segunda-feira, 22 de março de 2021

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Em 1988, os Porsches dominavam a Endurance desde o inicio dos Grupo C, mas os rivais começavam a se esforçar para os apanhar. Jaguar, Toyota e Mercedes, através da Sauber, começavam a vencer corridas e títulos, mas ainda faltava o título maior: as 24 Horas de Le Mans. Nesse ano, a Jaguar, com o mítico patrocínio da tabaqueira Silk Cut, tinha alinhado com cinco XJR-9, preparados pela Tom Walkinshaw Racing. O primeiro guiado pelo carro numero um com a dupla John Nilsen e Martin Brundle, o segundo pela tripla Jan Lammers, Johnny Dumfries e Andy Wallace, o terceiro pela tripla John Watson, o brasileiro Raul Boesel e o veterano francês Henri Pescarolo, e mais dois carros, o 21 e 22, o primeiro totalmente americano - Davy Jones, Price Cobb e Danny Sullivan - e o segundo com o irlandês Derek Daly, o americano Kevin Cogan e o australiano Larry Perkins.

Naquele ano, a Jaguar estava realmente disposta a tirar à Porsche o seu domínio, que acontecia desde 1981, quando um Porsche 935 guiado por Jacky Ickx e Derek Bell tinha saído de La Sarthe como vencedora. Preparavam-se para isso desde 1984 e achavam que era agora a altura. Mas na qualificação, o turbo que os 962 tinham instalada provou-se superior e ficou com os primeiros postos, com eles de seguida.

Mas o que interessava era chegar à meta. Eles sabiam disso melhor que ninguém, porque no ano anterior, tinham dominado por cerca de 16 horas, para no final desistirem e verem os Porsches a triunfarem graças à sua resistência. Claro, em 1988, eles fariam que tudo fosse diferente.

Na realidade, foi uma batalha bem dura. No carro dois, Walkinshaw sabia da experiência de Lammers, que tinha sido piloto de Formula 1 entre 1979 e 1982, e claro, Johnny Dumfries, que estivera na Lotus em 1986, apenas por uma temporada. Contudo, havia dúvidas sobre Andy Wallace, que alguns anos antes tinha estado em Le Mans... como espectador, e não se sabia muito bem como iria lidar com os carros à noite, em Mulsanne, Arnage ou noutro lugar qualquer do circuito. Afinal, eram mais de 40 carros a passear por ali, e uma hesitação era fatal.

Ainda antes da corrida, a Sauber retirou os seus carros por causa dos problemas com os pneus Michelin, significando menos um concorrente. Outro concorrente, a WM, pegou num dos seus carros com motor Peugeot e andou a fundo nas Hunaudriéres, tocando os 407 km/hora. Velocidade tinha, sem dúvida, mas fiabilidade era outra história...

A proa foi um duelo entre Porsche a Jaguar. E as coisas poderiam ter acabado mal para o carro numero 2, porque Lammers andou o tempo todo com problemas na caixa de velocidades, em parte devido ao toque que o espanhol Jesus Pareja deu na sua traseira, perdendo dois minutos nas boxes para reparar a carroçaria. Mas os Porsches não estiveram melhor: Walkinshaw temia o carro de Derek Bell, Hans-Joachim Stuck e Klaus Ludwig, que acabou na mesma volta do vencedor - a diferença entre ambos foi de dois minutos e meio - mas a caixa de velocidades dele falhou mais do que os da Jaguar, e uma falha na bomba de gasolina na quarta hora fê-los perder cinco minutos, se calhar os decisivos para determinar a vitória.

No final, o Jaguar numero 2 levou a melhor sobre os Porsches, conseguindo a vitória que tanto perseguiam. Um outro Jaguar ficou em quarto lugar, o de Daly, Cogan e Perkins, um os menos expectáveis, mas no final, o vencedor percorreu a segunda maior distancia até então, 5332,97 quilómetros, apenas batido pela distância percorrida pelo 917 de Helmut Marko e Gijs Van Lennep. E tudo isso em dia de eleições legislativas em França.

A Jaguar voltou a vencer em 1990, mas nenhum dos três pilotos voltou a triunfar no circuito, apesar de terem corrido por muito mais tempo. Wallace foi até 2010, Lammers participou até 2018, quando já tinha... 62 anos. 

Todas estas recordações de uma corrida de há quase 33 anos acontecem no dia em que se soube da morte de Johnny Dumfries. Um lorde que se apaixonou pelo automobilismo, que correra na Formula 1 pela Lotus, e aproveitava a sua chance ao correr pela Jaguar, por ele mesmo, sem favores de alguém. Teve uma carreira curta, mas bem sucedida. 

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