sexta-feira, 26 de agosto de 2011

E assim passaram-se vinte anos

Vinte anos são muito tempo. Em 1991, tinha quinze anos de idade, muito cabelo e detestava Guns N'Roses, por serem a banda que o meu irmão colocava na sua aparelhagem sem parar. Tentava compensar com U2, mas por essa altura descobri o "Ten" do Pearl Jam e o "Nevermind" dos Nirvana, enquanto assistia espantado à decadência fisica de Freddie Mercury, que na véspera da sua morte decidiu anunciar ao mundo que era portador do HIV. Já notava isso quando via os videoclips do "Innuendo", o derradeiro álbum dos Queen, na minha recém-descoberta MTV da parabólica da minha casa (a TV Cabo demoraria mais uns quatro anos, por aí)

Mas também descobria a CNN e via um mundo em mudança. Começava a ver a União Soviética a desmoronar-se diante dos nossos olhos, com estátuas de Lenine e Marx a serem derrubadas, começava a ouvir falar de sitios distantes como "Ucrânia", "Moldávia" ou "Cazaquistão", entre outros, e via que tinha de comprar um novo Atlas, pois os que tinha em casa estavam a ficar totalmente desatualizados. Via povos a ganharem o direito a serem livres e independentes, desconhecendo que o dia seguinte iria ser dificil.

Mas nesses meus quinze anos, e quando tentava sobreviver no ambiente do Liceu que ficava ao lado da minha casa, a Formula 1 era o meu escape de domingo à tarde. Em 1991, a TV portuguesa era ainda monopolista - mas não por muito tempo - o segundo canal transmitia em direto os Grandes Prémios, com a narração no local do José Pinto e do Adriano Cerqueira, por vezes com o Domingos Piedade e o Hélder de Sousa a "meterem a colher", torcia por Ayrton Senna, que via nesse ano com apreensão a aproximação dos Williams FW14 de Nigel Mansell, mal sabendo que eu estava a observar, domingo após domingo, uma grande máquina desenhada por um projetista genial chamado Adrian Newey.

E nesse GP da Belgica, nesse final de agosto, final de verão, assistia espantado às noticias da prisão de Bertrand Gachot, de uma equipa Jordan que me surpreendia agradávelmente, com aquele carro verde. Diabos, por causa deles tinha começado a beber 7UP todos os dias. Eles e o Fido Dido...

Mas nesse final de semana comecei a ler e a ouvir falar de um alemão de 22 anos que mal se tinha sentado dentro de um carro, surpreendia tudo e todos. Já o tinha visto antes, no Mundial de Sport-Protótipos, quando a Sauber-Mercedes tinha uma equipa jovem constituida por três rapazes, dois alemães e um austriaco, que muitos aspiravam esperanças de futuro na Formula 1, eventualmente quando a Mercedes fosse para lá. Acabou por ser a Sauber, e desses, dois deles foram mesmo: Heinz-Harald Frentzen e Karl Wendlinger. O terceiro, Michael Schumacher, já tinha vencido corridas nesse mundial, e portanto já tinha uma ideia do que ele era.

Pessoalmente, estava um pouco atrás com alemães, pois tinha visto o Michael Bartels na Lotus e julgava que depois do Stefan Bellof, nada iria acontecer dos lados da Alemanha. Era mesmo ingénuo, não era? Enfim... fiquei abismado com os seus tempos, como tida a gente. E nos anos a seguir, comecei a saber de mais detalhes sobre esse final de semana que entrara quase nos anais do mito: que não tinha dado qualquer volta em Spa-Francochamps num carro, só de bicicleta, que afinal a sua embraeagem tinha dado problemas mas que Jordan era um "unhas de fome" e não o trocou, etc, etc... e ainda vi nesse dia o Andrea de Cesaris quase a vencer um Grande Prémio, à custa de Senna!

Depois desse final de semana, vi algum do "lado escuro" da Formula 1: o despedimento injustificável de Roberto Moreno, afirmando "não ter capacidade mental para correr", um argumento absolutamente sinuoso simplesmente porque Flávio Briatore queria Schumacher na Benetton a qualquer custo, porque sabia que ali havia potencial para campeão do mundo. Era real, mas isso iria acontecer três anos mais tarde, em circunstâncias que merecem ser contadas e recordadas para toda a eternidade, de tão traumáticas que foram. E que mancham até hoje a carreira do piloto alemão.

Agora, vinte anos passaram-se. Agora falamos da Libia e do Médio Oriente que se livra dos ditadores, o "grunge" foi-se, Kurt Cobain matou-se, Eddie Vedder está mais calmo, Axl Rose está gordo e cheio de "botox", Ayrton Senna está morto e vemos o seu sobrinho a correr. A Ferrari acabou com o seu jejum, a Williams é uma sombra de si mesmo, a Jordan chama-se agora Force India, Eddie Jordan é comentador da BBC e Michael Schumacher corre pela Mercedes, a equipa que pagou meio milhão de dólares para poder ter a sua oportunidade na Formula 1. Pelo meio bateu todos os recordes, ajudou a acabar com o jejum da Ferrari e ainda teve tempo para tirar três anos sabáticos. Eu larguei os óculos e tou a ficar careca, e os bebés de 1991, como o da capa do "Nevermind", são adultos recém formados, provavelmente a estudar na Universidade.

E assim, meus amigos, passaram-se duas décadas. Como o tempo voa, hein?

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