sexta-feira, 7 de julho de 2023

No Nobres do Grid deste mês...


Há 55 anos, a Formula 1 era um lugar perigoso. A cada dia sete, ou próximo disso, todos os pilotos temiam entrar nos seus carros, pensando que poderiam ser os próximos que regressassem a casa dentro de um caixão. Em abril, tinha acontecido isso a Jim Clark. Em maio, a má sorte calhara a Mike Spence, em Indianápolis. E em junho, o infortúnio calhara a Ludovico Scarfiotti, que corria num Porsche numa corrida de montanha na Alemanha. Chegados a julho, o pelotão da Formula 1 já sentia o terror, e nesse mês, calhava num fim de semana de Grande Prémio. Entre o terror e o conformismo, iriam assistir à quarta morte noutros tantos meses. E as circunstâncias desse acidente mortal determinaram o destino não só de um piloto estreante, como a de uma equipa, e em última análise, de um circuito: o de Rouen-Les-Essarts, no norte de França.

(...)

Desenhado no meio de uma floresta, [o circuito] era rápido e desafiante, especialmente na secção entre a partida e o gancho "Noveau Monde", sempre a descer, na perigosa curva à direita "Six Fréres". 

E para piorar as coisas, no fim de semana do Grande Prémio, havia a chance de chuva.

Na lista de inscritos, estavam 18 carros de equipas como Lotus, Matra, Ferrari, BRM, Cooper, Honda, Brabham e McLaren. A marca japonesa tinha a grande novidade para esta corrida, com um novo chassis, o RA302. 

Desde meados de 1966, quando a marca japonesa montou o seu motor de 12 cilindros e o estreou no GP de Itália, que pretendia andar a par da concorrência, senão superá-la. Tinham contratado o britânico John Surtees, e as suas ajudas em termos de desenvolvimento do motor e do chassis levaram a melhoramentos, ao ponto de precisamente um ano depois da estreia, no GP de Itália de 1967, Surtees bateu Jack Brabham no "photo-finish" e deu à marca japonesa a sua segunda vitória na Formula 1. Contudo, o chassis, o RA300, fora construído sob encomenda de Eric Broadley, da Lola, que deu o nome de "Hondola", e a marca japonesa queria mostrar que também conseguia construir chassis tão bons como os motores. 


No inicio de 1968, a marca construiu o RA301, mas era outra encomenda feita para a Lola, porque na realidade, decidiram concentrar-se no chassis seguinte, o RA302, que pretendiam que fosse refrigerado a ar, diferente dos refrigerados a água. Por causa disso, o RA301 sofreu com a falta de desenvolvimento e até à corrida francesa, não tinha conquistado qualquer ponto. 

O projeto era um ponto de honra pessoal para Soichiro Honda, o fundador da marca. Decidiu-se, em vez do alumínio, seria feito em magnésio, que era um material na altura usado nas jantes. Era mais leve que o alumínio, mas era inflamável, ou seja, tinha um potencial bem perigoso em caso de choque. Semanas antes do GP francês, Surtees experimentou o carro e sentenciou: muito pesado, pouco seguro. Chegou a afirmar que, como estava, era uma "armadilha mortal". Logo, recusou andar com ele na corrida onde pretendiam estrear, em Rouen, palco do GP de França daquele ano.   

A Honda, por seu turno, decidiu estrear o carro na mesma. Como Soichiro Honda, fundador e patrão, estava em França para assistir à corrida, os responsáveis da marca decidiram inscrevê-lo sob o nome Honda Racing France, apesar dos avisos de Surtees, a par do chassis oficial. E para o lugar, encontraram um piloto disposto a guiá-lo: Jo Schlesser. (...)


Há 55 anos, a Formula 1 corria em Rouen, no norte de França, e os pilotos andavam um pouco agitados. Nos últimos três meses, três dos pilotos do pelotão tinham morrido em acidentes, com a coincidência de acontecerem com quase um mês de intervalo entre eles. Jim Clark, o mais chocante deles todos, tinha acontecido em abril, em Hockenheim, numa corrida de Formula 2, mas depois, gente como Mike Spence, quando treinava para as 500 Milhas de Indianápolis - ironicamente, corria em substituição de Clark - e Ludovico Scarfiotti, numa corrida de montanha na Alemanha, no fim de semana do GP da Bélgica. 

A Honda queria provar que o seu conceito estava certo, apesar do ceticismo do seu piloto principal, e contratou um veterano que nunca tivera a chance de correr na Formula 1. E a sua contratação teria consequências bem maiores do que a volta e meia que deu na pista, tentando controlar um carro pouco controlável, ainda pior com a chuva a cair naquele momento.

Sobre isso falo este mês no Nobres do Grid.   

Sem comentários: