñada? Esto va a ser lo más parecido a trabajar que he hecho en mi vida".


Ora, o alvo da sátira não eram os Príncipes, mas sim a medida adoptada pelo governo socialista de José Luís Zapatero, cujo governo tinha decidido adoptar uma medida que dava aos seus concidadãos um subsídio de 2500 Euros por cada filho nascido. Numa Europa em crise de natalidade, isso não é nada comparado com os 25 mil Euros dados pela Alemanha, por cada filho nascido, mas é muito comparado com os patacos que o governo socialista quer dar para os casais com filhos recém-nascidos…


A revista, que saiu na quarta-feira, foi apreendida no dia seguinte por ordem do juiz Juan del Olmo, da Audiência Nacional, que achou o desenho como “uma injúria grosseira”. O juiz também decretou o encerramento do site oficial (http://www.eljueves.es/) e os raros exemplares da revista que ainda existem, estão a ser leiloados no eBay com preços a roçar… os 2500 Euros! Precisamente o valor que a revista estava a satirizar...


A medida foi apoiada pelo Procurador-geral do Estado espanhol, o juiz Cândido Conde-Pumpido, que afirmou na edição de Sábado do jornal “El Mundo” que “o juiz deve proteger a liberdade, a honra e a dignidade das pessoas afectadas”. Ele mesmo afirmou que apesar da liberdade de expressão passar por um bom momento, afirmando que está a ser "bem utilizada e reconhecida", recordou que são "absolutamente excepcionais" os casos em que a Justiça deve intervir para "limitar algum excesso". "E esses limites estão no Código Penal que deve ser interpretado por juízes independentes".


O Código Penal espanhol afirma no seu artigo 491, que é "delitivo usar a imagem da Coroa de forma injuriosa". E foi com base nesse artigo que os exemplares foram apreendidos.



Mas vamos voltar à vaca fria. Desde sempre que as personalidades públicas são alvos de sátira. Isso é um dos pilares da Democracia: a crítica e a sátira aos governantes. E no passado, as coisas eram bem piores, só que já não nos lembramos… Mas no caso específico, tratamos de uma publicação cujo objectivo principal é testar o limite do bom senso. Aqui em Portugal, o melhor exemplo, é um programa da SIC Radical chamado “Vai Tudo Abaixo”.


Mas reparem: o objectivo da sátira em si é de gozar com as medidas públicas que os governantes tomam, ou os gestos que têm, ou as “gaffes” que cometem, uma forma de demonstrar que as figuras públicas também tem os seus “telhados de vidro”. E mais nada. Agora, gozar com deficiências de A ou B, ou colocar pessoas públicas em posições privadas, isso já é ofensivo. E vendo bem as coisas, o que é que os Príncipes das Astúrias têm a ver com uma medida do Governo? Essa é a diferença entre a sátira e a ofensa.


Mas quando um tribunal ordena a apreensão de exemplares de uma revista para fazer cumprir a lei, é ser mais papista do que o Papa. E também é uma Caixa de Pandora à espera de ser aberta… Eu por mim, depois dos prós e contras, prefiro defender a revista, por muito ofensivos que eles foram. É uma defesa básica da Democracia.

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